segunda-feira, 7 dez 2009
Ah,
os verdes. Houve um tempo em que eles
eram apenas adoradores de árvores.
Depois eles passaram a nos intimidar com mais veemência, nos obrigando a
reciclar, a comer soja, a não acender a luz, a dirigir menos, a andar de ônibus e a fazer
milhares de outras "ações locais". Agora
eles estão mascateando mais uma modernidade, dessa vez na tela grande: o filme "No Impact Man" - sobre um homem
que obriga sua mulher consumista e suas duas filhas a viverem primitivamente
durante um ano - promete ser o seu guia em uma viagem expiatória até a terra
ecologicamente prometida.
Apesar
da enorme popularidade de sua causa, não creio que eles estejam satisfeitos. Eles querem nos controlar e dominar por
completo. Se não ficarmos espertos,
essas pessoas impulsivamente determinadas a salvar o planeta irão acabar
controlando os mínimos detalhes das nossas vidas diárias.
A
própria ideia de sustentabilidade soa bastante benigna - ela meramente sugere
que as pessoas devem pensar no futuro e ser prudentes e frugais no uso de
recursos econômicos. Nada contra essa
ideia básica - superficialmente, parece ser uma sabedoria elementar, algo em comum
acordo com valores similarmente afáveis e benevolentes, como responsabilidade e
generosidade.
Porém,
bem internamente, há algo perturbador e inquietante no que concerne a premissa
básica da sustentabilidade. Os
defensores da sustentabilidade - vamos chamá-los de "sustentabilistas" - são
condenatórios em seu fervor, segurança e retórica. Sua ideologia está impregnada daquela
afetação de superioridade que diz que as coisas são insustentáveis do jeito que
estão atualmente. Há neles um senso de
alarmismo que, em sua essência, alega que "há uma crise e a culpa é toda sua
por ser ignorante, irracional e ganancioso.
Você deve seguir nossas ordens para que possamos corrigir isso, ou todos
nós iremos morrer."
Essa
cruzada alarmista, que é a base do movimento sustentabilista, deveria irritar
as pessoas que possuem algum conhecimento econômico sobre o mundo. Um princípio básico da economia é que os
mercados são sistemáticos, ordeiros e autocorretores; os preços indicam a
escassez dos recursos e guiam as pessoas a utilizá-los de maneira econômica. Os preços mudam de acordo com as alterações
que ocorrem nas condições de oferta e demanda, induzindo ajustes apropriados
nos padrões de produção e consumo. O
sistema de preços direciona a busca pelo lucro - um aspecto natural da condição
humana - para atividades produtivas e inovadores. Em resumo, o sistema de preços funciona.
Os
sustentabilistas ou são ignorantes ou se recusam a aceitar essa lição
básica. Em ambos os casos, nós
economistas temos muito trabalho a ser feito.
O lamento
dos sustentabilistas
A
essência do problema, como os sustentabilistas o veem, é que as pessoas estão
utilizando recursos irresponsavelmente - exaurindo-os muito rápido,
utilizando-os em excesso, ou utilizando-os de uma maneira que terá
desdobramentos negativos no longo prazo.
Ou seja, os sustentabilistas desaprovam as ações de quaisquer outras
pessoas - e estão tomando medidas para corrigir esses seus irmãos impertinentes e
perversos.
E
como esses outros devastadores, seja por ignorância, preguiça ou teimosia, não
irão se aprumar e adotar voluntariamente práticas sustentáveis, os
sustentabilistas veem a necessidade da implementação de medidas - campanhas
organizadas, viagens ecológicas que trazem sentimento de culpa, e, sim, até
mesmo a criação de leis - para corrigir essa exploração de recursos. Precisamos mudar nosso padrão de ação, dizem eles;
precisamos de uma força motivacional que esteja além do mero "autointeresse
econômico" (por exemplo, a busca por lucros).
A sustentabilidade, portanto, tornou-se uma cruzada inflexível para
"salvar o planeta" - e se você não é parte da solução, então certamente é parte
do problema.
Vamos
interpretar isso pela lente da economia.
Os argumentos sustentabilistas caem em uma das duas amplas categorias a
seguir: (1) o argumento dos recursos não renováveis: a oferta de certos
recursos importantes está encolhendo.
Quando as pessoas se derem conta disso, será "tarde demais" - a escassez
de recursos irá deformar as economias capitalistas até seu ponto de ruptura;
(2) o argumento da mudança climática: há várias, ainda que atrasadas,
externalidades negativas inerentes aos padrões atuais de utilização dos
recursos.[1]
Não
importa de qual tipo seja, os argumentos sustentabilistas invocam falhas de
mercado. Com efeito, as próprias
práticas citadas como insustentáveis surgem no livre mercado. Assim, alguma medida externa corretiva - seja
por meio de uma agressiva persuasão moral ou por meio de mais regulação
econômica - é necessária para impedir a iminente catástrofe do uso insustentável
dos recursos.
O sistema de
preços não é suficiente?
Não
quero me estender nas particularidades do movimento sustentabilista. Há inúmeros tipos de manifestações, desde 'construções
verdes' até agricultura orgânica, passando por reciclagem obrigatória e
descarbonização - com efeito, o carro-chefe do movimento sustentável (que
obviamente é pintado de verde e propulsionado por energia renovável) parece ser
infinitamente expansível a ponto de aceitar em seu interior todos os tipos de
indústrias e grupos de interesse. Ao
invés disso, quero falar sobre as implicações essenciais do movimento
sustentável.
O
movimento sustentável é um ataque à ciência econômica. Em seu núcleo, ele alega que os preços não
operam ao longo do tempo de modo a coordenar as decisões de produção e consumo
de uma maneira sustentável. Uma lição em
economia básica deveria ser suficiente para delinear uma defesa contra o ataque
dos sustentabilistas.
Os
preços surgem na economia de mercado como uma baliza para trocas que são
mutuamente benéficas. As pessoas querem
coisas que melhorem suas vidas - chamamos isso de valorizar. Algumas coisas valorosas são mais escassas do
que outras; peguemos o caso clássico da água e dos diamantes. Em termos absolutos, a água é mais valorosa
que diamantes: você não precisa de diamantes para viver. Entretanto
a água é muito mais barata que o diamante.
Por quê? Embora seja valorosa, a
água também é relativamente abundante; em muitas partes do mundo, ela
literalmente cai do céu.
O preço de
qualquer bem reflete sua combinação de valor e escassez. Estamos dispostos a pagar mais por coisas
valorosas à medida que elas vão se tornando escassas (por exemplo, petróleo); e
não precisamos pagar tanto por coisas valorosas à medida que elas se tornam
mais abundantes (por exemplo, cereais).
Da
mesma forma, à medida que as coisas escassas perdem seu valor, as pessoas ficam
menos dispostas a pagar por elas (por exemplo, máquinas de escrever). Inversamente, as pessoas precisam pagar mais
por coisas escassas que repentinamente se tornam muito procuradas (como, por
exemplo, os discos clássicos e antigos de Michael Jackson). O que é impressionante a respeito dos preços
é que eles perfeita e continuamente transmitem essa combinação de fatos sobre o
valor (a demanda) de um item e sua escassez (oferta). Os preços, é claro, estão sujeitos a mudanças
- os preços de certos bens flutuam diariamente.
Mas isso é algo bom; tendências discerníveis nos preços ao longo de um
período de tempo indicam mudanças relativas nos "fundamentos de mercado" - isto
é, da oferta e da demanda.
Nesse
sentido, os preços guiam confiavelmente os indivíduos, tanto os consumidores
quanto os produtores, em direção a um uso mais racional dos recursos. Consumidores astutos seguem o sinal enviado
pelos preços; preços ascendentes indicam que eles devem diminuir o consumo
daquele item em particular, e preços em queda significa que eles podem ir em
frente e consumir um pouco mais daquele recurso. Essa mesma lógica básica do lado do
consumidor se aplica para o lado do produtor.
Empreendedores
à procura de lucro são como cães de caça que, justamente por estarem
continuamente buscando oportunidades de lucro (oportunidade de lucro = chances
de se criar valor por meio das trocas voluntárias), farejam e detectam as
tendências do comportamento dos preços.
Se o preço de um bem apresenta uma forte tendência ascendente (o que
indica que ele se tornou mais escasso e/ou mais valoroso), os empreendedores
correm para encontrar substitutos mais baratos.
Quanto mais baratos os substitutos, maiores os lucros esperados,
principalmente se você for o primeiro no mercado. Se os preços apresentam tendência de queda
(indicando que o recurso está se tornando mais abundante em relação à sua
utilidade), os empreendedores irão aplicar seus esforços em outras áreas.
O
resultado geral desse processo econômico é capturado pelo enunciado "preços
coordenam".[2] Em
outras palavras, o sistema de preços age como uma "mão invisível" que guia as
pessoas - consumidores e produtores - em suas ações econômicas. A verdadeira beleza desse sistema de preços
de livre mercado é que ele produz seu próprio tipo de sustentabilidade.
Peguemos,
por exemplo, uma transição ocorrida livremente no mercado: a iluminação
interior. Velas de sebo foram
substituídas por lampiões a óleo de baleia, que foram substituídos por lâmpadas
a querosene, que foram substituídas por bulbos incandescentes alimentados por
eletricidade. Não foi necessária nenhuma
pressão social ou política para efetuar essa evolução; não houve movimento
contrário à utilização do óleo de baleia, não houve conservacionistas do
querosene e nem qualquer tipo de cruzadas sustentabilistas. Foi necessário apenas um sistema de preços
funcional combinado a uma constante busca empreendedorial por lucros - tudo operando
sob a ordem concorrencial do livre mercado.
Da
mesma forma, na época atual, enquanto os sustentabilistas e outros pessimistas
crônicos nos atormentam com o discurso do esgotamento dos recursos, o sistema
de preços continua funcionando, direcionando serena e seguramente os indivíduos
a economizarem recursos, a buscarem substitutos lucrativos e a anteciparem
tendências futuras. Tudo isso ocorre sem
pregações, sem cruzadas e sem ativismo.
A cruzada sustentabilista é sustentável?
Por
quanto tempo os sustentabilistas continuarão promovendo entusiasticamente sua
causa, trombeteando sua imagem de "somos mais verdes que você" e tentando, com
variados graus de coerção, fazer com que o resto de nós aja "sustentavelmente"
também? Com o alarmismo do aquecimento
global perdendo
credibilidade a cada dia, a probabilidade dos sustentabilistas serem
capazes de proclamar até mesmo uma vitória moral está se esvanecendo. A menos que a terra derreta como consequência
de um pouquinho de fumaça, não estou muito preocupado com a hipótese de os
sustentabilistas terem algum impacto de longo prazo.
A
linha-dura dos sustentabilistas exige mudanças que irão destruir radicalmente a
ordem natural da economia de livre mercado.
Eles querem que abramos mão da nossa riqueza e abracemos todos os tipos
de privação em nome da causa deles.[3] Embora os cidadãos
das democracias ocidentais tenham aparentemente se tornado pessoas ingenuamente
crédulas em tudo o que se diz "verde", esse é o máximo que irão em termos de
"salvar o planeta", principalmente quando se tornar aparente que a
sustentabilidade requer uma marcha rumo à pobreza e uma sociedade profundamente
regulada e arregimentada (e, afinal, o planeta realmente não está em perigo).
Também,
e talvez mais importante, as pessoas nos países em desenvolvimento ficarão
progressivamente repelidas pelas exigências de mais sacrifícios impostas pelos
sustentabilistas. Após terem atingido o
alto padrão de vida que só o desenvolvimento capitalista de longo prazo
permite, é de se esperar que elas ignorem friamente a ideia de reverter esse seu
enriquecimento.
O
atual ressurgimento da tradição liberal clássica na economia também irá reduzir
o apelo da sustentabilidade. A ideia da
sustentabilidade imposta ou centralmente planejada irá se esfacelar perante a
percepção de que a ordem espontânea trazida pela mão invisível do sistema de preços
do livre mercado é surpreendentemente sustentável per se. Acrescente a isso as
privações trazidas pela atual recessão, e não vai demorar muito para que várias
pessoas, mesmo os aguerridos cruzados sustentabilistas, voltem rastejando,
pires na mão, para a economia de livre mercado.
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Notas
[1] O movimento "peak
oil" é um exemplo do primeiro argumento.
[2] Esse é um tema constante nos trabalhos de F.A.
Hayek; veja, por exemplo, seu ensaio clássico, "O Uso do Conhecimento na Sociedade".
[3] Para exemplos de sacrifícios econômicos que a linha-dura
dos sustentabilistas quer impor, ver aqui, aqui e aqui.