segunda-feira, 2 jan 2023
No dia 24 de abril de 1915, começou o primeiro genocídio do século XX: o governo
turco dizimou mais de um milhão de armênios desarmados.
A palavra-chave da frase é justamente esta
última: "desarmados".
Os turcos escaparam de
uma condenação mundial porque utilizaram a desculpa de tudo ter sido uma 'medida
de guerra'. Findada a Primeira Guerra
Mundial, eles não sofrerem nenhuma represália por este ato de genocídio. É como se o governo turco não houvesse
conduzido absolutamente nenhuma medida de homicídio em massa contra um povo
pacífico.
Outros governos
perceberam que o ardil funcionara e rapidamente tomaram nota do fato. Era um precedente internacional conveniente
demais para ser ignorado.
Setenta e nove anos após
o início daquele genocídio, o famoso Hotel Ruanda abriu as portas.
Os Hutus também se
safaram. Ironicamente, pelo menos uma
década antes do massacre em Ruanda — gostaria de me lembrar da data exata —, a
revista americana Harper's publicou
um artigo em que profetizava com acurácia este genocídio, e por uma razão muito
simples: os Hutus tinham metralhadoras; os Tutsis, não.
O artigo foi escrito em um formato de
parábola, sem se preocupar em fazer previsões especificamente políticas. Lembro-me vivamente de, ao ler aquele artigo,
ter imediatamente pensado: "Se eu fosse um Tutsi, emigraria o mais rápido
possível".
O fato é que, em todo o
século XX, não foi um bom negócio ser um civil.
As chances sempre estavam contra você.
Péssimas notícias para os civis
Tornou-se um lugar comum
dizer que o século XX, mais do que qualquer outro século na história conhecida
da humanidade, foi o século da desumanidade do homem para com o homem. Embora esta frase seja memorável, ela é um
tanto enganosa.
Para ser mais acurada, o
certo seria modificá-la para "o século da desumanidade dos governos para com
civis desarmados". No caso do genocídio,
no entanto, tal prática não pode ser facilmente descartada como sendo um dano
colateral imposto a um inimigo de guerra. Trata-se de extermínio deliberado.
O século XX começou
oficialmente do dia 1º de janeiro de 1901. Naquela época, uma grande guerra já estava em andamento; portanto, vamos
começar por ela. Mais especificamente, era a guerra iniciada pelos
EUA contra as Filipinas, cujos cidadãos haviam sido acometidos da ingênua
noção de que a libertação da Espanha não implicava uma nova colonização pelos EUA.
Os presidentes americanos William McKinley e
Theodore Roosevelt enviaram 126.000 tropas para as Filipinas para ensinar
àquele povo uma lição sobre a moderna geopolítica. Os EUA haviam comprado as Filipinas da
Espanha por US$20 milhões em dezembro de 1898. O fato de que os filipinos haviam declarado independência seis meses
antes dessa compra era irrelevante. Um
negócio é um negócio. Aqueles que
estavam sendo comprados não podiam dizer nada a respeito, muito menos protestar.
Naquela época, era uma
prática comum fazer a contagem de corpos dos combatentes inimigos. A estimativa oficial foi de 16.000
mortos. Algumas estimativas não-oficiais
falam em aproximadamente 20.000. Para os
civis, tanto naquela época quanto hoje, não há estimativas oficiais. O número mais baixo fala em 250.000 mortos. A estimativa mais alta é de um milhão.
E então veio a Primeira
Guerra Mundial e as comportas foram abertas — ou melhor, os banhos de sangue foram institucionalizados.
Turquia, 1915
O genocídio
armênio de 1915 foi precedido por uma limpeza étnica parcial, a qual durou
dois anos, 1895—97. Aproximadamente
200.000 armênios foram executados.
Os armênios eram
facilmente identificáveis. Alguns
séculos antes, os invasores turcos otomanos os haviam forçado a acrescentar o
"ian/yan" aos seus sobrenomes. Como os
armênios estavam dispersos por todo o império, eles não possuíam o mesmo tipo
de concentração geográfica que outros cristãos possuíam na Grécia e nos
Bálcãs. Eles nunca organizaram uma força
armada para oferecer resistência. E foi
isso o que os levou à destruição. Eles
não tinham como lutar e resistir.
Os armênios eram
invejados porque eram ricos e mais cultos do que a sociedade dominante. Eles eram os empreendedores do Império
Otomano. O mesmo ocorreu na Rússia. O mesmo ressentimento existia na Rússia,
embora não com a intensidade do ressentimento que existia na Turquia.
As estimativas não-turcas
falam em algo entre 800.000 e 1,5 milhão de armênios mortos. Embora a maioria destes homicídios tenha
ocorrido com o uso de baixa tecnologia, os métodos eram extremamente eficazes. O exército capturava centenas ou milhares de
civis, levava-os até áreas desertas e inóspitas, e os deixava lá até que
literalmente morressem de fome.
O nome Arnold Toynbee é
bem conhecido. Já na década de 1950 ele
era um dos mais eminentes historiadores do planeta. Seu estudo, compilado em 12 volumes
(1934—61), sobre 26 civilizações não possui precedentes em sua amplitude. Sua obra O Tratamento dos Armênios no
Império Otomano foi sua primeira grande publicação.
Por que algumas
organizações armênias não dão ampla divulgação e notoriedade a este documento é
algo que me escapa completamente. O
livro está em domínio público. A seção a
seguir, que está na Parte VI, "As Deportações de 1915: Procedimento", é
iluminadora. Leia-a com atenção. Trata-se do aspecto crucial de todo o
genocídio. O governo confiscou as armas
dos cidadãos.
Um
decreto foi expedido ordenando que todos os armênios fossem desarmados. Os armênios que serviam no exército foram
retirados das fileiras combatentes, reagrupados em batalhões especiais de
trabalho, e colocados para construir fortificações e estradas. O desarmamento da população civil ficou a
cargo das autoridades locais.
Um reino
de terror foi instaurado em todos os centros administrativos. As autoridades exigiram a produção de uma
quantidade estipulada de armas. Aqueles
que não conseguissem cumprir as metas eram torturados, frequentemente com
requintes satânicos; aqueles que, em vez de produzir, adquirissem armas para repassá-las
ao governo — comprando de seus vizinhos muçulmanos ou adquirindo por qualquer
outro meio —, eram aprisionados por conspiração contra o governo.
Poucos
desses eram jovens, pois a maioria dos jovens havia sido recrutada para servir
o estado. A maioria era de homens mais
velhos, homens de posse e líderes da comunidade armênia, e tornou-se claro que
a inquisição das armas estava sendo utilizada como um disfarce para privar a
comunidade de seus líderes naturais.
Medidas
similares haviam precedido os massacres de 1895—96, e um mau presságio se
espalhou por todo o povo armênio. "Em
uma certa noite de inverno", escreveu uma testemunha estrangeira desses
eventos, "o governo enviou soldados para invadir as casas de absolutamente
todos os armênios, agredindo as famílias e exigindo que todas as armas fossem
entregues. Essa ação foi como um dobre de
finados para vários corações".
Desarmamento
Lênin desarmou os russos. Stalin cometeu genocídio contra os kulaks
ucranianos durante a década de 1930. Pelos menos seis milhões de pessoas foram mortas.
Como mostrou a
organização Jews for the Preservation of
Firearms Ownership (Judeus pela Preservação da Posse de Armas de
Fogo), o modelo do Decreto do Controle de Armas de 1968 nos EUA — até mesmo as
palavras e o fraseado — foi copiado da legislação de 1938 de Hitler, a qual,
por sua vez, era uma revisão da lei de 1928 aprovada pela República de
Weimar. Uma boa introdução a esta
história politicamente incorreta da história do controle de armas pode ser vista aqui.
Quando as tropas de Mao Tsé-Tung
invadiam um vilarejo, elas capturavam os ricos. Em seguida, elas ofereciam a devolução das
vítimas em troca de dinheiro. As vítimas
eram libertadas quando o pagamento fosse efetuado. Mais tarde, o governo voltava a sequestrar
essas mesmas pessoas, só que desta vez exigindo armas como resgate. Ato contínuo, assim que as armas eram
entregues, as vítimas eram libertadas.
Essa mudança de postura — exigir armas em vez de dinheiro — fez com
que a negociação parecesse razoável para as famílias das próximas vítimas. Porém, tão logo o governo se apossou de todas
as armas de uma comunidade, os aprisionamentos e as execuções em massa
começaram.
A ideia de que o
indivíduo tem o direito à autodefesa era tão comum e difundida no século XVIII
que ela foi escrita na Constituição americana: a Segunda Emenda. Carroll Quigley, eminente historiador e
teórico da evolução das civilizações, era também um especialista na história do
uso de armas pela população. Ele
escreveu um livro de 1.000 páginas sobre o uso de armas como meio de defesa
durante a Idade Média. Em sua obra Tragedy
and Hope (1966), ele argumenta que a Revolução Americana foi bem sucedida
porque os americanos possuíam armas de poder de fogo comparável àquelas em
posse das tropas britânicas. Foi
exatamente por isso, disse ele, que houve toda uma série de revoltas contra
governos despóticos em todo o século XVIII.
Tão logo as armas em
posse do governo se tornaram superiores, os movimentos e manifestações em prol
da redução do tamanho do estado deixaram de ter o mesmo êxito que haviam tido
nos séculos anteriores.
Há uma razão por que os
governos são tão empenhados em desarmar seus cidadãos: eles querem manter seu
monopólio da violência a todo custo. A
ideia de haver cidadãos armados é apavorante para a maioria dos políticos. Afinal, para que serve um monopólio se ele
não pode ser exercido?Cidadãos armados
impõem um limite natural à tirania do estado.
Conclusão
Genocídios acontecem.
Mas não há genocídio
quando os alvos estão armados.
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