quarta-feira, 23 jan 2019
No Brasil, a alíquota máxima do Imposto de Renda de
Pessoa Jurídica é de 15%. No entanto, há uma sobretaxa de 10% sobre o
lucro que ultrapassa determinado valor.
Mas não pára por aí.
Há também a CSLL (Contribuição
Social Sobre o Lucro Líquido), cuja alíquota pode chegar a 32%; o PIS,
cuja alíquota pode chegar a 1,65% e a COFINS,
cuja alíquota chega a 7,6%. PIS e COFINS incidem sobre a receita
bruta.
No final, a alíquota efetiva máxima sobre empresas chega a 34%.
É simplesmente a 13ª maior
do mundo.
(Adicionalmente, há também o ICMS, que varia de
estado para estado, mas cuja média é de 18%,
e o ISS municipal. Embora estes sejam impostos indiretos — em tese arcados
pelo consumidor —, eles afetam as receitas das empresas, pois estas seriam maiores
sem eles. Não tente fazer a conta, pois você irá se apavorar.)
O atual Ministro da Economia Paulo Guedes quer
reduzir essa alíquota máxima de 34% para 15%. Para contrabalançar essa redução,
ele pretende implantar a tributação de dividendos, que hoje são isentos, para
15% (há veículos de imprensa dizendo que ele
quer 20%).
Algumas considerações.
Não
tributar dividendos é questão de lógica
Ao contrário do que dizem os
progressistas demagogos, o fato de o Brasil, até o momento, não tributar
dividendos não configura nenhum "privilégio para rentistas". E por um motivo
simples: se os dividendos fossem tributados, isso equivaleria a uma dupla tributação.
A empresa já pagou 34% sobre seus ganhos. O que
sobrou ela irá ou reinvestir ou distribuir como dividendos para seus acionistas
(que são os proprietários da empresa, algo
que qualquer pessoa física com conta em corretora pode se tornar).
Se esses dividendos também fossem tributados, isso
nada mais seria do que uma bitributação.
Eis um exemplo tosco, mas que ajuda a entender: a empresa
ganhou R$ 100, pagou R$ 34 de imposto e ficou com R$ 66. Se esses R$ 66 forem
novamente tributados ao serem distribuídos para os proprietários da empresa, então
é óbvio ululante que está ocorrendo uma bitributação.
Na prática, seria como se o Manoel, o proprietário da
padaria, após pagar o IRPJ, também tivesse de pagar imposto sobre o dinheiro
que sobrou e que ele sacou para pagar a conta de luz da sua casa.
Logo, não faria sentido nenhum o Brasil, que já possui
uma das maiores alíquotas de imposto corporativo em todo o mundo
(de novo: é simplesmente a 13ª maior do mundo), tributar também dividendos. A
soma de um IRPJ efetivo de 34% mais tributação de dividendos tornaria insana a nossa já tresloucada
carga tributária.
Os
prós e contras da proposta
A proposta de Paulo Guedes de reduzir essa alíquota
máxima de 34% para 15% é louvável. Por outro lado, sua intenção de contrabalançar
essa redução implantando a tributação de dividendos em 15 ou 20%, com o
objetivo de "não afetar a receita", é lamentável.
E por dois motivos.
Primeiro porque, em termos puramente filosóficos, a medida em nada altera o fato de que está
havendo um confisco estatal da propriedade privada alheia. O dinheiro obtido
por meio da produção continuará sendo igualmente confiscado, tendo mudado
apenas o momento em que ocorre o confisco:
antes, ele ocorria integralmente no momento da receita; agora, ele será
reduzido no momento da receita, mas será aumentado no momento em que o proprietário
for usufruir essa receita.
Segundo porque tal medida ressalta a propensão dos
seguidores da Escola de Chicago em não admitir quedas na receita. É como se a
receita do governo fosse algo sagrado e intocável, a qual deve, na melhor da hipóteses, ser mantida, jamais reduzida.
Em todo caso, para não ficarmos só no campo do
negativismo, e reconhecendo que o mundo real possui inúmeras variáveis que dependem
inteiramente da política, seria honesto dizer que, entre deixar como está ou optar pela medida de Guedes, esta segunda
é preferível.
E há dois motivos para se aceitá-la.
1) O fato de o confisco na base cair de 34% para 15%
já é louvável por si só.
Sempre que o assaltante permitir que o esbulho
imediato seja menor, aceite a proposta. É verdade que você, como proprietário da
empresa, não poderá usufruir este dinheiro imediatamente (pois aí viraria
dividendo, e ele seria tributado), mas ao menos você agora terá à sua disposição
mais dinheiro para reinvestir e aumentar
seus lucros futuros.
Tendo mais dinheiro para ser reinvestido (pois o
confisco caiu de 34% para 15%), o retorno nominal
sobre o investimento será maior. Antes, a empresa lucrava R$ 100, pagava R$ 34
de imposto e ficava com R$ 66 para reinvestir (ou distribuir dividendo). Agora,
essa mesma empresa irá pagar R$ 15 de imposto e terá R$ 85 para reinvestir.
No longo prazo, reinvestir continuamente R$ 85 em
vez de R$ 66 fará com que os retornos nominais
sejam muito maiores. Investir R$ 66 a
uma taxa de lucro de 10% ao ano gera R$ 72,60 em um ano. Investir R$ 85 à mesma
taxa de 10% ao ano gera R$ 93,50 em um ano.
Ou seja, do ponto de vista da empresa, o montante disponível
para investir será maior e, consequentemente, os lucros auferidos serão maiores (o que permitirá maiores dividendos).
E isso, por sua vez, permitirá mais novos investimentos.
Para a economia como um todo, isso será muito
positivo: o fato de empresas terem montantes maiores disponíveis para serem
investidos tende a se traduzir em expansão de fábricas, em aumento da
capacidade produtiva, em mais bens e serviços sendo produzidos, em aumento de contratações,
em maiores salários e, como corolário, um maior padrão de vida para todos.
A única maneira de uma economia enriquecer é
aumentando a taxa de investimentos produtivos. Se o capital disponível para
esses investimentos produtivos aumentar, então tal medida é digna de apoio.
2) O fato de que "a tributação na origem foi
reduzida" e que o restante da tributação só ocorrerá se você usufruir o capital
em benefício próprio — ou seja, ao receber dividendos — ao menos dá a opção de postergar essa tributação.
Sim, você continuará sendo espoliado ao coletar o
dinheiro, mas ao menos você agora pode evitar essa tributação caso opte por
postergar o recebimento desse dinheiro (embora as empresas sejam obrigadas por lei a distribuir dividendos, a frequência com que isso ocorre pode ser alterada). Está longe de ser o ideal, é claro, mas
ao menos você agora tem opção.
O assaltante está dizendo: "Entregue 34% agora ou
15% agora e 15% depois. Escolha!". A segunda opção é um pouco mais aceitável.
A lógica, aliás, é a mesma para a diferença entre a tributação
direta e a indireta. Dos impostos diretos (Imposto de Renda, IPTU, IPVA, ITR
etc.) você não consegue escapar. Já dos impostos indiretos você consegue: basta
não consumir determinados bens e serviços. É o ideal? Claro que não. Mas ao
menos é uma opção.
Para
concluir
É importante ressaltar que toda a análise acima
parte do óbvio princípio de que a "tributação de dividendos" se refere aos
dividendos pagos por empresas com capital aberto na bolsa de valores. Afinal, sempre
que economistas falam sobre "tributar dividendos", eles tendem a se
referir apenas aos dividendos pagos por empresas negociadas em bolsa. O senso
comum sempre foi esse. A análise também vale para empresas de capital fechado que estejam sendo contempladas por essa redução tributária de 34% para 15%. Estou partindo deste princípio.
Entretanto, caso a proposta de Guedes envolva a tributação
de dividendos de micro e pequenas empresas que estão no Simples Nacional — e que não estão
tendo redução de impostos (ao menos, não por ora) —, então, obviamente, a situação
muda, pois aí estaria havendo aumento de impostos. Mas quero crer que o governo
não será tolo a esse ponto.
Isto posto, vale repetir o que foi dito ao longo do artigo: entre deixar como está ou aceitar a
proposta de Guedes, é válido reconhecer que a segunda opção é melhor, desde que o governo não invente novos impostos ou aumente outras alíquotas já existentes.
Ainda está longe do
ideal, mas ao menos é melhor que o atual arranjo. Sempre
que o assaltante lhe der uma opção melhor, aceite.