segunda-feira, 5 dez 2011
Como se sabe, os principais
bancos centrais do mundo, a saber, o Fed, o BCE e os da Inglaterra, Suíça,
Japão e Canadá resolveram cingir suas cinturas com o manto de "salvadores das
economias do planeta" e decidiram intensificar (ainda mais!) o provimento de liquidez
e "amparo" ao sistema financeiro global. Decretaram também a redução dos custos de
carregamento das carteiras em dólares, para o que não titubearão em emitir
papéis pintados com o retrato de George Washington e outros pais da pátria,
"sempre que isto se tornar necessário" (eles têm a arrogância de julgarem que
sabem quando "isto" se tornará ser "necessário")...
Além disso, como mencionou Jeffrey
Tucker em seu excelente artigo A união dos bancos centrais
mundiais e a transição para o sonho keynesiano, decretaram que os
bancos deverão ter "acesso imediato ao dinheiro em qualquer moeda, de acordo
com as condições de mercado" (eles também julgam que sabem o que realmente
significa o processo de mercado)...
É um passo, sem dúvida, em
direção à criação de um banco central mundial e, segundo alguns, ao
estabelecimento de uma moeda global, pretensa solução advogada por Lord Keynes
nos últimos anos de sua vida. Keynes chegou inclusive a dar um nome a essa
excrescência: bancor. Sua idéia era retirar o poder inflacionário de
cada país e entregar esse poder, imensamente multiplicado, a um banco central
mundial, o que, segundo pensava, livraria o mundo dos problemas de "ausência de
coordenação" ("coordenação", para Keynes, significava manipulação de políticas
de "sintonia fina").
Na época, como observa Tucker no
mencionado artigo,"a ideia não vingou,
mas as instituições que supostamente deveriam administrar tal sistema foram de
fato criadas: o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial",
que acabaram se transformando progressivamente em algo como que Ongs
assistencialistas, assim como a ONU. Todos
esses organismos deveriam ser sumariamente extintos, porque se transformaram em
redutos de política e, em alguns casos, até, de corrupção.
O "sonho keynesiano" é na
realidade um pesadelo! Um banco central mundial é uma idéia que vai contra tudo
o que os economistas austríacos sempre defenderam em suas teorias dos mercados,
da moeda, do capital, dos juros e dos ciclos econômicos. Sob o manto do sonho
de Keynes, as recentes decisões dos bancos centrais na verdade representam,
claramente, um presente para os bancos do mundo inteiro, tal como as rodadas de
Quantitative Easing.
Que o sistema bancário anda há
anos beirando a bancarrota não é segredo nem para um mosquito que ronda uma
vaca sonolenta em um pasto qualquer, conforme mostrou Fernando Ulrich em artigo
muito esclarecedor, O dilema do sistema
bancário e as regras da Basileia, em que expõe claramente a fragilidade
do sistema de reservas fracionárias e o caráter de "clube de banqueiros" do
comitê da Basileia.
Sugiro fortemente a leitura
desses dois artigos. Mas minha
preocupação aqui é outra, certamente complementar às de Tucker e Ulrich: é
mostrar que esses passos no sentido da criação de um banco central e de uma
moeda mundial são um ataque, já não direi apenas aos ensinamentos austríacos,
mas ao bom senso e, embora muitos não o percebam, às liberdades individuais.
Comecemos pelo bom senso — ou pela
falta de bom senso. Um banco central
mundial, além de concentrar um grau de autoridade inadmissível, é uma afronta a
um dos mais elementares princípios que regem a eficiência, seja ela política,
econômica, administrativa e, mesmo, da vida de qualquer grupo: o princípio da
subsidiariedade, que acaba de ser mandado às favas pelos banqueiros centrais
dos países desenvolvidos. É uma ode ao planejamento central, agora globalizado,
com todas as consequências nefandas que esse tipo de organização acarreta para
as sociedades.
Quem comandará esse banco
super-poderoso? Economistas iluminados,
com seus modelos de equilíbrio geral que tratam pessoas como aquelas esferas
que deslizam em planos inclinados, que aprendemos nas primeiras aulas de Física?
Terão eles os conhecimentos suficientes
para saberem que quantidades "corretas" de moeda e de crédito devem circular
pela economia planetária ou estarão sujeitos às limitações e à dispersão do
conhecimento, que Hayek tão bem apontou? Saberão eles os bilhões de planos individuais
de todos os agentes econômicos da terra, da Patagônia ao Alasca, das Ilhas
Falkland ao leste da África, planos que acarretam ações, as quais por sua vez
implicam cursos de mais e mais ações ao longo do tempo real, subjetivo e sob
condições de incerteza? Para onde esses pretensiosos querem nos empurrar, Madonna mia? Para um totalitarismo monetário mundial? Tudo isso para salvar bancos insolventes, que
acreditaram nos contos da Carochinha? Como
dizem os gaúchos, bah!
Com relação à EAE, é evidente que
Bernanke e seus pares de outros países não sabem que os mercados são processos
que tendem para o equilíbrio, mas que jamais alcançam esse equilíbrio, não
conhecem a teoria da moeda de Mises, não desconfiam nem que existe uma teoria
do capital de Böhm-Bawerk e nunca leram nada sobre a TACE (Teoria Austríaca dos
Ciclos Econômicos)! Só estudaram keynesianismo,
monetarismo, expectativas racionais e econometria, enfim, só conhecem o
paradigma falido da mainstream economics. Se tivessem estudado os autores austríacos com
a atenção que estes sempre mereceram, saberiam que a própria idéia de um banco
central nacional é uma defesa descabida de um monopólio, que o valor da moeda
sempre cai em relação aos dos demais bens e serviços quando as máquinas
impressoras são colocadas para funcionar da maneira como está ocorrendo, que a
moeda "nova" não cai de helicóptero nas mãos de todos, mas é despejada em um
setor específico da estrutura de capital da economia e que expansões de crédito
não lastreadas em poupança genuína — como as que vêm fazendo irresponsavelmente
— acabam inexoravelmente levando à inflação e à sua consequência, o
desemprego.
Por fim, no que diz respeito à
violação das liberdades individuais, é evidente que a centralização da moeda e
do crédito nas mãos de uma autoridade mundial vai se constituir em um monopólio
muito mais forte do que os atuais monopólios nacionais. Meia dúzia de economistas
supostamente sábios vão interferir na ação humana de mais de seis bilhões de
indivíduos, vão dirigir, ou afetar indiretamente a função empresarial e vão
desviar recursos que os mercados alocariam de maneira diferente.
Sempre sustentei que o Euro foi um erro, mesmo
quando era moda afirmar o contrário. Com o seu advento, governos de países como
Grécia, Portugal e Itália, entre outros, que nunca tiveram moedas fortes,
passaram a acreditar que o passe de mágica do Euro os havia colocado em tal condição.
Voilà
— pensavam os políticos desses países — agora temos uma moeda que, no
fundo, é lastreada no antigo marco do Deutsche Bundesbank. Deram-nos a cornucópia inexaurível! Preocupar-se com a dívida soberana? Ora, isso seria coisa para as gerações
futuras...
Do lado fiscal, a coisa não está
menos desanimadora, haja vista a declaração da Sra. Angela Merkel de que,
agora, a Europa caminha para uma "unidade fiscal"... Como ela convencerá os taxpayers alemães a bancarem as orgias dos governos grego,
português e italiano?
Parece que os governos estão se
comportando como um grupo em um restaurante, em que todos já sabem que gastaram
mais do que poderão pagar ao garçom, mas que continuam comendo e bebendo...
É evidente que essas medidas
anunciadas não poderão dar bons resultados e nosso receio é que, com isso,
venham a ser tomadas mais e mais medidas, até que o mundo inteiro seja envolvido
pela nuvem negra da estagflação.
Talvez então alguns economistas
não austríacos percebam que o "sonho" de um banco central mundial do senhor
Keynes é um pesadelo. Como tudo o que ele escreveu, aliás. E que compreendam
que Friedman, mesmo defendendo o livre mercado, no fundo, acreditava em sua
própria frase: "we are all keynesians"...