quinta-feira, 24 0aio 2018
É
extremamente raro — se não inédito — ver um político reconhecer
que seu governo errou
Sem
dúvida, o simples fato de um político reconhecer que o governo falhou já é um
avanço. Só que isso nem sequer deveria ser necessário.
O
conhecido aforismo em latim "errare humanum est" já deixa manifesto
que o erro é inerente ao — e inseparável do — ser humano. Sendo assim, a
menos que um político esteja implicitamente sugerindo que os governantes estão
acima dos comuns mortais (não duvide disso), um reconhecimento de erro acaba
sendo redundante. É claro que os políticos se equivocam: o sobrenatural
seria se eles não errassem.
No
entanto, vale enfatizar que o aspecto mais relevante do "erro
político" não é que ele exista, mas sim as consequências que ele
acarreta.
Quando
um indivíduo qualquer se equivoca, os custos e os prejuízos vinculados ao seu
erro são arcados por ele próprio. A responsabilidade individual consiste exatamente
em aceitar as consequências de nossas ações, em não culpar os outros por nossas
falhas, e em não descarregar nem culpas nem ônus sobre terceiros inocentes.
Na
teoria econômica, com efeito, criou-se o termo "externalidades
negativas" para descrever custos que são arcados não pelo indivíduo que as
produziu, mas sim por terceiros.
Já
os políticos, por sua vez, são inteiramente capazes de transferir o custo de
seus erros para todo o conjunto da população, de modo que eles próprios acabam
muitas vezes escapando ilesos.
No
final, quem são os grandes prejudicados pelos fiascos das políticas implantadas
pelo governo senão a própria população?
A lista
Eis
uma lista de erros clássicos que, embora cometidos por políticos e seus
governos, são inteiramente arcados pela população.
a)
A política de congelar o preço dos combustíveis, obrigando a Petrobras a vender
para as distribuidoras gasolina
e diesel abaixo do preço pelo qual foram importados, destruiu o
capital da estatal, causando um prejuízo de aproximadamente R$ 60 bilhões. (Valor este que, diga-se de passagem, é muito
maior do que o desviado pela corrupção
na estatal).
Para
compensar este estrago, o governo teve de elevar os preços dos combustíveis (o próprio presidente da Petrobras admitiu que sua nova política de preços era explicitamente voltada para refazer o caixa da empresa),
fazendo com que eles sigam
batendo recordes quase que diários. Quem arcou com tudo isso?
b) A política de aumento contínuo dos gastos públicos gerou um explosivo déficit orçamentário e um grande aumento na dívida pública. Tamanha deterioração das contas do governo levou ao aumento de impostos, como a duplicação do PIS/COFINS sobre gasolina e diesel, afetando a renda do cidadão, além de restringir a criação de empregos e investimentos. Quem arcou com tudo isso?
c) A política de crédito subsidiado concedido pelos bancos estatais para
grandes empresas não apenas foi inerentemente inflacionária, como
ainda distorceu todo o
mercado de juros e piorou a situação fiscal do governo.
No
final, quem arcou com o aumento de preços, com os juros mais altos e com a elevação de tributos
para reequilibrar as contas do governo?
d)
A política de crédito
subsidiado para a compra de imóveis, além de também ser inerentemente
inflacionária, gerou um forte aumento nos preços dos imóveis, inclusive dos mais
populares.
Quem
arcou com o aumento dos preços dos imóveis (o que gera maior endividamento para
a aquisição da casa própria) e, em vários casos, acabou tendo de viver de
aluguel ou mesmo sendo forçado a morar em
barracões?
e)
A política de obrigar geradoras e transmissoras de energia elétrica a baixar
suas tarifas na marra inviabilizou vários investimentos destas, e
consequentemente obrigou as distribuidoras a recorrer ao mercado de curto
prazo, cujos preços são muito maiores. Assim, as distribuidoras tiveram de
comprar caro e revender barato, pois o preço da revenda estava congelado pelo
governo.
Como
consequência, as distribuidoras ficaram desabastecidas
e endividadas, e tiveram de ser socorridas pelo Tesouro (nossos impostos). O
montante repassado chegou a R$
39 bilhões e as tarifas ao consumidor dispararam
80%, ficando muito mais caras do que antes da intervenção. Quem arcou
com tudo isso?
f)
A política de criar agências reguladoras serviu para criar uma reserva de mercado
para os grandes empresários já estabelecidos, protegendo-os de eventuais concorrentes
(veja aqui a lista
de agências reguladoras e como elas afetam a livre concorrência).
Isso
impediu que houvesse uma maior oferta de serviços no mercado, assim como preços
mais baixos e produtos de maior qualidade. Quem arcou com tudo isso?
g)
A política de aumento
generalizado das tarifas de importação — para proteger o grande baronato
industrial e os poderosos sindicatos dos trabalhadores dessas indústrias —
ajudou a encarecer sobremaneira os preços de vários bens de consumo, além de
ter tornado a indústria nacional mais ineficiente. Quem
arcou com tudo isso?
h)
A política de encargos sociais e trabalhistas encareceu artificialmente
a mão-de-obra e, com isso, não apenas impediu que os salários fossem
maiores, como ainda empurrou 44
milhões de pessoas para a informalidade. Quem arcou com tudo isso?
Nós somos os responsáveis
solidários
Tendo
arrogado para si próprios um poder quase absoluto para decidir sobre nossas
vidas e economias, os políticos, ao cometerem erros, detêm o benefício de
converter a sociedade em responsável solidária por seus erros.
Aquilo
que no livre mercado seria considerado inaceitável e motivo de acionamento
judicial — as ações de um indivíduo repercutirem adversamente sobre um outro
que não é obrigado a arcar com elas —, torna-se a regra quando o envolvido é o
estado: os erros dos políticos se transformam estruturalmente em um fardo
compartilhado por todo o conjunto da sociedade.
Sim,
os políticos e governantes erram porque são seres humanos; porém, e à diferença
de todo o resto dos seres humanos, eles não assumem a responsabilidade pelos
erros gerados por suas próprias decisões. Ao contrário: eles conseguem
transferir as consequências de seus erros para outras pessoas que não deveriam
ser obrigadas a arcar com este ônus.
Isso,
e nada mais do que isso, é a síntese da política estatal: uma maciça
socialização dos prejuízos imposta sobre o conjunto de cidadãos inocentes por
um grupo de pessoas irresponsáveis que se arrogam a autoridade de governar a
todos — inclusive governar aqueles que não votaram neles e que não aprovam
suas políticas.
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