Economistas
keynesianos sustentam que, para que uma economia possa gerar o máximo possível
de empregos, o principal enfoque do governo deve ser o gasto agregado. Em épocas de recessão, então, tal conselho é
redobrado. Apenas os gastos do governo,
nesse cenário, podem gerar empregos, afirmam os keynesianos. Com um aumento nos empregos, a demanda por
consumo iria aumentar também, e isso estimularia a economia — é o que eles
dizem.
Essa
maneira de pensar é baseada na ideia de que aumentos iniciais nos gastos em
consumo tendem a desencadear um processo reforçador, o qual supostamente
fortalece a produção total da economia em uma quantidade que é múltipla da
quantidade inicial de gastos.
O
homem que popularizou o poder mágico do multiplicador, John Maynard Keynes,
escreveu:
Se o Tesouro se dispusesse a
encher garrafas usadas com papel-moeda, as enterrasse a uma profundidade
conveniente em minas de carvão abandonadas que logo fossem cobertas com o lixo
da cidade e deixasse à iniciativa privada, de acordo com os bem experimentados
princípios do laissez-faire, a tarefa de desenterrar novamente as notas
(naturalmente obtendo o direito de fazê-lo por meio de concessões sobre o
terreno onde estão enterradas as notas), o desemprego poderia desaparecer e,
com a ajuda das repercussões, é provável que a renda real da comunidade, bem
como a sua riqueza em capital, fossem sensivelmente mais altas do que, na
realidade, o são. Claro está que seria mais ajuizado construir casas ou algo
semelhante; mas se tanto se opõem dificuldades políticas e práticas, o recurso
citado não deixa de ser preferível a nada.[1]
Para
os keynesianos, a chave do crescimento econômico é o gasto. Quanto maior for o gasto, maiores serão a
renda e o crescimento econômico real.
Os recursos dependem de dinheiro?
No
atual cenário recessivo americano e europeu, os defensores de pacotes de
estímulos mais volumosos argumentam que estimular o
emprego por meio de vários programas de estímulo é algo que não se dará à custa
de outras atividades. Isso significa que
empregar pessoas que estão desempregadas será algo "gratuito", sem nenhum
custo. De acordo com o defensor dessa visão, Paul
Krugman,
A questão é que, nesse momento,
temos um desemprego em massa. Se você
colocar 100.000 americanos para trabalhar agora cavando buracos, você não
estará retirando esses 100.000 trabalhadores de outros setores. Você estará colocando-os para trabalhar
quando a única outra opção seria deixá-los à toa.[2]
Porém,
fica a pergunta: como esse aumento no emprego seria financiado? De onde viriam os recursos? Quem iria pagar por tudo isso? Para Krugman e os keynesianos, o financiamento
pode ser facilmente gerado pelo banco central, por meio da criação de dinheiro.
Mas,
contrariamente ao que eles alegam, financiamento e recursos não dependem de
dinheiro: eles dependem apenas da poupança real — isto é, bens de consumo não
utilizados. É a produção de bens de
consumo e de serviços que mantém as vidas e o bem-estar das pessoas.
Quando
um padeiro troca os pães que ele poupou por batatas, ele está na verdade
fornecendo um meio de sustento para o cultivador de batatas. Da mesma forma, o batateiro está fornecendo
um meio de sustento — isto é, batatas que ele poupou — para o padeiro. Note que a poupança real sustenta os
produtores nos vários estágios da produção.
(A poupança real sustenta os produtores de bens intermediários e os
produtores de bens de consumo e de serviços).
Observe
que, com o objetivo de manter sua vida e bem-estar, as pessoas requerem bens de
consumo e serviços, e não dinheiro, o qual é apenas um meio de trocas. O dinheiro serve apenas para facilitar as
transações comerciais — ele não produz nenhum bem real. Parafraseando Jean-Baptiste Say, Mises
escreveu,
As mercadorias, disse Say, são
em última instância pagas não com dinheiro, mas com outras mercadorias. O
dinheiro é simplesmente o meio de troca mais comumente utilizado; sua função é
apenas intermediar a transação. No final, o que o vendedor quer receber em
troca das suas mercadorias vendidas são outras mercadorias.[3]
Os vários maquinários e ferramentas que existem — ou a infraestrutura que as pessoas criaram —
servem apenas para um propósito: produzir os bens de consumo final que são
necessários para manter e promover a vida e o bem-estar das pessoas.
Considerando-se
que os produtores dos bens de consumo também precisam consumir, quanto maior a
produção de bens de consumo, maior será o conjunto da poupança real disponível
para servir de financiamento. Uma maior
quantidade de bens poupados pode agora sustentar mais indivíduos cujos empregos
têm o objetivo de aprimorar e expandir a infraestrutura.
Isso,
obviamente, significa que, por meio do aumento da poupança real, uma melhor
infraestrutura pode ser construída.
Isso, por sua vez, estabelece os fundamentos para um maior crescimento
econômico.
Um
maior crescimento econômico significa uma maior quantidade de bens de consumo
produzidos, o que por sua vez permite uma maior poupança (um maior número de
bens não consumidos) e também um maior consumo.
Com mais poupança disponível, uma infraestrutura mais aprimorada pode
ser criada, e isso por sua vez estabelece os fundamentos para uma maior robustez
no crescimento econômico.
Observe
que, nesse cenário, os poupadores são os geradores de riqueza. São os geradores de riqueza que poupam e
empregam sua poupança real na formação da infraestrutura.
A
poupança dos geradores de riqueza é empregada no financiamento de vários
indivíduos especializados na construção e na manutenção da infraestrutura. (A poupança real também financia indivíduos
que estão envolvidos na produção de bens de consumo.)
Contrariamente
às alegações de Krugman e dos keynesianos, a criação artificial de empregos (tais como cavar buracos) nunca pode ser livre de custos. Os indivíduos desempregados que serão
empregados em projetos inúteis precisam ser financiados; eles precisam receber
recursos. Dado que o governo não produz
nenhuma riqueza real, o financiamento terá de ser retirado de atividades
geradoras de riqueza. Tal medida,
entretanto, irá destruir a poupança dos agentes geradores de riqueza e irá
debilitar o processo de geração de riqueza real.
O
simples exemplo a seguir resume bem a situação: suponha que, em uma economia
formada por um padeiro, por um sapateiro e por um cultivador de tomates, surja
um quarto indivíduo. Esse indivíduo é um
criminoso que exerce sua demanda por bens pelo uso da força. Pergunta: poderia tal demanda gerar uma maior
produção, exatamente como acredita o pensamento popular? Pelo contrário, ela irá apenas empobrecer os
produtores. O padeiro, o sapateiro e o
agricultor serão forçados a abrir mão de seu produto a troco de nada, e isso
por conseguinte irá debilitar o fluxo da produção de bens de consumo.
Dado
que o governo não produz nenhuma riqueza real, ele obviamente não pode poupar
e, consequentemente, não pode financiar nenhuma atividade. Logo, quando o governo se envolve em alguma
atividade, ele deve necessariamente obter seu financiamento — isto é,
poupança real — dos geradores de riqueza, confiscando a poupança destes.
Pode algo ser gerado do nada?
Pode
um aumento na demanda por bens de consumo levar a um aumento na produção total,
em uma quantidade múltipla do aumento dessa demanda, como sugerem Keynes e
Krugman? Se isso for possível, então a
conclusão lógica é que algo útil pode ser gerado do nada.
Quando
um padeiro aumenta sua demanda por bens e quer satisfazê-la, ele precisa ter os
meios de pagamento (isto é, pães) com os quais irá pagar pelos bens e serviços
que deseja. Por exemplo, o padeiro
adquire cinco tomates pagando em troca oito pães que ele poupou. Da mesma forma, o sapateiro satisfaz sua
demanda por dez tomates pagando em troca um par de sapatos que ele poupou. O cultivador de tomates satisfaz sua demanda
por pães e sapatos com os quinze tomates que ele poupou.
Um
aumento na oferta de bens de consumo permite um aumento na demanda por
bens. Assim, quando o padeiro aumenta
sua produção de bens, isso irá permitir que ele aumente sua demanda por outros
bens. Nesse sentido, o aumento na
produção e oferta de bens gera a demanda por bens. Vale enfatizar novamente que as pessoas
produzem com o objetivo de poderem, com sua produção, demandar bens que irão
sustentar sua vida e seu bem-estar.
O
que permite a expansão na oferta de bens de consumo é o aumento na quantidade
de bens de capital, de ferramentas e de maquinário. O que, por sua vez, permite o aumento da
quantidade de ferramentas e maquinário é a poupança real. Podemos, assim, deduzir que o aumento no
consumo deve estar em linha com o aumento na produção. Disso podemos deduzir que um aumento no
consumo não pode fazer com que a produção aumente em um múltiplo desse aumento
no consumo. Isso é algo que não faz
sentido. O aumento na produção sempre
vai estar rigorosamente de acordo com o que o conjunto da poupança real
permite. Uma expansão da oferta
monetária pode apenas rearranjar os fatores de produção (bens de capital,
mão-de-obra etc.); ela não pode por si só aumentar a produção. A produção não pode se expandir sem o suporte
da poupança real — isto é, algo não pode surgir do nada. Se uma expansão monetária "aumentou" a
produção, é simplesmente porque havia poupança real disponível para tal.
Tudo
isso, obviamente, significa que somente os geradores de riqueza podem
desencadear uma expansão na riqueza real.
O governo não pode salvar a economia
Sempre
que a capacidade de os geradores de riqueza produzirem poupança real é
restringida, o crescimento econômico é prejudicado. E não há quantidade de dinheiro que o governo
jogue na economia que possa fazê-la crescer. (Novamente, o governo não pode
criar poupança real, ele pode apenas retirar a atual poupança real dos geradores
de riqueza.)
Quando o processo de geração de riqueza está prejudicado e as políticas fiscais
e monetárias se mostram ineficazes em "reativar" a economia — como ocorre
atualmente nos EUA —, vários economistas keynesianos, como Krugman, se apressam
em sugerir que as leis da economia devem ter mudado. Para eles, isso significa esquecer a análise
lógica baseada nas leis essenciais da economia e começar a defender gastos
maciços.
De
acordo com Krugman,
Estamos em uma época atípica, em
que a intuição comum não mais se aplica.
Reativar a economia americana é a melhor coisa que podemos fazer, não
apenas para o presente, mas também para o futuro e para nossos filhos.[4]
Se
o conjunto da poupança real estiver solapado, adotar o conselho de Krugman —
qual seja, implementar um maciço pacote de gastos governamentais — irá apenas
piorar bastante a situação, e afundar a economia americana em uma depressão
muito mais severa. Se o conjunto da
poupança real ainda estiver sólido, então não há necessidade de pacotes de
estímulos: a própria poupança irá reativar a economia.
Conclusão
Não
obstante o maciço pacote de estímulos fiscais (US$ 800 bilhões) implementado
no ano passado, a economia americana continua letárgica. Vários indicadores econômicos, após terem
apresentado uma breve reação, já voltaram a apresentar um visível
enfraquecimento. Muitos especialistas,
inclusive o presidente Barack Obama, são partidários da ideia de que um pacote fiscal
mais arrojado irá resolver a situação.
Nossa análise, entretanto, indica que um estímulo fiscal não apenas não
pode reativar a economia, como também irá piorá-la sobremaneira.
O
elemento chave tanto para uma recuperação quanto para um crescimento econômico
sustentável é a formação de poupança real.
Essa formação pode ser feita apenas por geradores de riqueza, e não por
gastos governamentais, os quais apenas debilitam o processo de formação de
riqueza.
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Notas
[1] J.M. Keynes. A Teoria Geral do Emprego, do
Juro e da Moeda (Macmillan & Co. LTD 1964), p. 129.
[2] Paul Krugman, entrevista à CNBC em 31 de agosto de
2010.
[3] Ludwig von Mises, "Lord Keynes e a Lei de Say"
[4] Paul Krugman, entrevista
à CNBC em 31 de agosto de 2010.