Foi
um dia agitado no mercado financeiro essa terça-feira, 20 de outubro.
Nos
EUA, a S&P 500 e a NASDAQ caíram 0,6%.
O dólar, após dias seguidos de queda, apresentou uma ligeira
valorização. Com isso, vem se
consolidando uma tendência, a única que é repetida com regularidade: quando o
dólar sobe, as bolsas caem (americanas inclusive), e vice versa.
O
setor imobiliário continua deprimido - ao contrário do que os entusiastas da
mídia vinham dizendo. O relatório de
setembro sobre a construção de novos imóveis trouxe números abaixo do esperado,
e os números de agosto também foram revisados para baixo. Ademais, as autorizações para novas
construções, um indicador da saúde do setor imobiliário, caíram pela segunda
vez nos últimos três meses.
Ou
seja: apesar de todos os esforços contrários do governo americano, os preços
dos imóveis seguem em queda - como tem de ser.
Com
isso, os ativos dos bancos - que têm papeis do setor imobiliário em suas
carteiras - seguem se desvalorizando, o que inevitavelmente forçará um ajuste
futuro. Exatamente para evitar isso, o
mais provável é que o governo americano continue dando subsídios ao setor
imobiliário (na forma de créditos tributários para aqueles que estão comprando
imóveis pela primeira vez) - o que ajudará a ofuscar a realidade desse mercado
também em 2010.
Outra
notícia interessante veio da Austrália: o presidente do Banco Central
australiano, Glenn Stevens, disse ser "imprudente" manter as taxas de juros
daquele país em seu atual nível de 3,25%, o mais baixo dos últimos 50
anos. Sua intenção é encarecer o custo
dos empréstimos a fim de se evitar um aumento da inflação. O atual nível dos juros australianos está
pondo em risco a meta de inflação daquele país, que é de 2 a 3%. O núcleo da inflação anual australiana está
em 4,2%.
A
palavra "imprudente" surpreendeu os investidores, que agora dão como certo que
o BC australiano seguirá aumentando os juros.
Isso significaria que aquele BC não está ligando para a apreciação de
sua moeda, que está no nível mais alto dos últimos 14 meses.
Vale
lembrar que o Banco Central da Austrália foi o primeiro e único banco central
do G-20 a aumentar (em 0,25%) a taxa básica de juros desde o início da crise.
Brasil
Assunto
esse que nos traz ao Brasil.
O governo decidiu impor uma tarifa de 2% (IOF) sobre o influxo de capital
estrangeiro destinado à compra de ações e títulos públicos. A justificativa oficial é que se quer evitar
a formação de uma bolha na bolsa.
Previsivelmente, houve muita inquietação com essa decisão repentina e a
Bovespa caiu 2,9% e o dólar subiu 1,86%, cotado a R$ 1,745.
Algumas considerações:
1) Sim, se houver uma enxurrada
de dólares, é bem possível que haja uma "bolha do Real" - o real poderia se
valorizar muito e, no evento de uma fuga de dólares, se desvalorizar
repentinamente. Tal instabilidade deixa
tanto os exportadores quanto os importadores à deriva, sendo obrigados a
adivinhar seu futuro.
2) Desnecessário dizer que tal
instabilidade monetária é totalmente oposta ao que ocorreria num livre mercado,
no qual uma commodity que não pode ser criada do nada (como o ouro) seria
utilizada como meio de troca, fornecendo assim uma unidade de conta estável.
3) Esse atual arranjo, em que
cada banco central imprime seu dinheiro e daí eles ficam flutuando entre si no
mercado financeiro internacional, é inerentemente instável e
incontrolável. Paliativos como taxação e
controle de capitais não trazem efeitos de longo prazo, pois acabam no final
entrando nos cálculos dos agentes financeiros - ademais, no atual arranjo
global, não se pode impor barreiras eternas ao capital estrangeiro.
4) Assim, é duvidoso que essa
medida esteja visando conter o fluxo de dólares. Sua intenção parece ser muito mais a de
aumentar a arrecadação (em queda) do que a de conter a valorização do real,
algo impossível no longo prazo.
5) Caso o Banco Central do Brasil
não estivesse imprimindo reais para comprar dólares, ele não precisaria se
preocupar com inflação e nem com uma bolha na bolsa. Dados do BACEN mostram que as torneiras estão
abertas. A base monetária, que vinha
apresentando um aumento bem contido até agosto, disparou em setembro e agora na
primeira quinzena de outubro, aumentando em mais de R$ 9 bilhões. O mesmo ocorreu com o M1. A intenção clara é proteger os exportadores,
como já explicado aqui.
6) É fácil entender por que não
haveria uma bolha na bolsa caso o governo não imprimisse reais para comprar
dólares. Considere o seguinte e muito
simples exemplo a seguir:
Imagine, apenas para facilitar as contas, que houvesse no Brasil apenas 100
reais e 50 dólares em circulação. Nesse
exemplo simples, a cotação de 1 dólar seria de 2 reais. Agora suponha que houve uma entrada de mais
50 dólares na economia. Se o BACEN não
fizer absolutamente nada, teremos 100 reais e 100 dólares na economia, o que
fará com que a cotação do dólar pule para 1 real, certo?
Mas como você só pode comprar ações em reais, então não teria como haver uma
bolha de ações. Afinal, o meio de compra
- as cédulas de real - não aumentou. Se
não houve aumento da quantidade de moeda, então não tem como haver bolha.
Porém, se o BACEN decide intervir imprimindo reais para comprar dólares, o
arranjo muda. A economia passa a ter,
digamos, 200 reais e 50 dólares (os outros 50 dólares que entraram foram para
as reservas do BACEN). Nesse caso, como
houve um aumento da quantidade de reais em circulação, é bem provável que esse
novo dinheiro recém-criado seja aplicado na bolsa, o que de fato gerará uma
bolha.
E é exatamente isso que está acontecendo atualmente em todo o mundo. As bolsas estão subindo como consequência dos
pacotes de estímulo financeiro adotados pelos governos ao redor do mundo. Esse dinheiro que foi impresso está sendo
aplicado nos mercados financeiros ao redor do mundo. Quando uma moeda estrangeira chega num país
qualquer, o banco central desse país imprime dinheiro para comprá-la (essa
impressão monetária conjunta explica os baixos juros mundiais). A bolha financeira está sendo reinflada.
Jim Rogers e Peter Schiff preveem que essa atual fase altista dos mercados
financeiros pode durar um ou dois anos no máximo. Quando os BCs mundiais - principalmente o Fed
- começarem a apertar os juros, haverá um novo colapso, ainda mais forte que o
atual.
Conclusão
A intenção principal do governo brasileiro com essa tarifa de 2% sobre o
capital estrangeiro destinado à compra de ações e títulos públicos parece ser a
de aumentar a arrecadação. Como efeito
colateral, dá-se uma mãozinha aos exportadores.
Mas se levarmos em conta o que está sendo feito com a base monetária e
com o M1, a bolha na bolsa continuará em formação.
Logo, o BACEN está numa encruzilhada: se os dólares chegam e ele não os
compra, o real se valoriza e os exportadores perdem. Se ele imprime reais para comprar dólares,
haverá problemas com a inflação e com uma provável bolha financeira (vale
lembrar que a Bovespa já subiu mais de 100% desde outubro de 2008). Se ele vende títulos para adquirir reais e
com isso comprar dólares, não há perigo de inflação e nem de bolha financeira,
mas há aumento da dívida e dos juros (algo nada bom em período eleitoral).