quarta-feira, 22 jun 2016
Na quinta-feira da próxima semana haverá o referendo
que
decidirá
se o Reino Unido sairá ou não da União Europeia.
Essa saída do Reino Unido tornou-se popularmente
conhecida como "Brexit" — o termo "Brexit" é uma conjunção de Britain,
de Grã-Bretanha, com exit, que significa saída.
Quais seriam as repercussões dessa saída?
Regulamentações
Para começar, o Reino Unido imediatamente estaria
livre das onerosas regulações que são continuamente e vorazmente promulgadas
pelos burocratas do Parlamento Europeu.
Qualquer pessoa familiar com a história
do "Mercado Comum" europeu — ou "Comunidade Econômica Europeia", como
costumava ser chamado — sabe que tal arranjo sempre foi um esquema para
proteger e privilegiar determinados e poderosos grupos de interesse na
Europa. Dentre os grupos privilegiados
com fartos subsídios e protegidos por tarifas de importação sobre os produtos
de fora da Europa, destaque para o setor agrícola, especialmente o da
França.
Ironicamente, esse arranjo da União Europeia sempre
foi promovido sob o rótulo de "livre comércio", dado que quem é membro da União
Europeia tem de abrir suas fronteiras para todos os outros países que também
são membros. No entanto, isso ocorre à
custa do comércio com o restante do mundo, pois os elevados níveis de
burocracia, regulação e protecionismo estipulados pela Comissão Europeia em Bruxelas
amarra as mãos dos países-membros que querem fazer comércio com a Ásia e com as
Américas.
Não apenas os consumidores da União Europeia têm de
lidar com um maior custo de vida — principalmente no que diz respeito ao preço
dos alimentos — por causa das barreiras ao comércio com o resto do mundo, como
também as indústrias lidam com maiores preços para seus insumos, como as
indústrias que utilizam aço importado de fora da Europa e que, por isso, têm de
pagar as tarifas de importação. Isso
torna os produtores da União Europeia menos competitivos e, consequentemente,
menos inovadores que os do resto do mundo.
Como muito bem colocado pelo documentário Brexit
— The Movie, "você só cria barreiras ao comércio
porque há algum estrangeiro vendendo um produto melhor e mais barato".
Igualmente, a natureza altamente reguladora da União
Europeia impôs um fardo sobre o empreendedorismo nos países-membros. (Tornaram-se
mundialmente famosas as absurdas
e enciclopédicas
regulamentações
sobre a abobrinha e o chuchu). Após
décadas de afiliação do país aos ditames da União Europeia, abrir uma pequena
empresa no Reino Unido tornou-se mais difícil e oneroso do que jamais fôra em
toda a sua história. O furioso ataque de
regulamentações e leis oriundas de Bruxelas tornou incrivelmente difícil para
as pequenas empresas inovarem e crescerem, criando assim uma economia que
favorece as grandes empresas já estabelecidas, protegendo-as da potencial
concorrência de novos entrantes.
Obviamente, sob este arranjo, as grandes empresas
estão totalmente satisfeitas em ter burocratas em Bruxelas prontos para esmagar
qualquer concorrência que possa eventualmente surgir. Como nota o documentário supracitado, "as
grandes corporações adoram a União Europeia porque ela cria regulamentações que
destroem seus concorrentes menores".
Livre
comércio
Ninguém precisa de acordos comerciais promulgados
por burocratas para que as pessoas de um país possam comercializar com pessoas
de outros países. Os defensores do livre
comércio de outrora, como Cobden e Chevalier, sempre se opuseram a acordos
comerciais feitos por políticos. Tudo o que é necessário para que o livre
comércio ocorra é uma inação da parte do estado.
No entanto, inação do estado é exatamente o oposto
do DNA da União Europeia.
Nesse quesito, não há nenhum aspecto negativo quanto
à saída do Reino Unido, pois ninguém está falando em expulsar o Reino Unido da Europa
e de sua área de livre comércio. Ninguém
em Bruxelas está afirmando que o Reino Unido sairá do mercado comum europeu —
que vai desde a Islândia (que não é
membro da União Europeia) até a Turquia (que também não é membro da União Europeia) — caso saia da União Europeia.
Todo o argumento dos defensores da permanência se
resume a dizer que há empregos no Reino Unido que "dependem do nosso comércio
com a União Europeia", o que significa dizer que "dependem da afiliação do
Reino Unido à União Europeia".
O fato é que a prática de um genuíno livre comércio independe
de afiliação a alguma zona aduaneira. Os
eventuais benefícios comerciais de se pertencer à UE são pequenos em comparação
aos maiores benefícios que podem ser alcançados fora da União por meio da liberalização
unilateral do comércio. Com efeito, não há
necessidade nem de acordos bilaterais e nem de multilaterais entre países, uma
vez que a eliminação de barreiras ao comércio não precisa de ser recíproca para
que a população do país usufrua todos os benefícios do livre comércio.
Se o Reino Unido sair do mercado comum da UE, tudo o
que o país tem de fazer para alcançar um genuíno acordo de livre comércio —
aliás, isso vale para qualquer país — é passar uma ínfima legislação declarando
simplesmente que:
Por
meio desta, o governo [insira o nome do gentílico] elimina todas as vigentes barreiras,
restrições e proibições à livre e irrestrita exportação e importação, compra e
venda, de todos os bens e serviços entre [nome do país] e toda e qualquer nação
do mundo. O governo [insira o nome do
gentílico] declara que todas as formas pacíficas e não-fraudulentas de comércio
e troca são questões exclusivas do foro privado de cada indivíduo, e dizem
respeito apenas aos cidadãos do [insira o nome do país] e do resto do mundo envolvidos
na transação. Esta lei entra em vigor
imediatamente.
Se isso acontecesse, os importadores e exportadores
de todo o mundo alegremente fariam comércio com o Reino Unido — como já fazem
com Hong Kong, que não possui nenhuma barreira às importações.
Mas, como já dizia
Mises, acordos comerciais feitos por governos sempre visam a estimular as próprias
exportações e a tolher as importações. O
protecionismo é a regra dentro da UE: os interesses políticos deletérios ao
livre comércio sempre encontram apoio entre os países-membros, e os grandes
grupos empresariais e agrícolas estão continuamente clamando por ainda mais intervenções
sobre o comércio.
Nesse sentido, o mercado comum da UE nada mais é do
que uma bem-organizada camarilha de burocratas protecionistas que gostam de
posar de defensores do livre comércio.
Sem dúvidas, o comércio é muito mais livre fora
dessa organização.
Ademais, para os defensores da permanência, a coisa
se complica quando se observa que os dois países mais ricos da Europa nunca
fizeram parte da União Europeia: Suíça e Noruega. Isso vem fornecendo mais um argumento
poderoso para os defensores da saída do Reino Unido. "Você quer deixar de fazer parte da União
Europeia, assim como os dois países mais ricos da Europa?"
Imitando
a Suíça
Os suíços, obviamente, sempre praticaram um amplo comércio
internacional e usufruem um padrão de vida que regularmente os coloca entre os
três maiores do mundo. Mais ainda: os
suíços possuem um amplo comércio com a União Europeia sem jamais ter sido
membro do arranjo. E, dado que a UE se
baseia majoritariamente em proteger as indústrias européias da concorrência
não-européia, os suíços estão em uma melhor posição em termos de liberdade de
comércio que seus vizinhos.
Politicamente, a Suíça também oferece uma dicotomia
extremamente interessante em relação à UE.
A UE é uma organização secreta e totalmente isolada do povo europeu, o
qual não detém absolutamente nenhum poder de supervisão sobre ela. A UE não é gerida por pessoas eleitas. O próprio Parlamento Europeu é totalmente
impotente para impedir ou revogar os atos da Comissão Europeia (que é o corpo
executivo da União Europeia). Os membros da comissão não são eleitos, mas sim
designados pelos governos dos estados-membros.
Sendo um conglomerado formado por dezenas de
comissões anônimas e secretas, a UE é um paraíso para um burocrata. Pessoas extremamente poderosas permanecem praticamente
anônimas, seguras para impingir seus infindáveis esquemas intervencionistas sem
jamais temer qualquer punição dos eleitores.
Praticamente ninguém é capaz de citar os nomes dos mais poderosos
indivíduos da UE, seja dos cinco
presidentes da UE ou de outros poderosos membros das organizações pertencentes
à UE.
Como bem disse um observador: "De que adiantaria eu
saber quem eles são? Ninguém tem nenhum poder sobre eles."
Agora, compare isso ao sistema suíço, que é
fortemente localizado, descentralizado, dependente de referendos feitos localmente,
e sujeito a vetos dos eleitores. A desconfiança
do poder centralizado é algo fortemente arraigado nos suíços. Já o sistema da União Europeia, por outro
lado, é a própria encarnação da centralização burocrática.
O Reino Unido faria bem em sair da UE e ser mais
como a Suíça.
Contas
a pagar
Uma saída do Reino Unido da União Europeia seria
totalmente diferente de, por exemplo, uma saída da Grécia. Embora a Grécia faça parte da zona do euro e
o Reino Unido não, a Grécia é uma recebedora
líquida das transferências da UE, ao passo que o Reino Unido é um pagador
líquido.
Em outras palavras, o
Reino Unido, assim como a Alemanha e a França, representam as economias grandes
e produtivas que pagam as contas da União Europeia, que conferem
influência à União Europeia, e que produzem a riqueza que
é redistribuída para os países menos produtivos da União Europeia,
como Grécia, Espanha e Portugal.
Não é difícil entender por que alguns britânicos
podem se cansar de pagar as contas dos governos de Portugal, Espanha e Grécia quando a
própria Grã-Bretanha tem vários desafios econômicos para resolver.
O equilíbrio do poder na União Europeia seria
dramaticamente alterado. Com a saída do Reino Unido, a base econômica
produtiva da UE — os "estados pagadores líquidos", como a Alemanha
— seria ainda mais pressionada. Alemanha e França teriam agora,
majoritariamente, de arcar com o financiamento da UE. Consequentemente, a
saída do Reino Unido faria com que o equilíbrio do poder fosse deslocado ainda
mais em prol dos mais numerosos estados recebedores de repasses.
Poderia isso acelerar a saída
da Alemanha da UE? Possivelmente, embora seja difícil prever por
quanto tempo os europeus conseguirão continuar invocando o sentimento de culpa
do nazismo para continuar chantageando emocionalmente a Alemanha a subsidiar o
resto da Europa.
Imigrantes
No entanto, a questão dos imigrantes muçulmanos continua
sendo o tópico principal.
Com a recente enxurrada de refugiados e imigrantes
entrando na Europa, a pressão dos cidadãos britânicos sobre o governo aumentou. Os burocratas de UE propuseram espalhar os
imigrantes por vários países da Europa de acordo com um plano de
re-assentamento pré-definido. Naturalmente, os britânicos não gostaram da
ideia, pois, além das questões que envolvem a segurança nacional, os novos
imigrantes gerarão uma pressão adicional sobre o estado assistencialista
britânico.
E, mesmo que absolutamente nenhum imigrante fosse
realocado para o Reino Unido, os britânicos ainda assim teriam de financiar ao
menos parcialmente o re-assentamento dos imigrantes no resto da Europa por meio
dos impostos que pagam para sustentar a União Europeia.
Uma solução parcial para tudo isso seria, novamente,
apenas sair da União Europeia. Com a saída do país da UE, o Reino Unido teria agora
mais soberania sobre suas fronteiras e não seria obrigado a direcionar dinheiro de impostos para sustentar imigrantes em outros países.
Por tudo isso, as perspectivas de que o
referendo opte pelo 'sim' são consideráveis.
Seria interessante.
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Ryan
McMaken, o editor do Mises Institute americano.
Carmen Elena Dorobat,
pós-doutoranda em economia na Universidade de Angers e professora na Bucharest
Academy of Economic Studies.