quarta-feira, 24 abr 2019
Bernie Sanders pertence
à ala da extrema-esquerda do Partido Democrata. Ele quase foi o candidato à
presidência dos EUA pelo partido, em 2016, mas perdeu a nominação para Hillary
Clinton.
No entanto, sua base de apoio é extremamente
fervorosa, e é formada majoritariamente por adolescentes e jovens millennials,
todos defensores abertos do socialismo.
Mais do que isso: o próprio Sanders é um auto-declarado
socialista, e um contumaz defensor
do regime venezuelano, o qual ele diz que deveria
ser imitado pelos EUA.
Ainda mais famoso que sua defesa do socialismo é o
seu desdém
pelos ricos
(sendo que ele próprio possui três
mansões), os quais, segundo
Sanders, são a fonte de todos os problemas dos EUA, bem como os causadores
do aquecimento global.
Na semana passada, Sanders, que quer ser o candidato
democrata às eleições presidenciais americanas de 2020, tornou públicas suas declarações
de imposto de renda. E, para a surpresa de ninguém, o socialista que odeia
os ricos é ele próprio um milionário.
Graças aos royalties das vendas de um livro que
escreveu, Sanders está hoje, como
a disse a CNN, "na categoria dos super-ricos". Ou, como alguns diriam, ele
é parte do 1%.
Após toda uma vida política denunciando "milionários
e bilionários" como a causa de tudo o que há de ruim nos EUA, esta
revelação foi um tanto embaraçosa para Sanders.
Contradição constrangedora
Alguns críticos de Sanders afirmaram que isso faz
dele um hipócrita. Eis um homem que vitupera milionários, mas ele próprio é um.
"Hipócrita", no entanto, não necessariamente seria o
termo certo, desde que Sanders pague
as alíquotas de impostos que ele diz que os milionários deveriam pagar, sua
renda, por si só, não faz dele um hipócrita.
No entanto, até o momento, isso não ocorreu. Como
mostra sua declaração de IR, ele e sua mulher pagaram uma alíquota de 26%, bem
abaixo do valor de 52% que ele defende
que os ricos devem pagar — e que, dependendo do humor dele, pode chegar a 77%.
Para compensar essa "magra" tributação, o casal doou
US$ 19.000 para instituições de caridade, o que equivale a apenas 3,4% de sua
renda.
Vale lembrar que nada proíbe Sanders de doar
voluntariamente seu dinheiro ao governo federal. Qualquer americano pode fazer
doações para o governo, como o website do Tesouro claramente
instrui (até o momento, o Tesouro já recebeu US$ 3,7
milhões em doações).
O fato de Sanders não ter feito isso mostra que, na
prática, ele quer que apenas "os outros" sejam confiscados, e não ele.
Ainda sobre "hipocrisia", é fato que Sanders também pode escapar da pecha de hipócrita
dizendo que, quando denuncia milionários, ele não se refere a todos eles, mas
apenas a, digamos, 90% deles. E então ele pode se autoincluir entre os 10% do
bem.
Não obstante, Sanders não parece estar muito
confortável com seu status de rico. Ao ser confrontado por estar entre aqueles
que ele sempre vituperou, Sanders foi
para a defensiva:
"Eu
escrevi um livro que se tornou um best-seller", declarou. "Se você escrever um
best-seller, você também pode se tornar um milionário."
Tradução: "Ganhei meu dinheiro de maneira justa e
honesta; portanto, pare de me importunar!".
E é exatamente neste
ponto que começamos a ver Bernie Sanders contradizer suas próprias afirmações
sobre milionários, riqueza e capitalismo.
Bernie
Sanders, o capitalista, refuta a desigualdade e a teoria da exploração
Para uma pessoa normal, a defesa feita por Sanders
de suas riquezas não seria problema nenhum. Não há dúvidas de que muitas
pessoas ricas, ao serem perguntadas sobre como ganharam seu dinheiro,
responderiam: "Trabalhei para isso. Mereço."
No entanto, quando é o socialista Bernie Sanders
quem diz isso, a coisa se torna mais espantosa.
Afinal, um dos principais mitos difundidos por
Sanders e por toda a ala socialista da esquerda é que as pessoas que enriquecem
fazem isso explorando os pobres. Assim como ocorre com os marxistas ortodoxos,
há uma crença ampla e muito difundida entre a esquerda de que a riqueza só pode
ser obtida por meio da exploração dos trabalhadores. Ademais, essas pessoas
acreditam que as economias de mercado sistematicamente favorecem os ricos ao
mesmo tempo em que proíbem o sucesso econômico daqueles que não nasceram ricos.
Segundo esta narrativa, aqueles que porventura são ricos, mas que não
exploraram os trabalhadores diretamente, provavelmente herdaram seu dinheiro de
outras pessoas que inegavelmente exploraram trabalhadores.
Entretanto, ao ouvirmos Bernie Sanders explicando
sua riqueza, é perceptível que ele próprio acredita que a riqueza pode ser
obtida por meio do trabalho duro e honesto: "Eu escrevi um livro que se tornou
um best-seller. Se você escrever um best-seller, você também pode se tornar um
milionário."
Tradução: "Você pode ganhar muito dinheiro se você
for bom no que faz. É realmente simples assim!".
Isso inegavelmente se parece muito com o argumento do
"enriquecer por meio de seus próprios esforços", o qual a esquerda tão
veementemente rejeita. E é um tanto bizarro ouvi-lo de um autodeclarado
socialista.
Mas, realmente, não deveria ser surpresa nenhuma o
fato de que, ao ser questionado sobre suas riquezas, Sanders tenha recorrido a
um clichê capitalista. Ele obviamente fez isso porque o argumento faz sentido
para qualquer pessoa racional. Dado que Sanders tinha de argumentar que sua
riqueza foi obtida moralmente, ele recorreu ao argumento mais lugar-comum
possível: ele enriqueceu porque fez por
merecer.
Supondo que estamos falando apenas da renda que ele
obteve com as vendas de seu livro, ele está certo. Ninguém foi obrigado a
comprar seus livros. Ele ganhou dinheiro porque as pessoas voluntariamente
entregaram seu dinheiro em troca do livro. Por esta medida, Sanders de fato
"mereceu" seu dinheiro.
Porém, as observações de Sanders sobre as origens de
sua riqueza não terminam aí. Há várias constatações interessantes.
Para começar, ao enfatizar que seu livro foi um
"best-seller", ele está admitindo que toda
a logística envolvendo a distribuição e entrega do produto para um grande
número de pessoas foi um fator crucial para que ele pudesse enriquecer.
Sendo assim, por definição, Sanders aparentemente
acredita que é possível produzir um bem ou serviço sem explorar trabalhadores.
Afinal, seus livros não simplesmente apareceram magicamente no mundo. Seres humanos trabalharam para editar e
imprimir os livros, organizá-los, montá-los e distribuí-los por todas as
livrarias do país. Sanders ganhou dinheiro utilizando a mão-de-obra destas
pessoas.
Com efeito, ele ganhou muito mais dinheiro do que todos os caminhoneiros que distribuíram
seus livros para as livrarias de todo o país. Ele ganhou muito mais dinheiro
que todos os trabalhadores que aturam na montagem dos livros.
Será que Sanders acredita que ele explorou esses
trabalhadores? Aparentemente não. Sanders justifica sua riqueza como
consequência de ter escrito um livro que as pessoas voluntariamente compraram.
Ele não menciona absolutamente nada a respeito de todos os trabalhadores
envolvidos no processo de produção que fizeram com que seu livro chegasse aos
leitores.
Ademais, ao admitir que a enorme venda dos livros
foi o que o tornou um milionário, ele está confessando que o ato de entregar um
bem ou serviço desejado pelos consumidores é essencial para permitir o
enriquecimento. Em outras palavras, tivesse ele apenas escrito um livro, ele
não teria virado milionário. Porém, dado que ele escreveu um livro que virou best-seller — isto é, que agradou os
consumidores —, isso trouxe a ele muito dinheiro.
Logo, dado que o segredo — como admite o próprio
Sanders — para enriquecer é vender algo que as pessoas
querem, isso não significaria que, em uma economia de mercado, os
milionários e bilionários são aqueles que estão fornecendo um benefício para a
sociedade?
Sanders está reconhecendo que o tamanho da riqueza
está ligado a quantos
consumidores um empreendedor atende no mercado. Sanders aparentemente
acredita que pelo menos um milionário
— ele próprio — enriqueceu porque forneceu às pessoas o que elas queriam. E,
se este é o caso, qual é o sentido de dizer que os ricos não estão pagando a "quantidade justa" de
impostos?
E dá para ir ainda mais fundo.
No que tange à questão da desigualdade de renda,
Sanders deixa claro que entende sua causa. E se nem todos tiverem a capacidade
e o talento para escrever um best-seller? Isso não significaria que algumas
pessoas terão milhões de dólares ao passo que outras terão muito menos? Isso
não criaria uma desigualdade?
A resposta, obviamente, é sim.
Vale enfatizar: estima-se que 73%
da população adulta dos EUA tenha um computador. Isso equivale a 187,4 milhões de pessoas.
Quantas delas são capazes de produzir um best-seller? Muito poucas. Já Sanders,
utilizando um laptop que custa apenas algumas centenas de dólares, produziu um
livro que lhe trouxe uma renda de US$
795.000. Utilizar um insumo que vale poucas centenas de dólares e criar um
produto que gera US$ 795.000 é a essência do capitalismo empreendedor.
Logo, podemos constatar — pelo próprio sucesso de
Sanders ao vender livros — que a desigualdade não é necessariamente resultado de
ricos explorando pobres. Ela pode simplesmente ser o resultado de algumas
pessoas venderem mais livros que outras.
Conclusão
Nesta sua curta entrevista, aprendemos algumas
coisas com Sanders:
1. Ele acredita que fornecer um produto (ou serviço)
que seja demandado justifica a alta renda obtida por aqueles que o produzem.
2. Há um elo entre a renda obtida e o número total de pessoas
servidas.
3. Se você fizer o mesmo — isto é, atender demandas
de um grande número de pessoas — poderá virar um milionário também.
4. Esses três fatores geram uma desigualdade natural entre as pessoas.
Sem exageros, eis aí um pequeno manifesto
capitalista de Sanders.
Infelizmente, é improvável que ele utilize estas recém-descobertas
revelações e as coloque em prática em termos de políticas públicas. Ele certamente
continuará fazendo discursos socialistas e anti-capitalistas. E por que não deveria?
Foi isso o que o tornou um
milionário.