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segunda-feira, 30 jan 2017
Foi um solavanco checar o Facebook na semana passada. Vi amigos
antipetistas, que no ano passado reclamavam que o PT deixou o Brasil fora de acordos comerciais, apoiando a decisão de Trump de retirar os Estados
Unidos da Parceria Transpacífico (TPP).
"Donald Trump não é protecionista, a TPP sim", diz
um site da direita sobre o homem que durante a campanha prometia "seguir
duas regras simples: compre de americanos e contrate americanos".
Logo depois vi amigos de esquerda criticando a medida de
Trump — sem perceber que ela se inspira no mesmo protecionismo de Dilma, a
presidenta tão querida para eles. Vai entender.
O personalismo define opiniões políticas. Fingimos defender
ideias, causas e princípios, mas defendemos pessoas. A avaliação de uma atitude
depende mais de quem a tomou que da atitude em si. Só depois que a opinião já
está escolhida e embalada procura-se argumentos para justificá-la.
Há exemplos disso toda semana. Ninguém disse que "picho
é arte" — como se diz hoje a João Doria (PSDB) — quando Marta Suplicy (então
no PT) resolveu coibir os pichadores, em 2002.
Se Dilma houvesse proposto a mesma reforma do Ensino Médio
que Temer apresentou no ano passado, nenhuma escola teria sido invadida. A UNE
e o PSOL comemorariam o maior poder de escolha que a mudança proporcionou.
Quando Jaime Lerner encheu Curitiba de parques e ciclovias,
a esquerda o acusou de só se preocupar com o meio ambiente e ignorar a
periferia. Vinte e cinco anos depois, a mesma acusação recaiu sobre Haddad, mas
na boca da direita.
O personalismo faz opiniões mudarem de lado sem o menor
pudor. O melhor exemplo são as críticas ao Bolsa Família, que nasceram, todas
elas, do próprio PT. Quando FHC criou o Bolsa Escola, em 2001, a esquerda o
acusou de assistencialismo e de criar um "bolsa esmola" para comprar
votos dos nordestinos.
Petistas tiravam da cartola argumentos técnicos que muitos
liberais repetem hoje. "Mais uma vez, [o recurso virá] da população, via
Imposto de Renda, via CPMF, e da atividade produtiva, com o aumento da alíquota
da COFINS, que recai sobre a sociedade", disse
o deputado Valter Pinheiro (PT-BA).
Durante a eleição de 2002, a senadora Heloisa Helena (então no
PT) acusou os tucanos de aterrorizar a população espalhando o boato de que o
Bolsa Escola acabaria se o PSDB perdesse. Segunda ela, os tucanos "se
aproveitam da dor, do sofrimento e da angústia de um pai de família (...)
dizendo que, em qualquer lugar em que a oposição for vencedora, não poderão
contar com mais nenhum desses mecanismos".
De acordo com nossos políticos de estimação, temas sobem ou
desaparecem da agenda pública. Reforma agrária era o problema social mais grave
no governo FHC — mas quando Lula chegou ao poder, não se falou mais no
assunto. Hoje, a reforma agrária foi trocada pelo limite de velocidade nas
marginais.
A boa notícia é que bons frutos podem surgir do ódio a
Donald Trump. Pelos próximos quatro anos, veremos a esquerda criticando o
protecionismo e simpática à ideia do livre comércio internacional.