quinta-feira, 25 dez 2014
No cerne da história de Natal jazem algumas lições importantes relativas à livre iniciativa, ao governo e ao papel da riqueza na sociedade.
Comecemos com uma das mais famosas frases: "Não há vagas
na hospedaria". Essa frase é frequentemente evocada como sendo uma
cruel e desapiedada rejeição aos exaustos viajantes José e Maria. Várias
versões da história suscitam imagens do casal indo de hospedaria em hospedaria,
suplicando por uma vaga, apenas para serem seguidamente dispensados pelos donos
que, aos berros, mandavam-nos irem embora, fechando estrondosamente a porta.
Mas a verdade é que as hospedarias estavam absolutamente
lotadas em toda a Terra Santa por causa de um decreto do imperador
romano. Esse decreto ordenava que toda a população fosse recenseada e cada
pessoa, tributada. Por outro lado, hospedarias são empresas privadas e,
sendo assim, os clientes são a sua única força vital. Portanto, não
haveria razão alguma para que o dono de alguma hospedaria rejeitasse aquele
homem de linhagem aristocrática e sua bela e grávida esposa.
De qualquer forma, o segundo capítulo de São Lucas não diz
que eles foram continuamente rejeitados por todas as hospedarias que
procuravam. Ao contrário, o capítulo relata a caridade peculiar de um
proprietário de uma hospedaria, talvez a primeira pessoa que encontraram, e que,
afinal, era um (pequeno) empresário. Sua hospedaria estava lotada, mas
ele lhes ofereceu o espaço que restava: o estábulo. Não há qualquer
menção sobre o proprietário da hospedaria ter cobrado qualquer coisa do casal, nem
mesmo uma moeda de cobre, embora ele certamente pudesse ter feito isso,
considerando-se seus direitos como proprietário do estabelecimento.
Assim, é extraordinário pensar que, quando o Verbo se faz
carne com o nascimento de Jesus, isso se deu por meio do trabalho intercessor de
um comerciante privado. Sem sua assistência, a história certamente teria
sido muito diferente. As pessoas frequentemente reclamam da
"comercialização" do Natal, porém resta claro que o comércio estava lá
desde o início, exercendo um papel louvável e essencial.
E, ainda assim, sequer sabemos o nome deste proprietário da
hospedaria. Nos mais de dois mil anos em que celebramos o Natal, estão
ausentes quaisquer homenagens a ele. Mas esse é o destino reservado aos
comerciantes ao longo da nossa história: utilizamo-los sempre, mas ignoramos
todos os seus serviços prestados à humanidade.
Claramente, se havia uma escassez de espaços para hospedagem,
isso certamente era um evento atípico, criado por algum tipo de distorção no
mercado. Afinal, se esse tipo de escassez fosse algo frequente em Belém,
empresários e empreendedores já a teriam notado, pois sabiam que poderiam
colher grandes lucros caso satisfizessem essa demanda não atendida.
Assim, eles se atropelariam para corrigir esse problema sistemático,
construindo mais hospedarias.
Mas foi por causa de um decreto governamental que Maria e
José, e muitos outros como eles, estavam viajando. Eles abandonaram suas
moradias e se puseram a viajar por puro temor dos recenseadores e dos coletores
de impostos. Mais ainda: apenas considere os custos dessa árdua viagem
"desde a Galiléia, saindo da cidade de Nazaré, até a Judéia, em direção à
cidade de David", pra não falar dos custos de oportunidade que José teve
de enfrentar ao ter de largar seus próprios negócios. Portanto, temos aí
outra lição: as leis coercivamente impostas pelo governo distorcem o mercado.
Seguindo adiante com a história, chegamos aos Três Reis,
também chamados de Magos. A maioria dos reis daquela época se comportava
como Herodes, o mandante local do Imperador Tibério. Herodes não apenas
ordenou que as pessoas saíssem de suas casas e pagassem a conta de suas viagens — para que elas pudessem ser tributadas —, como também era um mentiroso
contumaz: ele disse aos Três Reis Magos que queria saber o paradeiro do
menino Jesus para que ele pudesse "ir adorá-Lo". Na verdade,
Herodes queria era matá-Lo. Mais uma outra lição: nunca confie em um
político ou num sabujo de um político. Eles sempre mentem em benefício próprio.
Após terem encontrado a Sagrada Família, quais presentes os
Reis Magos trouxeram? Não foram sopa e sanduíches, mas "incenso,
mirra e ouro". Esses eram os itens mais raros e difíceis de serem obtidos
no mundo daquela época, e eles certamente estavam cotados a um preço de mercado
extremamente alto.
Mas longe de rejeitá-los como extravagantes, a Sagrada
Família aceitou-os como presentes dignos do divino Messias. Também não há
qualquer registro sugerindo que a Sagrada Família pagou algum imposto sobre
ganhos de capital, não obstante tais presentes tenham aumentado enormemente seu
patrimônio líquido. Portanto, mais uma lição: não há nada de imoral
em relação à riqueza; riqueza é para ser valorizada, gerida privadamente,
presenteada e comercializada.
Quando os Três Reis Magos e a Sagrada Família souberam dos
planos de Herodes para matar o recém-nascido Filho de Deus, eles se
entregaram? De forma alguma. Os Reis Magos, sábios que eram,
tapearam Herodes — descumprindo a promessa de contar a ele onde estava o menino
Jesus — e "regressaram por outro caminho à sua terra", arriscando
suas vidas voluntariamente (Herodes depois viria a conduzir uma busca furiosa
por eles). Quanto a Maria e José, um anjo aconselhou José a "pegar a
criança e sua mãe, e levá-los até o Egito". Ou seja, eles resistiram
e não se entregaram. Lição número quatro: os anjos estão do lado daqueles
que resistem à tirania do governo.
Nas narrativas do Evangelho, o papel da iniciativa privada,
bem como todos os malefícios do poder governamental, estava por todos os
lados. Jesus utilizava exemplos comerciais em suas parábolas (por
exemplo, os trabalhadores dos
vinhedos e a parábola dos
talentos) e deixava claro que Ele havia vindo
salvar até mesmo os pecadores mais ultrajantes, como os coletores de impostos.
E assim como Seu nascimento foi facilitado pelo proprietário
de uma "hospedaria", a mesma palavra grega — "kataluma" — é
empregada para descrever o local da Última Ceia, logo antes de Jesus ser
crucificado pelo governo. Assim, a livre iniciativa estava lá desde o
nascimento até a morte, presente em todos os momentos da vida de Jesus,
fornecendo refúgio, segurança e produtividade.
Assim como faz em nossas vidas.