quarta-feira, 14 jun 2017
Em 2006, o educador e autor de livros Ken Robinson proferiu uma palestra para a
TED
intitulada "Será
que as escolas matam a criatividade?". Com mais de 45 milhões de visualizações,
esta continua sendo a palestra mais visualizada da história da TED.
A premissa de Robinson é simples: nosso atual sistema
educacional acaba com a criatividade e a curiosidade naturais dos jovens ao
forçá-los a se configurar dentro de um molde acadêmico unidimensional. Esse molde
pode funcionar bem para alguns — principalmente, como diz ele, para aqueles
que querem se tornar professores universitários.
Porém, para a maioria de nós, nossas paixões e habilidades
inatas são, na melhor das hipóteses, ignoradas. Na pior, são prontamente destruídas
pelo sistema educacional moderno.
Em sua palestra na TED, Robinson conclui:
Creio que nossa única esperança para o futuro é a
adoção de uma nova concepção de ecologia humana, uma em que começamos a
reconstituir nossa concepção da riqueza da capacidade humana. Nosso
sistema educacional explorou nossas mentes como exploramos a terra: em busca de
um recurso específico. E, para o futuro, isso não serve. Temos de
repensar os princípios fundamentais em que baseamos a educação de nossas
crianças.
Educação pela força
Robinson estava apenas ecoando as preocupações de
vários educadores que acreditam que o atual modelo de escola compulsória solapa
a vibrante criatividade das crianças e as obriga a suprimir seus instintos
auto-educativos.
Em seu livro Livre
para Aprender, o doutor Peter Gray, professor de psicologia do Boston
College, mostra que todas as crianças adoram aprender e avidamente exploram o
mundo ao seu redor com grande entusiasmo e dedicação. Mas tudo
isso acaba quando entram na escola.
Em suas pesquisas sobre crianças que não entraram no
sistema de educação em massa e foram para formas alternativas de educação, o
doutor Gray descobriu que a curiosidade humana e o comprometimento para com o
aprendizado se manteve até muito além do início da infância.
Em seu artigo "A
escola é uma prisão e está destruindo nossas crianças", ele diz:
Esta incrível vontade de aprender e esta enorme
capacidade de aprendizado não são desligadas quando a criança faz 5 ou 6 anos
de idade. Nós é que as desligamos por meio de nosso coercitivo sistema de educação
compulsória. A maior e mais duradoura lição trazida pelo nosso sistema escolar
é que aprender é algo maçante, que deve ser evitado ao máximo possível.
Mas esta observação do doutor Gray não é nenhuma
novidade. Décadas atrás, o conhecido educador e defensor do ensino doméstico (homeschooling) John Holt escreveu em seu
livro — hoje best-seller — Como as Crianças Aprendem:
Queremos acreditar que estamos enviando nossas crianças
para a escola para que elas aprendam a pensar. Mas o que realmente estamos
fazendo é ensinando-as a pensar de maneira errada. Pior: estamos ensinando-as a
abandonar uma maneira natural e poderosa de pensar e a adotar um método que não
funciona para elas e o qual nós mesmos raramente usamos.
Ainda pior do que tudo isso: nós tentamos convencê-las
de que, ao menos dentro da escola, ou mesmo em qualquer situação em que
palavras, símbolos ou pensamento abstrato estejam envolvidos, elas simplesmente
não podem pensar. Devem apenas repetir.
Por meio deste processo de educação compulsória e
massificada, a curiosidade infantil e o impulso natural pelo aprendizado são continuamente
substituídos por um sistema de controle social que ensina às crianças que seus
interesses e observações não mais importam.
Ainda segundo o doutor Gray:
Em nome da educação, estamos cada vez mais roubando das
crianças o tempo e a liberdade de que necessitam para se educarem por conta própria
por meio de seus próprios métodos. Criamos um arranjo educacional no qual as crianças
devem suprimir seus instintos naturais — os quais as estimulam a estar no
controle do próprio aprendizado — para, em vez disso, simplesmente seguirem
automaticamente métodos e caminhos criados para elas por adultos, e os quais não
levam a lugar nenhum.
Criamos um sistema educacional que está literalmente
enlouquecendo jovens e tornando-os incapazes de desenvolver a autoconfiança e
as habilidades necessárias para as responsabilidades da vida adulta.
Sobre isso, pesquisas convincentes mostram que, quando
se permite que as crianças aprendam naturalmente, sem instruções coercitivas
vindas de cima para baixo, o aprendizado é mais profundo e muito mais criativo
do que quando as crianças são passivamente ensinadas. A professora Alison Gopnik, da Universidade de
Berkeley, Califórnia, descobriu em seus estudos
com crianças de quatro anos de idade, bem como em estudos
similares feitos pelo MIT, que o aprendizado direcionado a si próprio — em oposição
à instrução coerciva — elevam a criatividade, a capacidade de pensar e a própria
qualidade do aprendizado.
As pesquisas de Gopnik envolveram crianças novas
aprendendo a como manipular um brinquedo específico, o qual emitiria
determinados sons ou exibiria determinadas figuras em uma certa sequência.
Ela descobriu que, quando as crianças eram diretamente
ensinadas a como usar o brinquedo, elas conseguiam replicar os resultados e
rapidamente chegavam à "resposta certa" por conta própria ao apenas imitar o
que a professora demonstrava. Porém, quando, em vez disso, as crianças tinham a
liberdade de aprender sem qualquer instrução direta — brincar livremente com o
brinquedo, explorar livremente suas características, e descobrir seus recursos
por conta própria —, elas conseguiam chegar à "resposta certa" mais
rapidamente (em menos etapas) do que as crianças ensinadas.
Estas crianças que fizeram o "aprendizado direcionado
a si próprio" também descobriram outras partes e características do brinquedo
que podiam fazer coisas interessantes — as quais as crianças ensinadas não descobriram.
Gopnik resumiu essa pesquisa em um artigo
para a revista Slate dizendo:
A instrução direta talvez possa ajudar as crianças a
aprender fatos e habilidades específicas. Mas e quanto à curiosidade e à
criatividade — capacidades estas que, no longo prazo, são ainda mais
importantes para o aprendizado?
Ao passo que aprender com um professor pode ajudar as crianças
a obter uma resposta específica mais rapidamente, tal método também faz com que
elas sejam menos propensas a descobrir informações novas sobre um problema e a
criar novas e inesperadas soluções.
Aprendendo, e não doutrinando
A conformidade e a submissão podem ter sido os
objetivos sociais e econômicos dos arquitetos do modelo escolar compulsório
criado no século XIX, feito para funcionar de cima para baixo. Mas a economia
do século XXI exige criatividade e adaptação. Hoje, acima de tudo, é necessário
um modelo voltado para o aprendizado, que privilegie a capacidade de raciocínio
próprio e a criatividade, e não um modelo de ensino compulsório voltado para escola.
Como disse o antigo CEO da
Google, Eric Schmidt, "a cada dois dias criamos o mesmo volume de informações que
foi criado desde o surgimento da humanidade até 2003".
É impossível acreditar que um modelo arcaico de ensino
forçado pode se adaptar às exigências de uma nova economia saturada de informações
e cada vez mais voltada para a tecnologia, a qual requer agilidade,
inventividade, colaboração e um contínuo compartilhamento de conhecimento. Um modelo
educacional verdadeiramente transformador para o século XXI é aquele que
cultiva e estimula, e não esmaga e abole, a criatividade humana.
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