N.
do E.: o artigo a seguir foi acrescido de temas econômicos com o intuito de
torná-lo mais próximo da realidade brasileira
Entender de economia é saber reconhecer as
consequências secundárias
e nem sempre perceptíveis de uma política econômica. Entender
de economia é entender as consequências gerais de tudo.
A economia é a ciência que examina os efeitos de
alguma política proposta ou existente, não apenas em relação a algum interesse
especial, a curto prazo, mas também em relação ao interesse geral, a
longo prazo.
Entendendo que a economia é a ciência que examina
consequências, então, por definição, assim como a lógica e a matemática, a
economia é a ciência que reconhece implicações inevitáveis.
Podemos ilustrar esse ponto por meio de uma
elementar equação algébrica. Suponha que alguém diga que, se x é igual a
5, então x + y = 12. A
"solução" dessa equação é que y é igual a 7. A equação não faz
essa asserção diretamente, mas, inevitavelmente, indica isso.
O que é verdadeiro nessa equação elementar é também verdadeiro
para as mais complicadas e abstrusas equações que se encontram na
matemática. A resposta encontra-se na própria
enunciação do problema. Ela tem de, é verdade, ser
"calculada". O resultado, é verdade, pode às vezes chegar ao
homem que resolve a equação como uma formidável surpresa. Pode ser ainda
que ele tenha a sensação de estar descobrindo alguma coisa inteiramente nova,
sensação semelhante à de "algum observador dos céus quando um novo planeta
lhe surge à vista". Sua sensação de descoberta talvez seja
justificada pelas consequências teóricas ou práticas da solução.
Contudo,
sua solução já se continha na formulação do problema. Apenas não fora
reconhecida imediatamente, pois a matemática nos lembra que implicações inevitáveis
não são, necessariamente, implicações óbvias.
Tudo isso é igualmente verdadeiro no que concerne a
economia. A esse respeito, poderíamos também comparar a economia à
engenharia. Quando um engenheiro tem um problema, ele deve em primeiro
lugar determinar todos os fatos que com ele se relacionam. Se ele projeta
uma ponte, para ligar dois pontos, ele deve primeiro conhecer a distância exata
entres esses dois pontos, bem como sua precisa natureza topográfica, a carga
máxima que a ponte estará destinada a suportar, a força de tensão e compressão
do aço com que a ponte será construída e as vibrações e tensões a que será
submetida. Boa parte dessas pesquisas factuais já foram feitas por
outros.
Seus antecessores também já resolveram equações
matemáticas complicadas pelas quais, conhecendo a resistência dos materiais e a
tensão a que estes estão sujeitos, puderam determinar diâmetro, forma, número e
estrutura das torres, cabos e vigas da ponte.
Igualmente, aquele economista a quem foi proposto um
problema prático deve conhecer os fatos essenciais desse problema e as deduções
válidas a serem tiradas desses fatos. O aspecto dedutivo da economia não
é menos importante que o factual. Pode-se, sobre ele, dizer aquilo que
George Santayana disse sobre a lógica (e que poderia, igualmente, ter dito
sobre a matemática): "Ela investiga a radiação da verdade", de modo
que "quando se sabe que um termo de um sistema lógico descreve um fato, todo
o sistema ligado a esse termo torna-se, por assim dizer, incandescente".
Ora, poucas são as pessoas que reconhecem as
necessárias implicações das declarações sobre economia que constantemente estão
fazendo.
O que é dito e o que realmente é dito
a) Quando dizem que o governo deve estimular o crédito
para salvar a economia, estão na realidade dizendo que a maneira de salvar a
economia é aumentando o endividamento das pessoas. Crédito e dívida são nomes distintos para a
mesma coisa, vista de lados opostos.
b) Quando dizem que um pouco mais de inflação gera mais consumo e emprego, estão na realidade dizendo que um aumento no custo de vida estimula as pessoas a contratarem mais serviços (como empregadas domésticas) e a irem mais vezes aos shopping centers.
c) Quando dizem que os salários — principalmente o salário mínimo — devem ser aumentados por decreto, estão na realidade dizendo que o segredo para a prosperidade econômica é aumentar os custos de produção.
d) Quando dizem que as exportações devem ser aumentadas e as importações devem ser restringidas, estão na realidade dizendo que a quantidade de produtos à disposição da população nacional deve ser duplamente reduzida — gerando, no mínimo, mais carestia.
e) Quando dizem que o governo deve estimular a indústria nacional por meio de subsídios ou empréstimos subsidiados pelo governo, estão na realidade dizendo que o grande empresariado deve receber dinheiro de impostos do povo e, com isso, levar vantagem sobre os concorrentes menores.
f) Quando dizem que as empresas devem ser controladas por agências reguladoras, estão na realidade dizendo que essas empresas devem operar dentro de um cartel protegido pelo estado, com preços garantidos e sem liberdade de entrada para potenciais concorrentes.
g) Quando dizem que um pouco mais de inflação gera mais crescimento econômico, estão na realidade dizendo que uma perda mais acentuada do poder de compra da moeda e uma maior incerteza quanto aos custos futuros estimulam mais empreendedores a fazerem investimentos produtivos de longo prazo.
h) Quando dizem que as tarifas de importação devem ser
aumentadas e o câmbio deve ser desvalorizado, estão na realidade dizendo que o
poder de compra da moeda deve ser reduzido, que o povo deve ser proibido de adquirir
bens estrangeiros baratos e de qualidade, e que toda a população deve ter seu
bem-estar afetado apenas para garantir uma reserva de mercado para o grande
empresariado nacional.
i) Quando dizem que os agricultores devem ter os preços de seus produtos elevados por programas de compras governamentais, estão na realidade dizendo que toda a população do país deve ter sua comida encarecida.
j) Quando dizem que todos têm direito a saúde, educação
e transporte gratuitos, estão na realidade dizendo que toda a população deve dar
mais dinheiro para burocratas do governo, os quais irão repassar esse dinheiro (retendo
para si uma fatia) para outras pessoas, as quais irão então prover esses
serviços de acordo com critérios especificados por burocratas e políticos, e
não pelos consumidores.
k) Quando dizem que as empresas devem utilizar mais conteúdo
nacional em seus produtos, estão na realidade dizendo que os
fornecedores desse conteúdo nacional têm direito a uma reserva de mercado,
podendo assim elevar seus preços e reduzir a qualidade de seus produtos
despreocupadamente.
l) Quando dizem que o caminho para a prosperidade é aumentar os gastos do governo, estão na realidade dizendo que o governo deve ou tributar mais as pessoas ou incorrer em déficits. A tributação retira renda (logo, capacidade de consumo e investimento) das pessoas e empresas. Déficits significam que pessoas e empresas estão emprestando para o governo, em vez de utilizarem esse dinheiro na própria economia. Significa também que os bancos, em vez de financiarem investimentos produtivos, estão financiando a folha de pagamento do governo. E, finalmente, significa também que haverá aumento de impostos no futuro para que o governo possa arcar com o serviço dessa dívida.
m) Quando dizem que mais gastos do governo estimulam o
empreendedorismo, estão na realidade dizendo que a contratação de mais
burocratas e a criação de mais burocracia, mais leis e mais regulamentações incentivam
a produção e levam a mais geração de riqueza.
Conclusão
Para se fazer uma verdadeira análise econômica, ambas
as faces da moeda devem ser consideradas, de modo que todas as implicações de
uma proposta sejam devidamente entendidas e estudadas. E isso raramente é feito.
A análise dos exemplos acima nos mostra,
incidentalmente, outra lição: quando estudamos os efeitos de várias propostas,
não apenas sobre determinados grupos e a curto prazo, mas sobre todos os grupos
e a longo prazo, as conclusões a que chegamos correspondem às do senso
comum. Não ocorreria a ninguém dizer que é economicamente
estimulante ter vitrinas quebradas e cidades destruídas; que criar projetos
públicos inúteis é uma boa maneira de gastar o dinheiro do povo; que as
máquinas, que aumentam a produção e economizam o esforço humano, devem ser
temidas; que obstruir a produção e o consumo aumenta a riqueza; que a nação se
torna mais rica quando sua moeda perde poder de compra; que a prosperidade
aumenta quando o comércio com os outros países é restringido; que poupar é algo
prejudicial e que o consumismo e o endividamento trazem prosperidade.
"Aquilo que é considerado uma prudência na conduta de toda família em
particular" — disse o bom senso de Adam Smith em resposta aos sofistas de
seu tempo — "dificilmente pode ser loucura na de um grande reino." Homens menores, entretanto, perdem-se em complicações. Não reexaminam
seus raciocínios mesmo quando emergem com conclusões que se evidenciam
absurdas.
Dependendo de suas próprias crenças, o leitor pode
ou não aceitar o aforismo de Bacon, segundo o qual "uma pequena filosofia
inclina o espírito do homem para o ateísmo, ao passo que a profundidade na
filosofia conduz seu espírito para a religião". É verdade, no
entanto, que uma pequena noção de economia pode, facilmente, conduzir às
conclusões paradoxais e ridículas que acabamos de expor, ao passo que a
profundidade nessa noção fará com que o homem retorne ao bom senso.
A profundidade, na economia, está em procurar todas
as consequências de uma política, em vez de apenas dirigir o olhar para as que
são imediatamente visíveis.