Os empresários do setor da construção civil estão
pedindo arrego. O crédito
está
escasso, os
distratos
estão crescendo e
vários
imóveis estão sendo
vendidos
com grandes descontos.
As construtoras estão dando comissões absurdas: a
prática normal é de 4 a 5%, mas algumas já estão concedendo de 8% a 13% (essa informação
veio de uma fonte interna). A ordem é
desovar os estoques o mais rapidamente possível, antes que os preços caiam
ainda mais.
Tudo isso seria apenas mais uma manifestação do
estouro da bolha imobiliária no Brasil, certo?
Mas não.
Sendo o Brasil o Brasil, sempre há detalhes ocultos.
Um conhecido meu — sim, também odeio esse clichê de
"conhecido meu", mas juro que o caso é verídico —, que possui
trânsito perante o alto escalão dos líderes da Construção Civil (e que, obviamente, pede anonimato), recentemente
me confidenciou que o senhor Jaques Wagner, ministro-chefe da Casa Civil, estaria
"tentando convencer" os líderes da Construção Civil a apoiar o retorno CPMF. Em troca do apoio e da aprovação do tributo, o governo abriria as torneiras dos bancos
estatais, que liberariam mais crédito imobiliário.
A julgar pelas recentes notícias sobre
a queda estrondosa na arrecadação do governo e seu desespero em fechar as
contas, bem como a quadragésima sétima versão do PAC explicitamente
criada para estimular a construção civil, a probabilidade de esse rumor ser
verídico é altíssima.
Eis aí o mais perfeito retrato de uma República
Bolivariana: o governo, que detém o controle de três dos quatro maiores bancos
do Brasil[1],
está abertamente "negociando favores" com uma classe empresarial em troca do apoio desta
classe. O recado é claro: "Ou vocês
ajudam os interesses do governo e se mantêm operantes, ou vocês não ajudam o governo e vão à
bancarrota". Empresário que quer rir tem de fazer o governo rir também.
Esse tipo de comportamento governamental é possível
porque, no Brasil, praticamente todo o crédito imobiliário está nas mãos de
bancos estatais. E é assim porque o
Tesouro utiliza dinheiro de impostos para repassar aos bancos estatais, e isso
possibilita aos bancos estatais fornecer crédito subsidiado para a compra de
imóveis. Atualmente, mesmo com a SELIC
em 14,25%, Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil concedem empréstimos
imobiliários a juros de menos da metade da SELIC. O Banco do Brasil cobra
juros de apenas 6,45% no financiamento da compra de imóveis. A Caixa
cobra 6,80%.
Os bancos privados, por sua vez, por não contarem
com essa muleta do Tesouro, não podem se dar ao luxo de fazer empréstimos
imobiliários a esses juros irreais, e, como consequência, foram "colocados para
fora" deste mercado e praticamente não concedem empréstimos imobiliários.
No momento, por causa da forte recessão, do aumento
do desemprego, do alto endividamento das pessoas, dos distratos, e da queda do
preço dos imóveis, os próprios bancos estatais estão restringindo os
empréstimos. Mas o governo promete
liberar geral caso os empresários apoiem a volta da CPMF.
Essa ligação umbilical — muitas vezes voluntária,
às vezes forçada — entre estado e grandes empresários não apenas está na raiz
da Lava-Jato, como também é o arranjo mais premente de uma economia que opera
sob um estado gigante e onipresente.
Esse "capitalismo
de quadrilhas" (na definição de Gustavo Franco) é a ilustração perfeita do
descalabro ao qual o país está submetido: estado e grandes empresas se aliando
— se a aliança é voluntária ou forçada pouca importa — e o resto da
população se estrepando em decorrência, arcando com a volta da CPMF e com mais pressão inflacionária em decorrência de mais
crédito estatal.
No Brasil funciona
assim:
___________________________
[1]
Eis a ordem dos bancos por ativos
totais:
Banco do Brasil: R$ 1,325 trilhão
Itaú: R$ 1,118 trilhão
Caixa Econômica Federal: R$ 1,065 trilhão
Bradesco: R$ 883 bilhões
BNDES: R$ 871 bilhões
Santander: R$ 598 bilhões
HSBC: R$ 168 bilhões
Soma dos ativos dos três estatais: R$ 3,261 trilhões
Soma dos ativos dos quatro privados: R$ 2,767 trilhões