Os economistas e analistas de
economia estão apresentando sintomas de que estão completamente perdidos. Um economista famoso aqui no Brasil chegou a
confessar, em entrevista na TV, que "não está entendendo o que
está se passando", já que, segundo ele, os governos vêm agindo de maneira
correta nos Estados Unidos e na Europa, injetando gastos, moeda e crédito nas
suas economias, mas elas não dão sinais de que estão saindo da crise...
Não tenho a menor dúvida de que
o paradigma que vem reinando na teoria econômica há muitos anos está sendo —
para usar a linguagem de Karl Popper — falsificado pelos fatos. Os governos vêm usando e abusando tanto do
arsenal keynesiano quanto da armaria monetarista em tentativas desesperadas
para vencer a crise, mas a frustração, no que se refere aos resultados dessas
políticas sobre a recuperação das economias, é patente e evidente. Os foguetes keynesianos e monetaristas vêm
sendo disparados em larga escala: os governos têm aumentado gastos, na tradição
keynesiana e os bancos centrais têm
jogado liquidez nas economias, exatamente como Milton Friedman e os monetaristas sempre recomendaram, tudo
isso regado a taxas de juros próximas de zero... Como deve ser do conhecimento
do leitor, Keynes diagnosticou como causa da Grande Depressão uma
"insuficiência de demanda agregada", o que o levou a recomendar que os governos
aumentassem os seus gastos e Friedman a relacionou com uma pretensa timidez do
Fed que, segundo ele, poderia ter evitado a Grande Depressão, caso aumentasse a
oferta monetária e de crédito.
O paradigma keynesiano-monetarista vem sendo usado tresloucadamente. Fala-se em ampliação do limite para a relação
dívida interna/PIB nos Estados Unidos; estimulam-se rodadas sucessivas de QE (quantitative easing), ativa-se impostos
sobre operações financeiras e o setor real da economia não reage conforme os
economistas dos governos acham que devia reagir, ou seja, como aprenderam nos
livros-texto e nos papers em que
estudaram.
Os gráficos seguintes mostram o
expansionismo fiscal e monetário nos Estados Unidos e na Europa. Vejam o crescimento
da base monetária americana.

Figura 1 - Base monetária ajustada
E, nos dois gráficos seguintes, o crescimento do M1
e do M2 nos Estados Unidos...

Figura 2 - M1

Figura 3 - M2
E vejam como tem crescido o
déficit do governo americano e a relação dívida interna/PIB...

Figura 4 - Déficit público

Figura 5 - Dívida pública
Apesar dessas políticas
expansionistas recomendadas pelos manuais de Macroeconomia, as taxas de
desemprego vêm aumentando desde a explosão da bolha imobiliária em 2008...

Figura 6 - Taxa de desemprego
Na Zona do Euro, as coisas não
têm sido diferentes, como mostram os gráficos seguintes, extraídos do site do ECB (banco central europeu).
Vejam o aprofundamento do déficit público e da relação dívida interna/PIB...

Figura 7 - Déficit público

Figura 8 - Relação dívida interna/PIB
E também a frouxidão monetária que vem ocorrendo na
Europa...

Figura 9 - M3
Apesar
disso, o desemprego continua resistindo ao velho paradigma...

Figura 10 - Taxa de desemprego
O que está acontecendo? Por que os economistas parecem
perdidos numa noite suja? Como é
possível que tudo o que aprenderam nos manuais macroeconômicos não esteja
funcionando? Para os economistas da
tradição austríaca, a resposta é simples,
direta e chocante para o establishment acadêmico
e profissional: o paradigma keynesiano-monetarista não funciona, porque seus
diagnósticos para os ciclos econômicos, simplesmente, estão errados. E, quando o diagnóstico é falso, a terapia
indicada não tem como funcionar. Na
verdade, estamos lidando com algo que transcende a economia: o que está
acontecendo é a falência múltipla da social-democracia, prevista por Mises,
Hayek e outros austríacos, quando
mostraram que os sistemas mistos entre o capitalismo e o socialismo apresentam
inconsistências internas fatais e que, portanto, são inviáveis no longo prazo.
E o longo prazo chegou.
Como disse Helio Beltrão em palestra na FGV de São Paulo: Você não acha que há algo de errado:
- na prescrição keynesiana
de o governo mandar cavar buracos e em seguida tapá-los caso a economia entre
em recessão?
- que todos os governos do mundo façam questão de ter o
monopólio da moeda, mas divirjam sobre outros monopólios (correios, estradas,
siderurgia)?
- que tenhamos bolhas , crises e depressões sem que haja uma
explicação satisfatória sobre as causas?
- que a queda de preços de produtos seja excelente para seu
bolso, mas considerada inaceitável para os economistas mainstream?
- que nos livros e na teoria os economistas defendam o livre
comércio, mas na prática sempre defendem um amplo leque de "exceções" e
"salvaguardas"?
- que o aumento de salário mínimo seja defendido como
benéfico para a "economia" ou para os assalariados de baixa renda?
- que "monopólios" privados sejam considerados nefastos e
inaceitáveis, mas que monopólios
governamentais sejam aceitos sem questionamento (da moeda, do tráfego
aéreo, da justiça, do espectro eletromagnético, do subsolo, das jazidas
minerais , dos rios, estradas e ruas, da segurança pública) ?
- que seja um crime em quase todos os países alguém espalhar
um rumor sobre um banco em dificuldades, mas não sobre empresas?
- que o ouro seja considerado uma "relíquia bárbara", mas
seja o ativo financeiro preferido em
momentos de crise?
- que o valor do dólar em 1900 (pouco antes da criação do
Fed) era o mesmo que em 1800, mas que o valor do dólar hoje é apenas 4% daquele
de 1900?
- que a roda tenha sido inventada mesmo sem a proteção da lei
de patentes?
- no comportamento dos economistas de
plantão, que se portam como "arquitetos" do mundo ideal"?
A essas pertinentes indagações podemos acrescentar algumas
outras: você também não acha que há algo de errado:
- com a macroeconomia, que considera o estoque de capital
como sendo uma "constante"?
- consequentemente, que as análises sejam conduzidas sem uma
teoria do capital que as sustente?
- que o acúmulo de déficits por parte dos governos estimula o
crescimento da relação dívida/PIB e que isso é imoral, porque significa que gerações passam
ônus para as gerações seguintes, sucessivamente?
- que estimular gastos e acreditar que a formação de poupança
gera "desemprego" é "bom" para a economia?
- quando o governo da Alemanha, por exemplo, cria um imposto
para ajudar o governo grego a pagar a farra orçamentária, punindo os pagadores
de tributos alemães?
- quando os bancos centrais salvam bancos para evitar que os
investidores percam com as bolhas?
O erro fatal dos economistas da mainstream é que eles, sejam adeptos de Keynes ou de Friedman,
tendem a acreditar demais no poder dos governos e na fraqueza dos mercados.
Não tenho a menor dúvida de que o novo paradigma é a Escola
Austríaca de Economia. A ABCT (Austrian Business Cycles Theory), ou, em
português, TACE (Teoria Austríaca dos
Ciclos Econômicos), foi desenhada por Mises em seu tratado de 1912,
posteriormente desenvolvida por Hayek nos anos 30 e depois aperfeiçoada por
outros economistas da tradição de Menger, dos quais o mais criativo é o
americano Roger Garrison.
Quando o governo injeta dinheiro na economia (via mesa de open
market do BC), a taxa de juros cai artificialmente abaixo da taxa natural de juros. Os empreendedores entendem que há mais
poupança do que realmente há e a demanda por investimentos de longo prazo será maior
do que deveria ("boom"). Os
investimentos em excesso, mais cedo ou mais tarde, fracassarão e a conseqüente
recessão e "desalavancagem" "purificará" e "liquidará" tais excessos.
A TACE é, ao mesmo tempo, uma teoria da moeda, do capital e
dos ciclos econômicos. Mostra como a emissão de moeda produz o efeito de
diminuir a taxa de juros e, inicialmente, enganar os agentes — que,
acreditando que existe maior poupança, embarcam em investimentos de maturação
mais longa, alargando, assim, a estrutura de capital da economia.
Posteriormente, quando esses agentes descobrem que na realidade não se tratava
de poupança, mas de moeda "fantasiada" de poupança, a taxa de juros sobe e isso
leva a um encolhimento da estrutura de produção, fenômeno que produz desemprego
(e que ficou conhecido como efeito concertina ou efeito sanfona),
que é maior nos setores mais afastados da produção de bens finais, que foram
exatamente aqueles setores inicialmente beneficiados pela expansão monetária.
Quando os bancos centrais percebem a tendência de alta das
taxas de juros e reagem fixando-as por decreto em níveis ainda mais
artificialmente baixos, a crise parece amenizar, mas logo retorna, mais forte e
mais rígida. Aumentar gastos públicos e emitir moeda para debelar uma crise
como a atual tem o mesmo efeito que receitar doses de açúcar para um paciente
diabético.
Assim, a inflação — ou seja, aquela quantidade adicional
de moeda que entrou na economia sem lastro — acabará provocando o desemprego
de fatores de produção. Como disse
Hayek, não há escolha entre comer demais (emitir moeda sem lastro real) e ter
indigestão (recessão), porque ambas são inseparáveis, a primeira acarretando a
segunda. Essa conclusão — de que o
desemprego é a consequência natural da inflação — mostra quão equivocadas são as
análises keynesianas que ficaram conhecidas como a curva de Phillips,
que postulavam a existência de um trade off ou dilema entre
inflação e desemprego, de modo que, se algum governo desejasse combater a
inflação, teria que aceitar uma taxa de desemprego de mão de obra maior ou, se
quisesse reduzir o desemprego, seria forçado a aceitar uma taxa de inflação
mais elevada.
E por que, até o momento, apesar do espantoso crescimento
da oferta monetária sem lastro, a inflação não explodiu? Uma boa parte da
explicação é que as empresas chinesas têm tido uma espantosa produtividade nos
últimos 15 anos, fazendo com que os preços de computadores, eletrônicos, e
outros produtos de exportação tivessem contínua queda de preços. Como
observa Beltrão no trabalho acima citado, "esse efeito deflacionário da China
mascarou a inflação de ativos criada pelo Fed". Além desse efeito-produtividade, não podemos
também deixar de considerar a forte deflação nos preços dos ativos financeiros,
provocada pelas sucessivas "bolhas".
Para Keynes, a Grande Depressão foi provocada por poupança
demais e investimento de menos; para nós, austríacos, é exatamente o oposto:
poupança de menos e investimento demais, ou seja, não lastreado em poupança
genuína, mas na emissão de papéis com o rosto de George Washington ou de
qualquer outro herói nacional (no Brasil, de tanto o governo emitir e trocar de
moeda, nossos heróis se extinguiram e hoje vemos onças, macacos e outros
bichos). Qualquer dia desses, nosso
Bacen imprimirá cédulas com estampas de pulgas, baratas, mosquitos e aranhas...
Investimentos não lastreados em poupança não têm sustentação.
Imagine que Robinson Crusoé pesque três
peixes diariamente, mergulhando e pegando-os com as mãos e que, no final da
tarde, os asse e coma. Imagine agora
que, pensando em aumentar a sua produtividade, ele passe três dias seguidos
comendo dois (ao invés de três) peixes. Com
isso, no quarto dia ele já acordará com três peixes e terá, portanto, o dia
inteiro para construir uma rede de pesca, que lhe permitirá pegar muito mais
peixes por dia, trabalhando menos tempo. Em suma, ao renunciar a um peixe por dia, ele poupou, o que lhe permitiu investir e, assim, melhorar o seu
padrão de vida.
Essa é a essência da poupança: para ter mais peixes no
futuro, você necessariamente tem que renunciar a comer peixes no presente. Aliás, essa é a essência da própria teoria do
capital e do próprio crescimento econômico, que Keynes subverteu, com seu tão
famoso quanto falacioso conceito de "paradoxo da poupança". Não existe paradoxo
algum, o que há são governos que gastam demais e emitem moeda de maneira
irresponsável.
A Escola Austríaca é a mais antiga na história do
pensamento econômico, pois remonta a São Tomás de Aquino e aos escolásticos
tardios; é a menor, porque o ambiente intervencionista sempre a tratou como se
fosse apenas uma "coisa do passado", sem aplicação ao mundo real; mas é,
seguramente, a que mais vem crescendo nesses tempos de crise mundial, porque é
a única que conseguiu prever corretamente a crise (embora a fama tenha
ficado para o economista Nouriel Roubini, que simplesmente, a advinhou e que
atualmente está tão perdido quanto seus colegas de establishment), a única que afirmou que as medidas adotadas pelos
governos nos Estados Unidos, na Europa e no Japão a partir de setembro de 2008
apenas agravariam a crise e, por fim, a única que tem a solução para o
problema: a economia de livre-mercado, baseada na propriedade privada e na
liberdade individual e de trocas, a extinção dos bancos centrais e sua
substituição por um sistema de moedas competitivas (free banking), com lastro em ouro.
No novo paradigma, expressões como "política fiscal",
"política monetária", "política cambial", "política tributária", "políticas de
rendas", "políticas de preços" e outras semelhantes desaparecerão
completamente. Os indivíduos — e não os governos — é que comandarão suas
próprias vidas.
A social-democracia está falida. E enquanto não entenderem
isto e insistirem nelas, com pajelanças fiscais e monetárias, seu passivo só
irá aumentar.
Nós, os austríacos,
chegamos para ficar!