segunda-feira, 25 jun 2012
A
singularidade da economia
O que confere à economia sua posição
única e peculiar, tanto na órbita do conhecimento puro quanto na da aplicação
prática do saber, é o fato de que os seus teoremas não são passíveis de
comprovação ou de refutação com base em experiências. Certamente, uma medida
proposta por um raciocínio econômico correto produz os efeitos desejados, e uma
medida proposta por um raciocínio econômico equivocado não atinge os objetivos
pretendidos. Porém, ainda assim, esses
resultados são sempre uma experiência histórica, ou seja, experiência de
fenômenos complexos. Não servem para
provar ou refutar qualquer teorema econômico.
A
adoção de medidas econômicas erradas resulta em consequências não desejadas. Mas esses efeitos não possuem jamais aquele
poder de convencimento que nos é propiciado pelos "fatos
experimentais" no campo das ciências naturais. Só a razão, sem qualquer ajuda da comprovação
experimental, pode demonstrar a procedência ou a improcedência de um teorema
econômico.
A
consequência nefasta deste estado de coisas é impedir que as mentes menos
preparadas possam perceber a realidade dos fatos com que lida a economia. Para o homem comum, "real" é tudo
aquilo que ele não pode alterar e a cuja existência tem que ajustar suas ações,
se deseja atingir seus objetivos. A
constatação da realidade é uma experiência dura. Ensina os limites impostos à satisfação dos
desejos. É a contragosto que o homem reconhece
que existem coisas — todas aquelas que decorrem de relações causais entre
eventos — que não podem ser alterados com base em crenças que decorrem de seus
desejos e não de fatos. Não obstante, a
experiência sensorial fala uma linguagem facilmente compreensível. Não se pode argumentar contra uma experiência
feita corretamente. A realidade de fatos
estabelecidos experimentalmente não pode ser contestada.
Mas,
no campo do conhecimento praxeológico, nem o sucesso e nem o fracasso falam uma
linguagem clara que todos compreendam. A
experiência decorrente exclusivamente de fenômenos complexos não consegue
evitar interpretações em que os desejos substituem a realidade. A propensão, existente nos homens menos
preparados, de atribuir uma onipotência aos seus pensamentos, por mais confusos
e contraditórios que sejam, nunca é desmentida pela experiência de forma clara
e sem ambiguidade. O economista jamais
tem condições de refutar os impostores da mesma maneira que o médico pode
refutar os curandeiros e os charlatães. A
história só ensina àqueles que sabem como interpretá-la com base em teorias
corretas.
A
economia e a opinião pública
O
significado desta diferença epistemológica fundamental fica mais evidente se
nos dermos conta de que a utilização prática dos ensinamentos da ciência
econômica pressupõe que eles sejam aceitos e apoiados pela opinião pública. Na economia de mercado, a implantação de
inovações tecnológicas necessita apenas de que algum ou alguns indivíduos mais
esclarecidos percebam a sua utilidade. Os
pioneiros do progresso não podem ser detidos pela obtusidade e pela inépcia das
massas; não precisam obter de antemão o apoio das pessoas para os seus
projetos; realizam-nos, em que pese serem às vezes motivo de escárnio. Mais tarde, quando produtos novos, melhores e
mais baratos surgirem no mercado, esses zombadores correrão atrás deles. O homem, por mais limitado que seja, sabe
distinguir a diferença entre um sapato mais caro e um mais barato e apreciar a
utilidade de um novo produto.
Mas,
no campo da organização social e das políticas econômicas, as coisas se passam
de maneira diferente. Nesse terreno, as
melhores teorias são inúteis se não tiverem o apoio da opinião pública. Não podem funcionar se não tiverem o apoio da
maioria da população.
Qualquer
que seja o sistema de governo, não há possibilidade de se governar uma nação de
forma duradoura com base em doutrinas rejeitadas pela opinião pública. No final, prevalece sempre a filosofia que tem
o apoio da maioria. A longo prazo, um
governo impopular não pode subsistir. A
diferença entre democracia e despotismo não afeta o resultado final. Afeta apenas a maneira pela qual se processará
o ajuste entre o sistema de governo e a ideologia defendida pela opinião
pública. Os autocratas impopulares só podem
ser destronados por levantes revolucionários, enquanto que governantes
democráticos impopulares são pacificamente substituídos na eleição seguinte.
A
supremacia da opinião pública determina não apenas o caráter peculiar que a
economia ocupa no conjunto do pensamento e do conhecimento; determina o próprio
curso da história. As costumeiras
discussões quanto ao papel que o indivíduo representa na história são
superficiais. É sempre o indivíduo que
pensa, age e realiza. As novas ideias e as inovações decorrem sempre de homens
excepcionais. Mas esses grandes homens
não podem conseguir ajustar a ordem social segundo suas ideias, se não
conseguirem convencer a opinião pública.
O
florescimento da sociedade humana depende de dois fatores: da capacidade
intelectual de homens excepcionalmente dotados e da habilidade desses ou de
outros homens para tornar essas ideologias aceitáveis pela maioria.