A sanha burocratista não tem fim: agora, a lei 12.291/2010,
sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e publicada nesta
quarta-feira, 21 de julho, no Diário Oficial da União, obriga todo e qualquer
estabelecimento comercial a guardar uma cópia do Código de Defesa do
Consumidor.
Seria de se perguntar se antes não
seria obrigatório toda e qualquer pessoa andar com um exemplar da Constituição
dentro de casa, no carro ou até mesmo debaixo do braço. Como alguém que vez ou outra a consulta,
desisti de comprar novos exemplares atualizados, depois de colecionar uma
pilha, cada qual substituído por conta de uma nova emenda. Hoje, o que faço
simplesmente é acessar na internet.
Internet? Pôxa, qualquer pessoa pode ter acesso, não é
mesmo? Eu costumo acessar justamente no
site do Sr Presidente, e a vantagem é que lá as leis já estão permanentemente
atualizadas e linkadas com outras que tratam de matéria correlata. Os sites da Câmara e do Senado também possuem
um sistema de consulta à Constituição e à legislação. Imagino que os parlamentares e Sr Lula nunca
devam ter visitado seus próprios sites, ou senão teriam pensado melhor antes de
terem editado tão ridícula norma.
Com mais esta burocracia, fragiliza-se ainda mais uma vez a
figura do empresário. Além de
estabelecer uma multa de até R$ 1.064,10, impagável para a maioria das pequenas
lojas, a lei funciona como aquela criminalização prévia que fica lá, latente,
esperando para ser somada a outra qualquer, para funcionar como agravante.
A dita norma só não se tornou mais truculenta porque um
sábio assessor jurídico do Ministério da Justiça houve por aconselhar o Sr Lula
a vetar outros dois dispositivos, que previam a "suspensão
temporária" e a "cassação do estabelecimento", e pior, sem a
previsão no texto de que deveriam ser aplicados sequencialmente, de modo que a
autoridade administrativa poderia, ao seu talante, decidir por um deles logo à
primeira vez!
Em um dos artigos que escrevi recentemente, apontei a
atitude de um procurador militar que houve por denunciar a cobrança de
consumação em barracas de praia no balneário de Salinópolis -PA, mas, de forma
cínica, covarde e venenosa, conjuntamente com o fato de as ditas barracas
estarem lá instaladas ocupando terreno da União de forma irregular.
Diga-me, leitor, o que você acha que estava fazendo um
procurador militar nas badaladas praias de Salinópolis justo em plena alta
estação? Caçando recrutas gazeteando a
escala de guarda? O que pretendo dizer
com isto? Ora, que avento a
possibilidade de que o dito sujeito deva ter ingressado em uma destas barracas
como um cidadão qualquer, para degustar uma cervejinha gelada, e ter saído de
lá indignado com o aviso de cobrança da consumação, disposto a fazer valer a
força do seu cargo e assim satisfazer seu ego pessoal.
Em resumo: entrou indivíduo e saiu procurador.
Se o caso fosse a ocupação irregular do terreno, ele nem
sequer teria tido conhecimento da cobrança da consumação, até por ser
irrelevante; simplesmente trataria de providenciar a expulsão daqueles
negociantes, segundo a forma da lei. No
entanto, tal medida soa impopular, e mesmo procuradores, que não são de ferro,
apreciam uma loira gelada com sombra, banheiro e ducha de água doce, certo? Desta forma, a "irregularidade" se
converte em "concessão precária", pronta a ser revogada como caráter
agravante para qualquer outra acusação futura.
É o que virá a acontecer com a lei 12.291/2010. A partir do início de sua vigência, qualquer
comerciante será tratado como contumaz praticante de má-fé pela simples
ausência do documento, se solicitado por um cliente dono de uma queixa qualquer
ou por algum tipo de fiscal. Aliás, a
probabilidade de o dado fiscal exigir a sua "multa pessoal", vai
aumentar ou não?
Saliento, não bastasse tanto absurdo, que a lei não exige
que a cópia do CDC seja "atualizada". Isto vai dar confusão. Ter uma cópia desatualizada importará na
mencionada multa? Ademais, hoje em dia,
poucas são as pessoas capazes de interpretar corretamente a letra da lei, que
necessita ser harmonizada com a Constituição e com outros dispositivos
normativos, e não raro, a jurisprudência aponta decisões completamente diversas
do que dizem os textos legais.
As casas de comércio, antes lugar de interação social onde
as pessoas se ajudavam mutuamente trocando títulos de propriedade, estão sendo
transformadas em uma arena de desconfiança, delação, chantagem e outros
lamentáveis ardis, graças ao positivismo levado aos seus cimos.