Keynes
e o neomercantilismo
Sempre houve
quem classificasse John Maynard Keynes como um dos mais importantes liberais da
história moderna, talvez o mais recente entre os "grandes" na tradição de John
Locke, Adam Smith e Thomas Jefferson.[1]
Dentre estas
pessoas, quase todas são da opinião que, assim como esses homens, Keynes
acreditava sinceramente — aliás, exemplarmente — na livre sociedade. Se ele se distinguia dos liberais "clássicos"
em um ou dois pontos mais evidentes e importantes, era só por ter tentado
atualizar o essencial das ideias liberais
para adequá-las às condições econômicas de uma nova era.
Não há
dúvida de que, ao longo da vida, Keynes defendeu valores culturais mais
generosos, aos quais se costuma dar o nome de "liberais", como a tolerância e a
racionalidade, além de, é claro, sempre ter se
definido como liberal (era também apoiador do Partido Liberal Britânico).
Mas nada disso tem peso significativo na classificação de seu pensamento
político.[2]
Em um
primeiro momento, identificá-lo como modelo de liberal já é um paradoxo, quando
se sabe que ele adotou a doutrina mercantilista. À época em que A teoria geral do emprego, do juro e da moeda
foi publicada, em 1936, W. H. Hutt estava
prestes a mandar para o prelo seu Economists
and the public
(1936). Nos anos seguintes, ele submeteria o sistema de Keynes a uma análise
minuciosa e desmoralizadora (Hutt 1963,
1979), mas até aquele momento só havia conseguido inserir às pressas algumas
observações preliminares. Para ele, o mais estarrecedor era aquele economista
de renome "querer que nós acreditemos que os mercantilistas estavam certos e as
críticas feitas e eles pelos clássicos, erradas" (posição exposta no capítulo
23 da Teoria Geral) (Hutt 1936, p. 245).
Hutt
escrevia sob a ótica da ciência econômica. Aqui, estamos falando da totalidade
do liberalismo como filosofia social. Se o que caracteriza historicamente a doutrina
liberal é seu repúdio ao paternalismo do estado assistencialista, ainda mais
característica é sua rejeição ao componente mercantilista do absolutismo do
século XVIII. Então, como pode um escritor que tentou reabilitar o
mercantilismo ser incluído entre os grandes do liberalismo?[3]
Em defesa de
Keynes, Maurice Cranston argumenta que
ninguém negaria incluir John Locke entre os liberais, apesar de ele ter aderido
ao mercantilismo (1978, p. 111). Bem,
dizer que Locke defendeu o mercantilismo é questionável; Karen Vaughn (1980) já nos deu razões para acreditar
no contrário. Mas, ainda que houvesse defendido, o fato não validaria o
argumento de Cranston. Locke é
considerado com justiça um dos grandes do liberalismo não por causa de suas ideias
sobre teoria e política econômica, fossem quais fossem, mas por causa da
importância caracteristicamente libertária que reconhecia aos direitos naturais
e do que acreditava ser a consequência
desse reconhecimento.[4]
O sistema keynesiano
Conforme o
próprio Keynes e seus partidários, a necessidade de sua guinada para o neomercantilismo deveu-se à descoberta de
falhas fundamentais na teoria econômica clássica. A alegação é que ela não
conseguiu explicar nem as causas da persistência do alto índice de desemprego
na Grã-Bretanha, na década de 1920, nem as da Grande Depressão. Keynes, ao
contrário, explicou as duas coisas na Teoria geral — façanha que obteve ao
desmascarar os graves defeitos de uma economia de mercado não dirigida, o que
causou uma "revolução" no pensamento econômico.
Mas todas
essas crises específicas que causaram a reação de Keynes foram o produto de
políticas governamentais equivocadas. A persistência da alta taxa de desemprego
na Grã-Bretanha remonta, em parte, à decisão de Winston Churchill, que era
ministro da fazenda, de retornar ao padrão-ouro utilizando a irrealista
paridade vigente antes da guerra e, em parte, aos altos e dispendiosos (em
comparação aos salários) valores pagos pelo seguro-desemprego após 1920. A Grande Depressão foi
causada principalmente pela gestão monetária do governo — em particular, do
Federal Reserve, o Banco Central dos Estados Unidos. As duas crises podem ser explicadas pela
análise econômica "ortodoxa", não há necessidade de nenhuma "revolução" teórica
(Rothbard 1963; Johnson 1975, pp. 109–12;
Benjamin e Kochin 1979; Buchanan, Wagner
e Burton 1991).[5]
Como
observou Hutt, Keynes, em A Teoria Geral, deu as costas
a toda autoridade reconhecida, desde Hume
e Smith a Menger, Jevons e Marshall, passando por Wicksell
e Wicksteed. À parte o grau de adesão de cada um desses
pensadores ao laissez-faire, estes
pensadores ao menos reconheciam que, em uma economia de mercado, havia forças autocorretivas que faziam com que as eventuais
depressões econômicas fossem temporárias. Keynes, ao descartar a "ortodoxia" de seus
antecessores (e contemporâneos), alinhou-se com o que ele mesmo apelidou de
"corajoso exército de hereges": Silvio Gesell,
J. A. Hobson e outros social-reformistas
e críticos socialistas do capitalismo, descartados como lunáticos pelos
economistas mais em voga (Friedman 1997, p. 7).
Em um famoso
ensaio de 1934, Keynes já se colocava ao lado desses "hereges", escritores "que
rejeitam a ideia de que o sistema
econômico vigente consiga se autorregular
de forma relevante... O sistema não é autorregulável
e, a menos quando deliberadamente orientado, não é capaz de converter nossa
penúria real em fartura potencial" (1973a, pp. 487, 489, 491). A Teoria
Geral foi escrita com a intenção de providenciar uma estrutura
analítica que justificasse essa posição.
Conforme
Keynes, mudanças nos preços, salários e taxas de juros não cumprem a função que
a teoria econômica clássica lhes atribui — tendendo a gerar um equilíbrio com
pleno emprego. O nível dos salários não
exerce efeito significativo no volume de empregos; a taxa de juros não contribui
para equilibrar as poupanças e investimentos; a demanda agregada é, em geral,
insuficiente para produzir o pleno emprego; e assim por diante. As falsas
conjecturas, incoerências conceituais e non sequiturs que deturpam essas afirmações
exageradas foram desmascarados em várias ocasiões (por exemplo, Hazlitt 1959, [1960] 1995; Rothbard 1962, p. 2, passim; Reisman 1998, pp.
862–94).[6]
Cabe a James Buchanan resumir a questão:
"Não há evidência nenhuma que sugira que as economias de mercado sejam intrinsecamente
instáveis" (Buchanan, Wagner e Burton 1991, p. 109).
Seja como
for, nem todo sistema que preserve elementos comuns a uma ordem baseada na
propriedade privada pode ser considerado, com justiça, um sistema liberal. Como
é do conhecimento de todos, na história moderna houve um sistema que incluía a
propriedade privada e permitia que os mercados operassem de modo restrito e
limitado. Contudo, os responsáveis por seu controle insistiam no papel predominante
do estado, sem o qual — assim acreditavam — a vida econômica descambaria em anarquia. O surgimento
do liberalismo econômico foi uma reação contra
esse sistema, chamado mercantilismo.
Também de
extrema importância para o ponto em discussão é o modo como os equívocos de
Keynes abalaram a confiança em um arranjo de livre mercado, abrindo caminho
para o aumento descomunal do poder do estado.
Murray Rothbard
observa que Keynes postulava um mundo em que os consumidores seriam autômatos
ignorantes e os investidores seriam sistematicamente irracionais, guiados por
um cego "espírito animal", concluindo que a totalidade do volume de
investimentos deveria ser entregue aos cuidados de um deus ex machina, uma "classe
externa ao mercado … o aparato estatal" (Rothbard
1992, pp. 189–91). A esse processo, Keynes dá o nome de "socialização dos
investimentos". Como declara em A Teoria Geral,
"Tenho esperanças de ver o Estado, que está em posição de calcular a eficiência
marginal dos bens de capital a longo prazo e tomando por base a vantagem social
geral, assumir uma responsabilidade cada vez maior na organização direta dos
investimentos" (1973b, p. 164). Ele defendeu a criação de um Conselho Nacional
de Investimentos. Mesmo tardiamente, em 1943, ainda estimava que uma autoridade
assim exerceria influência direta sobre "dois terços ou três quartos do total
dos investimentos" (Seccareccia 1994, p.
377).[7]
Robert Skidelsky insiste que, nestes exemplos, Keynes
não tinha em mente o estado no sentido de um governo central (1988, pp. 17–18),
mas, sim, aqueles "órgãos semiautônomos
no seio do Estado" dos quais falou em 1924, "órgãos cujos critérios, no âmbito
de sua esfera de atuação, são unicamente os do bem público, segundo seu
entendimento, e de cujas deliberações estão excluídos proveitos privados"
(Keynes 1972, pp. 288–89). Contudo, Skidelsky parece ignorar os problemas dessa concepção
pretensiosa.
Keynes nunca
especificou como deveria ser a atuação desses órgãos, nem jamais apresentou
razão nenhuma para se acreditar que estariam em posição de calcular a
"eficiência marginal do capital" (seja como for, um conceito bastante confuso;
ver Hazlitt 1959, pp. 156–70; Anderson
[1949] 1995, pp. 200–205) e nunca esclareceu de que modo misterioso eles se
manteriam inacessíveis a motivações que obedecessem a um proveito particular
(inclusive pessoal e ideológico).[8]
Além disso, dado que Keynes garantiu que
esses "órgãos semiautônomos" estariam
"sujeitos até a última instância à soberania da democracia, expressa por meio
do Parlamento" (1972, pp. 288–89), como impedi-los de se tornarem, de fato, agências
do estado central?
Se o cerne
da doutrina liberal é que, havendo uma adesão institucional ao direito à vida,
à liberdade e à propriedade, é de se esperar que, de modo geral, a sociedade
civil seja capaz de gerir a si mesma; e se o exemplo emblemático do programa
liberal é a capacidade de uma economia de mercado livre de intervenção estatal
funcionar a contento, então a "Revolução Keynesiana"
assinalou o abandono do liberalismo.
Em pouco
tempo, o keynesianismo triunfou entre proeminentes economistas acadêmicos e do
governo, tornando-se, após a Segunda Guerra Mundial, a doutrina oficial dos
países avançados. Entre os
administradores do Plano Marshall e seus aliados na Comissão Econômica para a
Europa, da ONU, ele era obrigatório, assim como entre os administradores do Programa
de Recuperação Europeu. A Itália, por exemplo, "era constantemente instada por
essas duas agências a incorrer em uma reflação monetária" (de Cecco 1989, pp.
219–21).
Apesar da
resistência da Alemanha Oriental, então sob a liderança de Ludwig Erhard e os conselhos de economistas
como Wilhelm Röpke, os dois maiores
partidos políticos britânicos defenderam o ideal keynesiano de estimular a demanda como meio de se obter o pleno
emprego — à época, o principal objetivo. Nos Estados Unidos, o Employment
Act de 1946 reconheceu o papel fundamental do governo federal em
garantir uma política de emprego máximo, fazendo uso de operações fiscais. Os resultados dessa revolução foram desastrosos.
Antes de
Keynes, o objetivo dos governos era manter o orçamento equilibrado — ao menos,
nos países civilizados. O keynesianismo
reverteu essa "constituição fiscal". Ao atribuir aos governos a responsabilidade
pelas políticas fiscais "contracíclicas",
e ao ignorar a tendência dos políticos imediatistas de acumular déficits, ele
preparou o terreno para um aumento sem precedentes tanto na tributação, quanto na
dívida pública, nas décadas seguintes à Segunda Guerra Mundial (Buchanan 1987; Rowley 1987b; Buchanan, Wagner e Burton 1991).
É com alguma
frequência que se diz que Keynes "não era keynesiano",
no sentido de que não se pode responsabilizá-lo pelo uso que seus seguidores
fizeram de suas teorias. Mas em qual outro caso um "grande nome" do
liberalismo, um liberal "exemplar", viu um círculo de acólitos de enorme
influência atribuir a ele uma interpretação acentuadamente antiliberal? Michael Heilperin
observa com sarcasmo: "Se [Keynes] era liberal, então era do tipo singular,
daquele cujas recomendações práticas constantemente promoviam o coletivismo"
(1960, p. 125).
Regras ou "arbitrariedade"?
Em contraste
com as antigas ideologias absolutistas e, depois, com as coletivistas, a
característica do liberalismo é sua insistência em que haja regras tanto na
vida pública, quanto na econômica. O estado de direito como fundamento do Rechtsstaat
é um exemplo patente, bem como a doutrina do laissez-faire, que até John Stuart Mill, mesmo que apenas na
retórica, foi obrigado a apoiar como um princípio (facilmente revogável): "O laissez-faire, em resumo, deveria ser
uma prática generalizada". Adotar o máximo de flexibilidade e margem de ação no
exercício do poder não é uma característica que agrade aos liberais. "Um
governo de leis, não de homens" é uma conhecida máxima liberal.[9]
Murray Rothbard
observou que a oposição de Keynes aos princípios era, de certo modo, uma questão de princípios (1992, 177).[10]
Não é exagero dizer que sua aversão às leis, ou "dogmas" — como tinha por
hábito chamá-las —, era parte de sua natureza. Essa atitude prevaleceu em seu
pensamento ao longo de toda sua vida. Em 1923, ele declarou: "Quando estão para
ser tomadas grandes decisões, o Estado é um órgão soberano cuja finalidade é
promover o bem maior no todo. Portanto,
ao adentrarmos o reino da atuação do Estado, tudo deve ser considerado e
ponderado com base em seus méritos" (1971a, pp. 56–57).
Nos últimos
anos de vida, Keynes julgava "bastante sensata" a proposta para que o estado
"assumisse a vaga de empreendedor-chefe", "interferindo na propriedade ou na
gestão de determinados negócios … [somente] com base no mérito da causa, e não
a mando de um dogma" (1980, p. 324). Em carta a F.
A. Hayek, a propósito do livro O
Caminho da Servidão, então recém-publicado, Keynes repreendeu o
autor por não ter percebido que "decisões perigosas podem ser tomadas com
segurança em uma comunidade cujos pensamentos e sentimentos sejam justos, ao
passo que, se adotadas por quem tenha pensamentos ou sentimentos injustos,
seriam uma porta aberta para o inferno" (1980, pp. 387–88).
Essa
resistência a agir estritamente de acordo com princípios, alega Robert Skidelsky, é o cerne do "segundo renascimento
do liberalismo" de Keynes (após o anterior "Novo Liberalismo" da escola de Hobhouse): Keynes tinha por meta "sobrepor uma
filosofia de gestão … uma filosofia de intervenções ad hoc, com base em uma
consideração desinteressada" (1988, p. 15). Alec Cairncross afirma: "Ele detestava a servidão a regras. Defendia que
os governos exercessem uma arbitrariedade e que os economistas auxiliassem no
exercício dessa arbitrariedade" (1978, pp. 47–48). Mas é justamente a natureza ad hoc
dessa abordagem de Keynes, a convicção em uma estranha "consideração desinteressada",
e a predileção pela "arbitrariedade" governamental, desobrigada dos limites
impostos pelos princípios, que vai diretamente de encontro à própria doutrina
liberal.
Tradicionalmente,
o autêntico liberalismo sempre nutriu uma profunda descrença nos agentes do
estado, seja porque lhes falte competência ou imparcialidade, ou ambos. A infundada confiança que Keynes depositava
nos especialistas em economia, cujos sábios conselhos deveriam ser postos em
prática por políticos abnegados, é um insulto a essa suspeita totalmente
justificada, bem como a toda evidência histórica e teórica que lhe dá
sustentação. Em termos contemporâneos, contradiz os ensinamentos associados à
escola da escolha pública.[11]
A utopia de
Keynes
Muitas
vezes, Keynes entregava-se a reflexões sobre a natureza da sociedade futura. Por
causa do excesso de inconsistências em seus escritos[12],
tornou-se possível a alguns de seus adeptos argumentar que ele, na realidade,
queria apenas "vincular o pleno emprego ao liberalismo clássico", que "seu modelo
era essencialmente 'capitalismo mais pleno emprego', e que ele nutria certo
otimismo quanto à viabilidade do gerenciamento
da macroeconomia" (Corry 1978, pp.
25, 28).
Ao longo da
carreira de Keynes, no entanto, há indícios evidentes de seu anseio por uma
ordem social bem mais radical — em suas palavras, uma "Nova Jerusalém" (O'Donnell 1989, pp. 294, 378 n. 27). Ele confessou ter entretido mentalmente
"possibilidades de mudanças sociais mais vastas que aquelas abrangidas pelas
atuais filosofias", mais vastas até mesmo que a idealizada por pensadores como Sidney Webb. "A república de minha imaginação
localiza-se na extremidade esquerda do espaço celeste", meditava (1972, p.
309). Inúmeras de suas afirmações, feitas em diferentes décadas, lançam luz
sobre essa confissão um tanto obscura. Tomadas em conjunto, confirmam a
alegação de Joseph Salerno (1992) de que
Keynes era um milenarista — um pensador para quem a evolução social seguia uma
direção predeterminada, rumo àquilo que ele entendia ser um final feliz: uma
utopia (O'Donnell 1989, pp. 288–94).
Ele ansiava
por um estado de "igualdade de satisfação entre todos" (seja qual for o sentido
que se atribua a isso) (1980, p. 369), no qual o problema a ser enfrentado pelo
cidadão comum seja "como ocupar o ócio, o qual a ciência e os juros acumulados
lhe terão garantido, para viver sabiamente, agradavelmente e bem" (1972, p.
328). O progresso tecnológico, gerado pelos investimentos socializados, garantirá
automaticamente bens de consumo adequados a todos. A essa altura, surgirão os
assuntos mais importantes da vida: "A evolução natural deveria ser no sentido
de chegarmos a um nível de consumo conveniente a todos e, depois de
suficientemente alto, no sentido de aplicarmos nossas energias aos interesses
não econômicos da vida. Assim, é preciso reconstruirmos lentamente nosso
sistema social tendo em vista essa finalidade" (1982a, p. 393).
À parte a
questão de quem decidirá quando esse nível de consumo será suficientemente
alto, é de se perguntar: quais as técnicas que Keynes imaginava existir que
possibilitariam tamanha reestruturação da sociedade? Como sempre ocorria quando
meditava sobre o futuro, ele não fornecia detalhes.[13]
O que fica evidente é que, na utopia futura, o estado será o líder
incontestável.[14]
Dando um fim à "anarquia econômica", o novo "regime [será aquele] com o
propósito deliberado de exercer o controle e a direção das forças econômicas,
no interesse da justiça social e da estabilidade social" (1972, p. 305).[15]
O estado,
conforme Keynes, tomaria decisões até quanto ao nível ótimo de população. Com
relação à eugenia, às vezes ele parece indeciso: "é possível que chegue um
tempo, um pouco mais adiante, em que a comunidade como um todo tenha de prestar
atenção às qualidades inatas, assim como à mera quantidade dos futuros membros"
(1972, p. 292; ver também Salerno 1992,
pp. 13–14). Outras vezes, era definitivo: "A grande transição na história da
humanidade" terá início "quando o homem civilizado empenhar-se em tomar as
rédeas do controle consciente, livre do instinto cego da mera sobrevivência predominante"
(1983, p. 859).[16]
Desse modo, o estado — na forma do "homem civilizado" — também direcionará e
supervisionará a reprodução da raça humana.
Em todas
essas questões, o estado será conduzido por intelectuais dotados de sabedoria e
visão, dos quais o próprio Keynes era exemplo.[17]
E como poderia ser diferente? Quando se
deixa as pessoas livres para agir por conta própria, a grande maioria acaba desamparada,
por assim dizer. Como declarou Keynes, "Nem tampouco é verdade que o egoísmo seja em geral esclarecido; o mais frequente é os indivíduos que agem sozinhos na
promoção dos próprios fins demonstrarem tamanha ignorância ou inépcia a ponto
de nem disso serem capazes" (1972, p. 288). E, uma vez que ele reconhecia que, em
questões econômicas, "a solução acertada envolverá princípios intelectuais e
científicos que sem dúvida estarão acima dos conhecimentos da vasta massa de
eleitores, que são relativamente iletrados" (1972, p. 295), é o caso de se
perguntar o quanto da "soberania da democracia" continuaria a existir em sua
utopia.
Tendo em
vista seus gostos pessoais, era natural que as artes desempenhassem um papel
central em sua concepção. Ele lamentava a
mesquinhez dos subsídios estatais para as artes, frugalidade essa defendida pelos
"habitantes sub-humanos do Tesouro". Essa
política era incompatível com qualquer concepção mais elevada do "dever e
propósito, honra e glória [sic] do Estado". Os subsídios para as artes eram o
meio pelo qual o estado cumpriria com seu dever de elevar "o homem comum",
fazê-lo sentir-se "mais distinto, mais afortunado, mais admirável, mais
despreocupado" (citado em Moggridge 1974,
pp. 34–35).
Durante a
Segunda Guerra Mundial, Keynes exerceu o papel de principal porta-voz daquilo
que depois se tornaria o Arts Council.
"Morte a Hollywood" era sua máxima. Sentia-se imensamente gratificado por poder
relatar que três mil operários ingleses das Midlands,
região central da Inglaterra, haviam demonstrado "frenética empolgação" em reação
a uma apresentação de balé (citado em Moggridge
1974, pp. 41, 48). No futuro, à parte os subsídios estatais, a apreciação
artística seria inculcada nas escolas: assistir a peças e visitar galerias de
arte "será um elemento vivo na formação de todos, e a frequência regular a teatros e concertos, parte da educação
organizada" (1982b, p. 371).
A rematada
banalidade dessa cruzada pelo elevamento
estético, sob o patrocínio do estado — fundamental à realização da utopia de
Keynes —, só é superada por sua melancolia.
No próximo artigo, a relação íntima de Keynes
com os movimentos totalitários do século XX.
_____________________
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________________________
Notas
[1]
Ver a antologia editada por Bullock e Shock (1956). Inúmeros estudiosos, como
E. K. Bramsted e K. J. Melhuish (1978), consideram Keynes um dos principais
representantes no século XX (do que se presume que seja mais relevante) da
sequência que tem início com o grupo dos Levellers ou com Locke. Maurice
Cranston, biógrafo de Locke, atribui a Keynes, como a Locke, a classificação de
liberal (1978, 101). Bernard Corry chega ao ponto de dizer que Keynes era,
"basicamente, um liberal em economia, defendendo a adoção de medidas não
liberais específicas exclusivamente em períodos de desemprego" (1978, 26).
Douglas Den Uyl e Stuart Warner incluem Keynes em uma lista de liberais
"consumados", juntamente com Smith, Turgot, Constant e outros (1987, 263). John
Gray insiste na necessidade de ajustar a posição de Keynes à definição da
doutrina (1986, xi). É lógico que a definição de liberalismo de Gray omite toda
e qualquer menção à defesa da propriedade privada. Contudo, Anthony Arblaster
comenta que, mesmo Keynes sendo um "Liberal convicto", "no fim, foi a
democracia social que herdou o legado de suas ideias" (1984, 292).
[2]
Na lógica rigorosa de seu esquema terminológico, a conclusão de Karl Brunner é
que a "rejeição [de Keynes] à solução liberal" é facilmente identificada
porque, "para ele, é inaceitável a severa restrição imposta ao governo. Em seu
entender, a questão exigiria uma abordagem inteiramente nova" (1987, 28).
[3]
Nas palavras de Charles Rowley, Keynes postulava "a convicção em uma economia
de mercado fundamentalmente imperfeita e desprovida de forças autocorretivas,
continuamente necessitada da intervenção do governo para não degenerar em
caos…. Outra vez o neomercantilismo travava uma batalha contra a mão invisível,
semelhante à ocorrida na Inglaterra de antes de Adam Smith" (1987b, 154).
[4]
Apesar da declaração mencionada na nota 1, fica implícita a resignação de
Cranston à questão do liberalismo fundamental de Keynes: "Keynes de fato
integrava, juntamente com Francis Bacon, os philosophes do Iluminismo, os
utilitaristas e os fabianos, aquele grupo de intelectuais convictos de que os
intelectuais deveriam exercer o poder" (1978, 113). Vários escritores, adeptos
em maior ou menor grau do liberalismo clássico, também acreditavam que não se
poderia negar a Keynes a denominação de liberal; ver, por exemplo, Haberler
1946, 193.
[5]
Sobre as consequências desastrosas do erro da taxa de câmbio, Harry Johnson
afirma: "Tivesse o valor da libra em relação ao ouro sido fixado em números
realistas na década de 1920 — uma receita de pleno acordo com a teoria
econômica ortodoxa —, não haveria a necessidade do desemprego em massa, não
havendo desse modo a necessidade de uma nova teoria econômica que o explicasse,
nem tampouco haveria uma força responsável por desencadear boa parte da
história política e econômica subsequente da Grã-Bretanha…. O país pagou a
longo prazo um preço muito alto pela glória passageira da Revolução Keynesiana,
tanto em termos da corrupção dos critérios adotados em trabalhos científicos de
economia, quanto em termos do estímulo à indulgência da convicção, no processo
político, de que a política econômica pode transcender as leis da economia com
o socorro de economistas suficientemente competentes" (1975, 100, 122). No que
diz respeito aos benefícios concedidos aos desempregados, Daniel Benjamin e
Levis Kochin chamam a atenção para o fato de que Edwin Cannan foi um dos poucos
contemporâneos a entender o quanto esses auxílios contribuíam para gerar o
excesso de desemprego (1979, 468–72). Escritores keynesianos como Donald Winch
ainda condenam Cannan gratuitamente, acusando-o de ser desumano, despido de
compaixão (1989, 468 n. 40).
[6]
Alguns dos principais erros tinham raiz na metodologia de Keynes — por
exemplo, a conclusão de que, numa economia de mercado sem intervenção, seria
impossível uma coordenação intertemporal. Para Roger Garrison (1985), o fato de
Keynes operar em níveis cada vez mais altos de agregação escamoteava os
mecanismos que possibilitavam que essa coordenação fosse, de fato, levada a efeito
pelos processos de mercado, mesmo Hayek tendo demonstrado os verdadeiros
processos de coordenação. O próprio Hayek acreditava que o mais fundamental dos
equívocos de Keynes era de ordem metodológica: ao mesmo tempo em que ele
buscava a "pseudoprecisão" de magnitudes aparentemente mensuráveis,
negligenciava as verdadeiras interconexões do sistema econômico. Conforme
Hayek, a abordagem de Keynes era baseada na hipótese de haver relações
funcionais constantes entre demanda total, investimento, produção e assim por
diante. Assim, sua tendência era "escamotear quase tudo que realmente importa",
resultando na "eliminação de muitos insights
importantes a que já tínhamos chegado e que precisávamos recuperar com um
esforço tremendo" (1995, 246–47).
[7]
Mario Seccareccia (1993) contradiz o senso comum, que vê em Keynes um salvador
potencial ou real do capitalismo.
[8]
"Nenhum ensaio [de Keynes] jamais entra em detalhes, por pouco que seja, quanto
ao conteúdo da proposta [de socializar os investimentos]. Não sabemos de que
forma a socialização teria de ser implementada. As opções institucionais nunca
são ponderadas … [e não há meios de] calcular as consequências dessa
socialização" (Brunner 1987, 47).
[9]
Outra questão — teoricamente mais importante, talvez — é saber se um dia
seria possível as metas liberais serem compatíveis com a existência
ininterrupta de uma instituição baseada no poder do monopólio e na autoridade
de tributar — ou seja, o estado. Sobre essa questão, ver a obra pioneira de
Hans Hermann Hoppe (2001, em especial 229–34).
[10]
"A tendência de Keynes a mudar de ideia era notória, e não só entre os
economistas. De fato, a mutabilidade era parte inseparável de sua figura
pública" (Caldwell 1995, 41).
[11]
Rowley descreve Keynes como alguém "o mais distante possível da abordagem
adotada pela moderna escolha pública" e acusa-o de ignorar "a perigosa arbitrariedade
que suas teorias conferiram a políticos interessados apenas em votos" (1987a,
119, 123). Donald Winch, que defende Keynes da acusação de estatismo, parece
admitir que a lógica de seu pensamento aponta para uma direção estatista:
"Quando a interpretação tecnocrática da capacidade do estado, associada ao
próprio Keynes, mistura-se à política, será que a posição minimalista de Keynes
se sustenta? Será que os keynesianos de esquerda (e opositores monetaristas, no
que diz respeito ao assunto) têm razão em acreditar que a lógica do
keynesianismo induz ao aumento da intervenção, de tal sorte que, para garantir
o sucesso, mesmo aquilo que tem início como uma gestão macroeconômica precisa
ser ampliado para uma intervenção microeconômica?" (1989, 124).
[12]
Ver a avaliação peculiar que Thomas Balogh faz de Keynes: "Sua força e seu
charme ilimitado — além de irresistível — residem em sua capacidade de se
livrar de pontos de vista (e de pessoas) sem pestanejar" (1978, 67). Esse
retrato não parece distante da caracterização de Rothbard, para quem Keynes era
um "pirata" intelectual.
[13]
Aqui, a abordagem de Keynes é própria de quem critica a economia de mercado.
Como observa Roger Garrison: "Seu fracasso em explicar detalhadamente como
funcionaria esse sistema ideal é coerente com o pensamento socialista de modo
geral, sempre concentrado nas falhas observadas no sistema real em vez de no
funcionamento supostamente superior do sistema concebido" (1993, 478).
[14]
"No fundo, a receita de Keynes era que o estado agisse como guardião,
supervisor e promotor da sociedade civilizada…. Era um supervisor atuante, com
um programa eticamente orientado que tinha por meta uma transformação evolutiva
gradual, que incluísse mudanças nas regras do jogo" (O'Donnell 1989, 299–300).
[15]
Nesse mesmo ensaio célebre, "Am I a liberal?" ,
Keynes também afirmou, na confusão habitual de sua filosofia social, que
ele só estava se empenhando por "novas providências para salvaguardar o
capitalismo" (1972, 299).
[16]
Em outra ocasião, Keynes reiterou a necessidade de se enfrentar o problema da
superpopulação "com esquemas concebidos mentalmente, em vez das consequências
involuntárias do instinto e das vantagens individuais…. Muitas gerações
passaram desde quando os homens, na condição de indivíduos, começaram a adotar
a motivação moral e racional como norteador de suas ações, em substituição ao
instinto cego. Agora, têm de fazer a mesma coisa coletivamente" (1977, 453).
Mais ou menos à mesma época, Leon Trotski expressou semelhante ponto de vista
eugênico, sobre a "grande transição" para a utopia futura, embora imbuído de um
espírito mais "prometeico": "Mais uma vez a espécie humana, o estagnado Homo
sapiens, ingressará em estado de transformação radical, e, em suas próprias
mãos, será objeto dos mais intrincados métodos de seleção artificial e
treinamento psicofísico …. Depois de ter deixado de se arrastar de quatro
perante Deus, os reis e o capital, a raça humana não voltará a rebaixar-se às
nebulosas leis da hereditariedade e a uma seleção sexual às escuras!" ([1924] 1960, 254–55).
[17]
Ver o comentário de Corry: "Para o Círculo de Bloomsbury, políticos eram uma
inquietante mistura de idiotas, oportunistas e patifes; e o que sobra para
guiar o país? Uma espécie de establishment
intelectual, intimamente ligado à Academia (ou melhor, àquela pequena parcela
com raízes em Cambridge!) e apto a dar conselhos e exercer o controle de modo
desapaixonado e abalizado…. Keynes estava imbuído de uma convicção à Bloomsbury
no poder e dever da intelligentsia de
dar conselhos sobre os eventos e de controlá-los" (1993, 37–38).