segunda-feira, 4 fev 2013
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Guido Mantega cumprindo sua função: atender ao lobby dos exportadores, espoliando o poder de compra do resto da população brasileira
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Ao longo dos últimos 300 anos, o senso comum
reinante entre os economistas convencionais, a mídia e os leigos é o de que um
país estará em melhor situação se ele exportar mais bens e serviços do que ele
importa. A crença dominante é a de que,
se um país é um exportador líquido, então este país é uma verdadeira usina de
prosperidade.
É por isso que, segundo este raciocínio, a
China é considerada por esses economistas e seus seguidores na mídia uma
potência econômica. O país é competitivo
por causa de sua capacidade de exportar muitos bens para outros países. Porém, para fazer isso, há uma contrapartida:
a China inevitavelmente tem de aceitar notas
promissórias dos estrangeiros.
Quando um país exporta bens, o que ele recebe
em troca são meros dígitos eletrônicos contabilizados em moeda estrangeira —
atualmente, o dólar. Como o dólar não é
moeda corrente na esmagadora maioria das nações do globo, o que um país
exportador recebe, na realidade, é um título da dívida do governo
americano. Os dólares digitais que este
país recebe em decorrência de suas exportações são reinvestidos nos EUA, na
aquisição de títulos do governo americano.
No balancete do Banco Central, esta aquisição de títulos do governo é
contabilizada como "reservas internacionais".
O que realmente ocorre é o seguinte:
indivíduos que trabalham no ramo da exportação estão dispostos a aceitar notas
promissórias, ou outros tipos de ativos baseados em dígitos eletrônicos, em
troca de bens físicos. O exportador
recebe dinheiro eletrônico — no caso, dólares americanos — em sua conta
bancária. Para ele, estes dólares têm
valor. Se não tivesse, ele não teria
exportado os bens. Ele pode trocar estes
dólares por sua moeda doméstica (no caso, ele vende dólares ao seu banco, que
irá creditar sua conta-corrente com moeda nacional) ou ele pode manter estes
dólares no exterior, depositado em um banco estrangeiro. Talvez ele prefira comprar ações ou outros
ativos estrangeiros que são vendidos em dólares. A
questão é que esse exportador está disposto a aceitar notas promissórias — no
caso, promessas digitais — em troca de seus bens reais. Esta é o único princípio por trás da
exportação.
Os EUA são o exemplo clássico de um país que
importa muito mais bens do que exporta.
No entanto, os EUA também são considerados uma potência econômica. Por quê?
Porque estrangeiros estão sempre dispostos a investir no país. O problema é que o investimento favorito é a
compra de títulos emitidos pelo Tesouro americano. Embora alguns investidores estrangeiros comprem
estes títulos, quem os compra em sua esmagadora maioria são os bancos centrais
estrangeiros. Os bancos centrais
estrangeiros compram títulos do governo americano porque seus respectivos
governos querem manter suas moedas nacionais depreciadas em relação ao dólar,
de modo a aumentar as exportações para os EUA.
Em outras palavras, o governo chinês é a real fonte do poderio
exportador daquela nação, pois é ele quem manipula o mercado de câmbio para
favorecer suas indústrias exportadoras.
Utilizar o poder estatal para subsidiar uma
pequena porcentagem da população doméstica (os exportadores, cujo lobby é
poderoso em qualquer nação do mundo) ao mesmo tempo em que se prejudica a esmagadora
maioria da população (os consumidores, que não têm lobby em nenhuma nação do
mundo) é a norma atual em todas as grandes economias do globo. E a retórica utilizada também é a mesma:
beneficiar alguns poucos em detrimento de todo o resto é algo que se faz em
nome do fortalecimento da nação.
O argumento, como em todas as promessas
governamentais, é totalmente falacioso.
O que fortalece a população de um país é ter
uma moeda previsível. Isso faz com que
os prognósticos de investimento sejam mais fáceis. A preocupação das pessoas com relação às
flutuações do valor da moeda é reduzida.
Mas é impossível obter uma moeda previsível em termos internacionais,
pois os governos dos outros países estão continuamente manipulando suas moedas,
quase sempre por meio da expansão da oferta monetária. Em outras palavras, todos os bancos centrais
estrangeiros inflacionam. Sendo assim,
uma moeda doméstica cuja oferta seja constante irá se apreciar continuamente em
relação às moedas estrangeiras. Isso
significa que seu poder de compra irá aumentar continuamente. Não haverá taxas de câmbio estáveis entre os
países.
Se o Banco Central de um determinado país
estivesse operando sob um padrão-ouro genuíno, ele não poderia inflacionar
desmedidamente a moeda deste país. O
mesmo valeria para seu sistema bancário de reservas fracionárias. Qualquer banco que expandisse o crédito
enfrentaria uma corrida em seu estoque de moedas de ouro. Suas reservas de ouro iriam se exaurir
rapidamente. Portanto, o temor de uma
corrida bancária, na qual os correntistas apresentam seu dinheiro digital e
exigem restituição em moedas de ouro, restringiria a expansão da oferta
monetária. Isso significa que a moeda
deste país irá se apreciar em relação a todas as moedas estrangeiras que não
estão restringidas por tal ameaça. Isso
significa que os cidadãos que residem na nação sob o padrão-ouro poderiam
importar bens estrangeiros a preços decrescentes. A cada ano as importações estariam mais
baratas. Como consumidores, estes
cidadãos seriam beneficiadas e seu padrão de vida aumentaria a cada ano.
Supondo que estas pessoas estão produzindo
bens de valor, o que significa que elas estão adquirindo uma moeda denominada
em ouro, seu patrimônio líquido está aumentando continuamente. Por quê?
Porque, com a mesma quantidade de dinheiro, elas podem comprar
quantidades cada vez maiores de bens importados. Elas estão vivenciando aquilo que todos nós
adoramos vivenciar: preços cada vez menores para os bens e serviços que
desejamos comprar.
Dado que há uma quantidade muito maior de
pessoas voltadas para o mercado doméstico do que para as exportações, uma
política de moeda estável iria beneficiar aquelas pessoas que são mais
produtivas, mais economicamente eficientes e que melhor atendem às demandas da
população. Estas conseguiriam obter um
fluxo contínuo da moeda doméstica. Seu
custo de vida cairia ano após ano, de forma consistente, porque os bancos
centrais estrangeiros estão inflacionando suas respectivas moedas. O valor daquelas moedas em relação à moeda
estável deste país cairia continuamente.
Logo, uma moeda estável traria um grande
benefício para aqueles consumidores que vivem sob este padrão-ouro. E estes consumidores formam a esmagadora
maioria dos consumidores de um país.
Apenas uma relativamente pequena porcentagem dos empreendedores e
trabalhadores de uma nação está no setor exportador da economia. É por isso que a desvalorização da moeda
nacional é um subsídio apenas para uma minoria de empresários e trabalhadores. A vasta maioria dos residentes desta nação é
prejudicada. Ela é obrigada a pagar mais
caro por bens importados por causa da política de seu Banco Central de
inflacionar a oferta monetária a fim de manter a moeda nacional desvalorizada
perante as outras moedas.
Ao depreciarem sua própria moeda, os
planejadores monetários estão prejudicando os interesses da grande maioria dos
cidadãos desta nação. O subsídio
beneficia apenas uma minoria. O fato de
haver uma enorme quantidade de pessoas na maioria permite que sua riqueza seja
espoliada por meio da inflação da oferta monetária, permitindo ao setor
exportador ganhar receitas acima das de mercado ao exportar seus bens. Uma minoria não pode subsidiar uma
maioria. Sempre tem de ser ao contrário.
Portanto, uma economia com uma moeda estável
irá beneficiar a grande maioria de seus cidadãos, os quais poderão comprar a
preços continuamente mais baixos. Essa
verdade econômica irrita os defensores do mercantilismo. Eles dizem que tal política é maléfica. Eles estão convencidos de que ter um Banco
Central depreciando continuamente a moeda como forma de subsidiar o setor
exportador é algo extremamente benéfico para uma nação, e que a reduzida
quantidade de bens e serviços que estarão disponíveis para os consumidores
domésticos (tanto em decorrência das menores importações quanto pelo fato de
mais produtos domésticos estarem sendo exportados) é algo sem nenhuma
importância.
Os defensores do mercantilismo jamais
discutem a realidade econômica desta redistribuição de riqueza. Eles jamais apontam para aquela incontestável
realidade: que a esmagadora maioria dos cidadãos é obrigada a arcar com perdas
econômicas, principalmente quando se leva em conta os ganhos que obteriam caso
pudessem adquirir bens estrangeiros a preços cada vez menores.
A vasta maioria dos cidadãos de qualquer país
não faz a mais mínima ideia da relação entre expansão monetária e redução das
importações. Eles não entendem que estão
sendo prejudicados pela política de depreciação monetária feita pelo seu
governo. Se eles entendessem de
economia, iriam imediatamente exigir um padrão-ouro puro, e iriam prontamente
se beneficiar do crescente valor internacional de sua moeda nacional. Como iriam se beneficiar? Podendo comprar uma quantia cada vez maior de
bens estrangeiros a preços cada vez menores.
Infelizmente, são tão poucas as pessoas que
entendem de lógica econômica, que este subsídio coercivamente extraído de uma
maioria para uma minoria não é visto como um programa de transferência de
riqueza dos mais pobres (consumidores comuns) para os mais ricos (barões do
setor exportador). Sempre que o governo
de um país adota o mercantilismo — algo que ocorre a aproximadamente 100% do
tempo —, ele o faz sabendo que praticamente ninguém compreende que aquela
política prejudica a vasta maioria dos cidadãos e beneficia apenas uma minoria
que está no setor exportador da economia.
Mais ainda: ele o faz sabendo inclusive que contará com o resoluto apoio
da mídia e dos desinformados de plantão, que acreditam que um "setor exportador
subsidiado fortalece a economia do país".
O mundo está hoje adotando políticas de
depreciação monetária competitiva. Se um
país deprecia sua moeda, o outro quer depreciar mais. "Tudo pelos
exportadores!" Isso irá prejudicar severamente a vasta maioria dos cidadãos de
todas as nações. Eles não poderão
usufruir o benefício de ter uma moeda doméstica forte, algo que os permitiria
importar mais bens estrangeiros. Eles
seriam capazes de adquirir os bens e serviços que quisessem, a preços
continuamente declinantes, caso sua moeda nacional fosse baseada em um
padrão-ouro. Caso desfrutassem de plena
conversibilidade em ouro — isto é, caso pudessem ir a um banco para trocar
dinheiro digital por moedas de ouro —, eles vivenciariam um padrão de vida
crescente. Mas como eles não entendem de
economia, eles aceitam (e até aplaudem) as políticas mercantilistas de seu
governo. Eles aceitam que sua moeda seja
depreciada e seu padrão de vida seja reduzido.
Eles aceitam ser roubados em prol da boa vida dos exportadores. Eles gostam de ver seus bens sendo enviados
para estrangeiros a troco de nada (apenas os exportadores ficam com as notas
promissórias).
É lamentável que a maioria das pessoas não
entenda de economia. Para os
exportadores, no entanto, que se beneficiam deste assalto ao poder de compra da
população, essa ignorância econômica de seus compatriotas é uma dádiva. Dado que é impossível ganhar algo a troco de
nada, o que ocorre é que um pequeno grupo de exportadores ganha muito e, em
troca, o restante das massas fica com preços crescentes para quase todos os
bens e serviços da economia. E ainda
bate palma.
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