Quando o governo decide intervir na economia
concedendo subsídios, empréstimos subsidiados, protecionismos e reservas de
mercado para aquelas empresas que ele considera fundamentais para o
desenvolvimento econômico do país, a lógica é sempre a mesma: a onisciência de
alguns poucos burocratas supera as preferências de milhões de consumidores.
"Não podemos deixar o futuro das indústrias e
empresas do país ao sabor das caóticas forças do mercado! O governo não só não deve
ser omisso, como deve ser proativo, assumindo um papel decisivo na defesa das
indústrias do país!". Este é o raciocínio por trás de todas as políticas que
envolvem subsídios, empréstimos subsidiados, tarifas de importação e a criação de
agências reguladoras.
Na prática, a preferência voluntariamente
demonstrada pelos consumidores — que decidem se irão comprar ou não bens e serviços
destas empresas — deve ser abolida e substituída pelos caprichos e vontades de
políticos. Sob este arranjo, não são mais os consumidores que decidem quais
empresas devem prosperar e quais devem ir à falência, mas sim membros do
governo, que utilizarão dinheiro de impostos destes mesmos consumidores para
abolir suas preferências de consumo.
Trata-se da completa anulação daquela característica
mais precípua de uma economia de mercado: a liberdade do consumidor.
Políticas
industriais não escolhem vencedores, mas sim derrotados
Ao contrário da crença popular, políticas industriais
não são uma maneira de escolher vencedores
ou "campeões nacionais", mas sim uma maneira de escolher derrotados.
Afinal, se fosse tão óbvio saber quais indústrias e
empresas serão bem-sucedidas no futuro — como pretendem os políticos —, tais
empresas e indústrias teriam acesso fácil e pleno a financiamentos baratos no
livre mercado, tanto via emissão de ações e debêntures quanto via empréstimos junto
a bancos de qualquer lugar do mundo.
Logo, ao escolherem empresas que consideram ser
merecedoras de ajuda estatal — as quais não conseguiram este mesmo privilégio
no mercado —, políticos não estão escolhendo vencedoras, mas sim derrotadas.
Há, sim, um argumento plausível de que mesmo os
mercados — isto é, investidores e consumidores — podem não se dar conta do potencial
de uma determinada empresa e indústria, e, com isso, abortar seu crescimento. Sim,
é isso pode ocorrer. É improvável, mas pode. Porém, qual seria exatamente o
argumento a favor da tese de que um grupo de políticos e burocratas, utilizando
dinheiro de impostos e sem arriscar nada que seja realmente deles (além de,
obviamente, estarem sujeitos a propinas e a todos os tipos de corrupção), teria
esta capacidade que faltou a milhões de investidores e consumidores?
Este processo de escolha política de empresas "vencedoras"
sempre será distorcido por oportunismos políticos e pelo poder de lobby das
grandes empresas. A consequência inevitável é que tal arranjo criará um
incentivo para que estas empresas invistam majoritariamente em fazer lobby e comprar
políticos em vez de se dedicar a pesquisa e desenvolvimento.
Tal política não ajuda a criar vencedores futuros,
mas sim a sustentar ineficientes.
[Nota do
Editor: No Brasil, há vários exemplos práticos disso. A JBS, a Odebrecht (e
todas as outras grandes empreiteiras), as empresas de Eike Batista, e várias
outras grandes empresas brasileiras (como a falida Oi) cresceram explosivamente
nos últimos anos não porque souberam satisfazer os consumidores, mas sim porque
tinham conexões com o governo.
O responsável pelo crescimento destas empresas foi o
BNDES e seus empréstimos
subsidiados por nós, os pagadores de impostos.
Além de privilegiar as grandes empresas, os
empréstimos subsidiados do BNDES — com o dinheiro de nossos impostos —
financiaram grandes fusões, as quais geraram poderosos monopólios e oligopólios
protegidos pelo estado.
Dentre essas empresas privilegiadas — rotulados
pelo governo de "campeãs nacionais" — estão OGX (de Eike Batista, na cadeia),
Odebrecht (na cadeia), Oi (falida), BRF e JBS (propina a políticos), LBR
(quebrada), Marfrig (no vermelho) e Fibria (a única que se mantém, até porque
mexe com celulose).]
Pró-empresa
versus pró-mercado
As diferenças, portanto, são evidentes e
fundamentais.
Uma política pró-empresa favorece as empresas já estabelecidas
em detrimento das gerações futuras. Uma política pró-mercado apenas cria as condições
para que as empresas que saibam como mais bem servir aos consumidores
prosperem, sem favoritismos e privilégios.
Uma política pró-empresas defende empresas nacionais
com tratamento privilegiado e diferenciado. Uma política pró-mercado abre o
mercado doméstico à concorrência internacional, pois sabe que, ao fazê-lo, não só
beneficia os consumidores nacionais como também beneficia as próprias empresas
no longo prazo, as quais terão de se adaptar e aprender a ser competitivas no
mercado em vez de apenas confortavelmente se protegerem e buscarem guarida no
estado.
Uma política pró-empresas faz vista grossa quando
estas empresas protegidas poluem, sonegam e fraudam consumidores, ao mesmo
tempo em que é implacável para com as empresas que não se qualificam no quesito
'favoritas'. Uma política pró-mercado
reduz os fardos tributários e regulatórios, mas garante que a lei valha para
todos.
Uma política pró-empresas, em suma, blinda e protege
as empresas em relação aos consumidores, mantendo-as salvas contra mudanças nas
preferências dos consumidores. Já uma política pró-mercado atribui aos
consumidores a função de escolher quais empresas devem prosperar e quais devem
ir à falência.
Paradoxalmente, políticas pró-empresas acabam por
afetar não só a economia, como também, no longo prazo, as mesmas empresas que
originalmente foram beneficiadas.
Conclusão
Como muito bem sintetizou o historiador econômico Eli Heckscher:
Ou uma empresa é viável, e, consequentemente, não precisa
de ajuda do governo; ou ela é inviável, e, consequentemente, não merece ajuda
do governo.
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fechado
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