segunda-feira, 7 0aio 2018
No dia 5 de maio de 2018 foi comemorado o 200º
aniversário de Karl Marx. O filósofo alemão inspirou uma grande variedade de
movimentos políticos que geraram incontáveis desastres
humanos.
O falecido Rudolph Rummel, o demógrafo perito em
contabilizar todos os homicídios em massa causados por governos, estimou o total de vidas
humanas dizimadas pelo socialismo do século XX em 61 milhões na União
Soviética, 78 milhões na China, e aproximadamente 200 milhões ao redor do mundo.
Todas essas vítimas pereceram de inanições
causadas pelo estado, coletivizações
forçadas, revoluções
culturais, expurgos
e purificações, campanhas
contra a renda não-merecida, e outros experimentos
diabólicos envolvendo engenharia social.
Em termos de monstruosidade, esse terror
simplesmente não encontra paralelos na história humana.
Entretanto, embora tenha sido o inspirador direto de
todas essas catástrofes, Marx continua sendo objeto de admiração de vários
intelectuais e artistas. Um recente exemplo foi o filme O Jovem Karl Marx,
de Raoul Peck, que retrata Marx como um radical
repleto de bons princípios e dotado de uma louvável sede por justiça.
Felizmente para Marx, para seu mito e sua reputação,
ele próprio nunca pessoalmente adquiriu o controle do aparato de algum estado.
Consequentemente, o trabalho sujo de realmente implantar a necessária "ditadura do proletariado"
foi deixado para terceiros. E aqueles que tentaram trazer o marxismo para a
realidade prática rapidamente descobriram que o marxismo aplicado gera apenas empobrecimento,
dizimação de vidas
humanas, e a total
destruição das liberdades individuais.
Não obstante, após um século marcado por brutais
regimes socialistas baseados em várias interpretações das idéias de Marx, o
filósofo alemão sempre é reabilitado sob o mesmo lema: "o socialismo real não
fracassou; ele simplesmente nunca foi tentado".
Ou seja, uma experiência socialista genuinamente
"pura" — como Marx presumivelmente queria — sempre acabava sendo maculada e
se degenerava pela presença de idéias burguesas ou por hábitos capitalistas que
persistiam no aparato estatal.
Um exemplo típico desse tipo de pensamento pode ser
encontrado, por exemplo, em Noam Chomsky e em sua insistência de que o regime obviamente
socialista da Venezuela não
tem absolutamente nada de socialista. A mesma tenacidade é também
encontrada em um artigo de 2017 do filósofo Slavoj Žižek intitulado "O
problema com a revolução venezuelana é que ela não foi longe o bastante".
De acordo com Žižek, o socialismo só pode funcionar
se os hábitos e costumes do status quo
forem destruídos completamente e substituídos inteiramente por novas formas de
pensar criadas e impostas pelos socialistas. Ou, como o próprio Žižek descreve,
provérbios antigos (isto é, modos de pensamento) devem ser totalmente
substituídos por novos provérbios. Por exemplo:
Revolucionários
radicais como Robespierre fracassaram porque tentaram romper com o passado sem
ser bem-sucedidos em seus esforços de impingir um novo arranjo de costumes
(vale recordar o supremo fracasso da ideia de Robespierre de substituir a
religião pelo novo culto do Supremo Ser).
Já
líderes como Lênin e Mao foram bem-sucedidos (ao menos por algum tempo) porque
inventaram novos provérbios, o que significa que impuseram novos costumes para
regular a vida cotidiana das pessoas.
Ou seja, o problema com o socialismo venezuelano não
está no fato de milhares de empresas, fábricas, indústrias e até mesmo pontos
de comércio terem sido confiscadas
e estatizadas, de os direitos de propriedade terem sido abolidos, e de milhões
de cidadãos terem sido destituídos
de suas liberdades básicas. Não, o problema é que o regime venezuelano foi muito conservador, e falhou em implantar
uma total ruptura com o passado.
Mas como, afinal, esta ruptura com o passado pode
ser implantada? A resposta está na linguagem utilizada pelo próprio Žižek. Tudo
depende de "impingir um novo arranjo de
costumes" e de "impor novos costumes".
Esta, obviamente, é a linguagem da coerção e da violência. Esses novos
"costumes" não teriam de ser impostos se as pessoas quisessem adotá-los
voluntariamente, óbvio.
Do ponto de visto do socialista purista, se ao menos
surgissem um novo Lênin ou novo Mao, e estes tentassem com mais afinco, aí sim
o socialismo poderiam finalmente ser bem-sucedido. Como bem resumiu o portal
satírico The
Onion, "Faltou somente um outro grande expurgo para que Stálin
conseguisse criar a Utopia comunista".
Por mais hiperbólica que tal declaração possa
parecer, essa ideia ainda assim descreve de maneira realista a mentalidade
daqueles que alegam que "o socialismo real nunca realmente foi tentado". Se o
socialismo tiver de ser implantado, algo deve ser feito para abolir o apego que
as pessoas têm à propriedade privada e a todos os outros costumes e idéias que
insistem em criar obstáculos nessa estrada rumo à utopia.
Na prática, isso sempre significou utilizar o poder
do estado para forçar um novo estilo de vida sobre as pessoas. Também
significou que, dado que as leis da economia não podem ser revogados, quanto
mais o socialismo era aplicado, mais o padrão de vida afundava. Porém, dizem os
socialistas, enquanto os planejadores socialistas continuarem esforçados e
obstinados, e heroicamente se recusarem a ser sabotados pelo pensamento capitalista,
a utopia finalmente poderá ser alcançada. Sim, haverá muito sofrimento neste
ínterim, mas a recompensa final será incalculavelmente sublime.
Em termos sucintos, eis o raciocínio dos
socialistas: o socialismo só irá funcionar se ele for progredindo até chegar ao
ponto do "socialismo total". Qualquer outro arranjo que não seja o
socialismo pleno é inaceitável. Nenhum esforço parcial será suficiente. E todos
os experimentos socialistas até hoje só fracassaram porque alguns elementos do
"capitalismo" continuaram funcionando. Enquanto ainda existir
qualquer aspecto econômico que não seja de socialismo pleno, o regime não será socialista.
Naturalmente, conclui o raciocínio, se o socialismo
pudesse chegar ao seu estágio pleno — com todos os elementos do capitalismo
eliminados — saberíamos que este sim seria o socialismo puro porque estaríamos
vivendo em uma sociedade marcada por uma prosperidade sem precedentes e por uma
igualdade total.
Representada graficamente, a ideia seria assim:
Um
modelo para ilustrar a tese de que "o socialismo real nunca foi tentado"

O
eixo horizontal mensura a intensidade do socialismo. O eixo vertical mensura a
felicidade
Quanto mais o socialismo vai se intensificando, quanto
mais coisas horrendas o estado vai fazendo, menor a felicidade das pessoas. Até
que, finalmente, o socialismo chega à intensidade máxima, e aí sim as pessoas
repentinamente se dão conta de que estão no paraíso e passam a vivenciar uma
felicidade utópica.
Sem nenhum exagero, essa é a lógica dos socialistas
que recorrem à tese de que "o socialismo real nunca foi tentado". Socialistas
inflexíveis, como Chomsky e Žižek, vivem repetindo que meras medidas parciais
não funcionam para o socialismo, e que apenas o socialismo total pode
funcionar. Qualquer coisa que não seja socialismo pleno, ao que tudo indica,
irá entrar em colapso, como mostra a Venezuela.
Tanto Marx quanto Stalin admitiram que esta "etapa
intermediária" era um problema. Como Ludwig von Mises observou,
Marx chegou ao ponto de inventar uma evolução que se daria em duas etapas para
o socialismo:
Em
uma carta, Karl Marx fez uma distinção entre dois estágios de socialismo: o
estágio preliminar e o estágio superior. Mas Marx não forneceu nomes distintos
para cada um desses dois estágios. No estágio superior, disse ele, haverá
tamanha abundância de coisas, que será possível estabelecer o princípio de
"para todos de acordo com suas necessidades".
Dado
que os críticos estrangeiros observaram severas diferenças no padrão de vida
dos russos, Stálin criou uma distinção. Ao final da década de 1920, ele
declarou que o estágio preliminar era o "socialismo" e que o estágio superior
era o "comunismo". A diferença era que, no estágio preliminar, havia uma
desigualdade nas rações oferecidas aos cidadãos; a igualdade plena só seria
alcançada no estágio superior, o comunismo.
O
capitalismo parcial funciona melhor que o socialismo parcial
Observe, no entanto, o capitalismo não sofre este mesmo problema. Se pegarmos uma economia
que sofre intervenções do estado e começarmos a introduzir reformas liberais
parciais, isso por acaso fará a economia entrar em colapso?
Certamente não. Com efeito, a própria análise
empírica mostra que, quanto menos relativamente socialista for
uma economia, menor
será a pobreza e maior será a prosperidade.
Historicamente, isso é óbvio. Os países que adotaram
mais cedo o livre comércio, a industrialização, e as instituições de uma
economia de mercado são hoje as economias mais ricas do mundo. Isso também
ocorreu na Europa do pós-guerra, onde as economias relativamente mais
pró-mercado, como as da Alemanha e do Reino Unido, são mais ricas e têm um
padrão de vida maior do que as economias mais socialistas do sul da Europa,
como Grécia e Espanha. Com efeito, isso também vale até mesmo para os países
escandinavos, como a Suécia, que enriqueceram ao longo da história adotando regimes bem
próximos ao laissez-faire.
Vemos esse fenômeno se manifestar explicitamente ao
compararmos a Alemanha Ocidental com a Alemanha Oriental. Na Alemanha Ocidental
após a Segunda Guerra Mundial, as reformas liberais
efetuadas por Ludwig Erhard levaram a um período de acelerado crescimento
econômico — mesmo com as reformas tendo sido apenas parciais. Ao abolir os
controles de preços e outras restrições impostas pelo governo à economia, a
Alemanha decolou ao passo que outras economias mais socialistas — como a do Reino Unido à
época — ficaram estagnadas. Já a Alemanha Oriental,
socialista, viu seu padrão
de vida encolher ao longo deste mesmo período de tempo.
Obviamente, a Alemanha Ocidental não adotou um
capitalismo "puro e pleno". Os alemães adotaram um arranjo de economia
relativamente mais laissez-faire que o resto da Europa. E a
economia cresceu forte. Com efeito, as reformas de mercado feitas pelo governo
da Alemanha Ocidental ocorreram quase que por acidente.
E, ainda assim, chamamos os resultados de "o milagre alemão".
Outros exemplos podem ser encontrados na América
Latina (Chile, Peru e Colômbia versus Venezuela, Equador e Bolívia) e na Ásia. Coréia do Sul e Japão estão longe
de ser economias puramente de livre mercado. As economias de ambos os países
são caracterizadas por uma grande variedade de restrições comerciais, ligações
corporativistas entre governo e grandes empresas, e um maciço aparato
regulatório. No entanto, Coreia do Norte e Vietnã, que são muito mais pobres,
sempre tiveram uma participação estatal muito maior na
economia — com o governo sendo o proprietário de várias empresas no Vietnã e
de todas na Coreia do Norte — e um setor privado muito menor em relação aos do
Japão e da Coreia do Sul.
E, ainda assim, pela lógica dos socialistas, o
problema com a Coreia do Norte e com o Vietnã é que eles não têm socialismo
pleno. Se tais países ao menos pudessem se livrar totalmente de seus resquícios
capitalistas, então a Coreia do Norte finalmente irá se tornar próspera, e o
Vietnã passará a rivalizar com o Japão em termos de produtividade e riqueza.
É claro que isso é um contra-senso total. Se a
Coreia do Norte quiser ter menos pessoas passando forme, ela tem reduzir
substantivamente o socialismo em sua economia, como fez a Coreia do Sul.
Conclusão
Onde os mercados são mais relativamente livres, o
padrão de vida da população é mais alto, e maior é o crescimento econômico.
Ao contrário dos socialistas, os defensores do
capitalismo não precisam ficar criando desculpas sobre o fato de "o capitalismo
real nunca ter sido tentado" — ainda que mercados inteiramente livres, sem
nenhuma intervenção estatal, nunca tenham existido em lugar nenhum do mundo.
Por outro lado, duzentos anos após o nascimento de Marx,
a cada novo fracasso inspirado no marxismo, seus defensores são obrigados a
recorrerem às mesmas desculpas de sempre, e com ares de originalidade.
A única esperança é que daqui a 200 anos eles já tenham
desistido.
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