Segundo os especialistas, o Federal Reserve — o
Banco Central americano — irá subir os juros ainda neste ano. A política monetária será
normalizada em 2015. Esse é o consenso do mercado.
O que ninguém explica, contudo, é qual taxa de juros será
elevada: a federal funds rate (equivalente à nossa SELIC), a taxa do redesconto
ou alguma outra? Tampouco demonstram como o Fed irá normalizar a política
monetária. Quais ferramentas serão usadas? De que forma conseguirão elevar os
juros?
A verdade é que poucos entendem de fato o que se passa com os
bancos centrais nessa fase pós-crise de 2008. Nem sequer os próprios banqueiros
centrais sabem ao certo como "normalizar" a política depois de tantas ações
inéditas, surpreendentes e em dimensões inimagináveis. O modus operandi atual é "aprender com a prática" (learn by doing), como cunhou o
ex-presidente do Fed Ben Bernanke, em 2012.
Em síntese, estamos submetidos a um processo explícito de
tentativa e erro — uma espécie de voo cego monetário.
A era das políticas monetárias não-convencionais e
acomodatícias trouxe inúmeras incertezas. Mas trouxe também algumas certezas,
dentre elas, a de que política monetária do Fed não será normalizada tão cedo —
ao contrário do consenso de mercado financeiro. Aliás, é necessário, antes de
tudo, definir o que significa "normalizar" a política do banco central
americano.
Se "normalizar"
consiste em retornar a conduta da política monetária à sua forma consagrada
antes do estouro da crise — quando o Federal Reserve estabelecia e perseguia
uma meta para a federal funds rate (FFR) com o intuito de atingir o seu duplo
mandato de estabilidade de preços e máximo emprego —, melhor esperar sentado,
pois tal normalização não será alcançada em um futuro breve. E por um motivo
bem simples: por sua própria culpa, o Fed está impossibilitado de manipular a
FFR porque ele mesmo aniquilou o mercado interbancário americano ao jorrar
liquidez no sistema por meio de suas rodadas de quantitative easing (QE).
Exatamente como isso aconteceu e quais as implicações para o
futuro do banco de Janet Yellen é o que procuraremos expor neste artigo.
Logicamente, nos aventuraremos também em prever os possíveis desdobramentos às
economias americana e mundial.
Pela premência e complexidade do tema, este texto será um
pouco mais longo e profundo que o usual. Para quem está operando no mercado
financeiro, é fundamental entender o que está acontecendo com o banco central
americano e como suas ações futuras impactarão os mercados.
Dito isso, recomendo lê-lo na íntegra — possivelmente, este
será o artigo mais importante sobre Fed que você lerá em 2015. Bear with me.
O óbito da federal
funds rate
Desde 1995, a federal funds rate (a taxa básica de juros dos
EUA, equivalente a nossa taxa SELIC) é o pilar da política monetária
americana. Para perseguir sua meta de estabilidade de preços, o Fed define um
alvo para a FFR e busca atingi-lo por meio de injeções de liquidez no mercado
interbancário, aumentando ou reduzindo o nível de reservas dos bancos (para
entender com detalhe como funciona esse mecanismo, recomendo o livreto "Federal Reserve
System: Purposes and Functions" e este excelente artigo do Leandro
Roque).
O racional por trás dessa política é que as demais taxas de
juros no mercado são influenciadas pela FFR — uma taxa de curtíssimo prazo —,
assim, qualquer alteração no nível da taxa básica será sentida ao longo de toda
a economia, afetando o preço de diversos ativos, inclusive os juros dos títulos
de dívida do Tesouro americano, os do crédito bancário, e assim por diante.
Entretanto, após a quebra do Lehman
Brothers, a federal funds rate efetivamente morreu. De que forma? Em
essência, a FFR é a taxa utilizada pelos bancos para emprestarem dinheiro entre
si no mercado interbancário visando à manutenção dos níveis de reservas mínimos
estabelecidos pelo Fed (equivalente ao "compulsório" definido pelo Bacen). Mas
no momento em que
Bernanke decidiu adotar as medidas extraordinárias,
resgatando instituições insolventes e injetando bilhões de dólares no sistema
bancário, o nível de reservas dos bancos foi às alturas.
Na prática, isso significa que a demanda por reservas
despencou. Com reservas em excesso — muito além do mínimo exigido pelo Fed —,
os bancos não precisam recorrer ao mercado interbancário. A abundância de
dinheiro no sistema fez a FFR desabar. Não foi o Fed que estabeleceu a FFR em
zero; a taxa de juros chegou a esse patamar porque o Fed inundou o
interbancário com liquidez.
Quando Bernanke definiu a taxa de juros básica entre 0% e
0,25%, ela já estava nessa condição; o chairman do Fed apenas oficializou o
alvo da FFR em um nível ao qual ela já havia chegado — no gráfico abaixo, é
possível verificarmos a taxa efetiva da FFR e o alvo estipulado pelo Fed. A
partir da segunda metade de 2008, notem como a taxa efetiva despenca para
próximo de zero antes do alvo para a FFR ser fixado em 0%.

Enquanto os bancos mantiverem reservas em excesso, o FOMC
(Federal Open Market Committee, o COPOM do Fed) pode dizer e divulgar o que
quiser, mas não conseguirá elevar a FFR. Ela continuará no chão. As rodadas
posteriores de QE amplificaram ainda mais a magnitude do problema.

É importante compreender um ponto fundamental: o Fed não
controla a FFR. Ele tem o poder, sim, de manipulá-la, injetando e removendo
liquidez no interbancário, mas não pode determiná-la por decreto. Por isso, o
FOMC estabelece um alvo para FFR; a taxa efetiva, porém, sempre diverge, pois
ela é resultado da oferta de reservas e da demanda por elas entre os próprios
bancos comerciais no interbancário.
As medidas excepcionais de Bernanke fizeram as reservas
bancárias transbordar, decretando, na prática, o óbito da federal funds rate.
É possível normalizar e
reverter o tamanho do balanço do Federal Reserve?
Então, como normalizar a política monetária e ressuscitar a
FFR? Simples: eliminando as reservas em excesso. De que forma? Revendendo ao mercado
todos os Treasuries (títulos do Tesouro) e hipotecas adquiridos via QE ou
deixando os bancos emprestarem às empresas e famílias americanas, migrando, com
o decorrer do tempo, o volume de reservas em excesso para reservas compulsórias[1] — na
última parte deste artigo, analisaremos as outras alternativas que a chairwoman do Fed tem na mesa.
Agora, seria plausível esperar que o Fed revenda grande parte
dos quase US$ 4 trilhões de ativos acumulados desde outubro de 2008? Antes de
responder a essa pergunta, faz-se necessário analisar o próprio balanço do
banco de Janet Yellen.
As rodadas de "afrouxamento quantitativo" (QE) foram mais do
que apenas uma questão de quantidade. Em realidade, as compras maciças de
ativos pelo Federal Reserve deveriam ter sido qualificadas como "afrouxamento
quantitativo e qualitativo".
Por quê? Historicamente, o banco central americano — assim
como qualquer autoridade monetária de países avançados — somente poderia
adquirir ativos de ótima qualidade. Como o famoso jornalista e economista
inglês do século XIX Walter Bagehot há muito tempo cunhou:
"Bancos centrais, em tempos de crise, devem emprestar livremente a instituições
solventes, sob a entrega de bons colaterais, a taxas penalizantes".
De 2008 até agora, Bernanke e Yellen acumularam mais de US$
1,7 trilhão de hipotecas de qualidade no mínimo questionável — fossem elas
bons ativos, não precisariam ter sido adquiridas do sistema bancário. O QE foi,
essencialmente, uma política para remover do balanço dos bancos americanos uma
boa dose de lixo financeiro, devolvendo-lhes a condição de solvência da noite
para o dia.

Além disso, historicamente, o ativo do Fed era
majoritariamente composto por títulos de curto prazo do Tesouro dos EUA, os
Treasury Bills — tais títulos são usados na condução da política monetária no
mercado interbancário para influenciar a FFR. Com a série de QEs, Bernanke
alongou o prazo médio do ativo do Federal Reserve sobremaneira, absorvendo do
mercado Treasurys de 10, 20 e 30 anos em uma proporção preocupante.

Nunca o balanço do Fed esteve tão exposto ao risco de juros.
Hoje, T-Bills não correspondem a nem sequer 1% do ativo do banco — no passado,
essa proporção era de 30%. Mais da metade dos Treasuries em carteira tem vencimento
acima de cinco anos.

Caso os rendimentos dos Treasurys revertam a tendência e se elevem, o Fed poderá incorrer em perdas
vultosas quando revender esses ativos ao mercado — o mesmo fenômeno ocorrerá
com as hipotecas no balanço do Fed, já que têm um prazo médio de mais de 30
anos.
Isso é, também, um potencial complicador à normalização da
política monetária, porque em um cenário de juros crescentes, a liquidez
injetada pelo Fed quando da compra do ativo não poderá ser retirada no mesmo
volume, pois o valor do ativo agora é menor.
O balanço do banco de Janet Yellen não está apenas maior,
como também a qualidade do seu ativo se deteriorou seriamente. O Fed, assim,
tornou-se o arquétipo do banco que ele próprio tentou resgatar: repleto de
ativos tóxicos de longo prazo, com uma alavancagem total acima de 70 vezes —
talvez a maior do planeta — e, possivelmente, insolvente. Mas ele é o banco
central, essa é a diferença; não precisa marcar a mercado o valor dos ativos
que carrega no seu balanço e detém o monopólio de impressão do dólar.
Analisado o ativo do Federal Reserve, podemos responder à
pergunta: seria plausível o Fed despejar no mercado trilhões de hipotecas de
valor duvidoso, levando muitos bancos ao limiar da falência novamente? Da mesma
forma, será que o Fed recolocaria no mercado trilhões de dólares em Treasuries,
pressionando o rendimento dos títulos soberanos e elevando, assim, o custo de
refinanciamento e o déficit orçamentário do governo americano?
Não consigo prever nenhum chairman
do Federal Reserve tomando a decisão de retroceder o balanço do banco. Não
agora. E talvez nem por alguns bons anos mais.
O que o Fed pode fazer então?
Antes de especularmos sobre as possíveis estratégias no jogo
de Janet Yellen, é imprescindível considerar alguns dados do cenário econômico
atual, bem como os efeitos das políticas monetárias acomodatícias em diversas
classes de ativos.
O mercado e os
indicadores econômicos
A economia americana está se recuperando apesar do Federal Reserve. Reitero: apesar das medidas extraordinárias adotadas desde 2008, a economia
dos Estados Unidos mostra sinais de melhora. Destaco esse ponto porque muitos
analistas costumam relacionar causa e efeito entre as políticas acomodatícias
do Fed e a recuperação da economia dos EUA. Mas esta ocorre não por
causa, e sim a despeito das ações
de Bernanke e Yellen.


Porém, o crescimento da economia e a redução do desemprego
não são homogêneos. Há duas economias claramente distintas na América do Norte:
a economia relacionada ao setor de energia — leia-se gás de xisto e petróleo —
e o resto — este ainda não saiu da crise.
A revolução
do setor de petróleo e gás nos EUA é de fato impressionante. A sua pujança é
tão notável que ela acaba ofuscando o restante da economia, a qual permanece,
para todos os efeitos, tépida e cambaleante. Não fosse a geração de emprego
oriunda do petróleo e gás, o desemprego americano estaria em níveis ainda
preocupantes.

Embora haja inovação tecnológica e crescimento real nesse
setor, não podemos ignorar as consequências da política acomodatícia do Fed.
Com tanto crédito barato e emissão de dívida corporativa a juros irrisórios, é
inegável a possibilidade de inúmeros investimentos equivocados no setor de
petróleo e gás, o que os economistas austríacos chamam de malinvestments. Isso não significa que o setor em si é uma bolha,
mas sim que pode haver sido superdimensionado, gerando uma capacidade ociosa
não desprezível.
No entanto, toda a liquidez injetada no sistema pelo Fed não
resultou em aumentos expressivos da inflação de preços ao consumidor. O
Consumer Price Index (CPI, equivalente ao nosso IPCA) registrou alguns picos
após 2008, mas desde 2012 ele tem se mantido ao redor de 2%, sendo que nos
últimos meses caiu consideravelmente, fechando 2014 com apenas 0,8% de
incremento anual — a queda vertiginosa do petróleo foi a grande responsável
pelo menor nível do CPI dos últimos cinco anos.

Estariam os austríacos errados nas suas previsões? Por um
lado, sim, pois a grande maioria dos economistas da Escola Austríaca esperava
um aumento de preços mais relevante. Isso não aconteceu. Mas por outro, os
austríacos estão repletos de razão, pois todos sabem que um excesso de liquidez
no mercado — inflação monetária — não impacta os preços uniformemente nem com
a mesma intensidade. Todos sabem que crédito barato e emissão de moeda causam
distorções na economia, podendo gerar bolhas em diversas classes de ativos
mesmo com um CPI baixo e estável. Inflação de preços baixa e estável não é —
jamais! — garantia de estabilidade financeira.
E não é preciso vasculhar muito para encontrar indícios de
bolha nos EUA; basta olhar para o mercado acionário — o S&P 500 e o Dow
Jones bateram recordes
sucessivos nos últimos anos — e para o gigantesco mercado de bonds e dívida corporativa — para
muitos, é onde já está formada a mãe de todas as bolhas.
Um breve adendo: a
bolha dos bonds soberanos
Sejamos francos: os bancos centrais nunca engendraram tamanha
impressão de dinheiro como o fizeram após 2008. Os balanços das principais
autoridades monetárias do planeta triplicaram ou quadruplicaram em questão de
poucos anos. A maior parte dos países injetou liquidez maciça no sistema em
conjunto com o Federal Reserve depois do estouro da crise — embora esse tema
mereça um artigo à parte, deixaremos aqui alguns pontos fundamentais para
reflexão.

De meados de 2009 até o momento, fixaram as taxas de juros em
zero ou muito próximo a zero o Federal Reserve, o Banco Central Europeu (BCE),
o Banco da Inglaterra, o Banco do Japão, o Banco Nacional da Suíça e o de todos
os demais países do G8.
Há 37 países com taxas de juros abaixo de 1% e 64 países com
taxas de juros abaixo de 3%. As principais moedas internacionais estão com
juros em níveis irrisórios. Não há nada semelhante na história do mundo, nem
por tempo tão prolongado.
Seria plausível esperar que taxas de juros em zero, rodadas
infindáveis de QE e alavancagem excessiva no mercado financeiro não gerassem
nenhum efeito colateral? É claro que não.
Grande parte da liquidez do sistema inflou justamente o preço
dos títulos soberanos — apesar das situações fiscais ainda calamitosas na
maioria dos países da Europa, dos EUA e do Japão. Os yields dos títulos soberanos já se encontram próximos aos níveis
mais baixos de toda a história. De fato, desde o ano da derrocada de Napoleão
Bonaparte, em 1815, os yields não
chegavam a um patamar tão miúdo.

Yields em 26/jan/2015.
Fonte: Bloomberg.com
Após o anúncio de QE pelo Banco Central Europeu, diversos
países da Europa apresentaram yields
negativos nos títulos com vencimento em um ano. Inclusive a França, considerada
por muitos analistas — e com razão — um dos piores quadros fiscais da Zona do
Euro.
E superando todas as expectativas e a mais kafkiana das
previsões — e de quebra entrando para a história mundial das finanças —, a
curva de juros dos títulos soberanos da Suíça conseguiu a façanha de apresentar
rendimentos negativos até 15 anos.

Sim, exatamente. Se você comprar um título suíço com
vencimento em 2030, você irá receber de volta menos do que investiu, já considerando
os juros embutidos — uma verdadeira proeza dos bancos centrais modernos. Mais
uma anomalia do mundo financeiro do século XXI. Mais um episódio sui generis da conjuntura ímpar pela
qual o mundo financeiro atravessa.
Houve um tempo em que o rendimento dos títulos de dívida
transmitia uma informação deveras importante: a qualidade do emissor e sua
capacidade de pagamento. Hoje essa informação não existe. Os rendimentos não
são um preço de mercado, são preços controlados e adulterados. Um preço manipulado
perde a própria definição de preço,
passando a ser apenas um dado econômico com informação de mercado quase
nula.
Por isso, há um descasamento entre o preço dos ativos e o
risco subjacente. Os preços dos ativos refletem já não os fundamentos, mas na
verdade a vontade dos banqueiros centrais. Os fundamentos foram solapados pela
injeção de liquidez. O yield dos
Treasurys não está alto ou baixo, ele está onde a Janet Yellen quer que esteja.
O que guia os mercados são os discursos do Fed e BCE.
Não importa mais se a dívida está aumentando. Importa apenas
se o Fed está injetando mais liquidez. Importa apenas se há mais impressão de
dinheiro. Originariamente prestamistas de última instância, os bancos centrais
tornaram-se, agora, os market-makers
de primeira instância.
Como muito bem afirmou Andy
Haldane, diretor executivo de Estabilidade Financeira do Banco da
Inglaterra, em uma audiência do Comitê do Tesouro, em 2013: "Sejamos claros,
nós inflamos intencionalmente a maior bolha de títulos soberanos da história.
Se eu tivesse que destacar qual o maior risco à estabilidade financeira global
neste momento, eu diria que é uma reversão desordenada dos rendimentos de
títulos governamentais globais".
O rally do dólar
Os mercados estão sempre nos surpreendendo. Expectativas
realmente são capazes de afetar os preços dos ativos, embora, muitas vezes, os
fundamentos permaneçam essencialmente inalterados. Quem teria previsto esse
rally do dólar depois de QE1, QE2 e QE3? Quem teria previsto que o índice do
dólar (Dollar Index)
ultrapassaria as máximas dos últimos dez anos? Como imaginar que o euro se enfraqueceria
perante o dólar, depois de o Fed ter despejado $ 1,7 trilhão no mercado durante
o QE3 — um aumento de 60% dos seus ativos —, enquanto o Banco Central Europeu reduziu o seu
balanço em € 1 trilhão no mesmo período — uma redução de 33%?

Enquanto o Fed simultaneamente injetava liquidez no sistema e
declarava ao mercado que logo cessaria, o BCE retirava dinheiro da economia,
mas era taxativo ao afirmar que logo lançaria a sua versão de afrouxamento
quantitativo. Esse é o cerne de uma das ferramentas usadas na política
monetária pós-2008: forward guidance
(orientação futura).
O discurso dos
bancos centrais tornou-se um pilar da política monetária moderna. Ele
influencia as expectativas dos investidores quanto às possíveis intervenções do
Fed. Influenciando as expectativas, os investidores ajustam suas previsões e
atuam de forma diferente, muitas vezes desprezando os fundamentos subjacentes.
Isso resume o que ocorre com o dólar e o euro nos últimos anos.
Não há como negar, o dólar ainda detém o status de reserva
mundial, e ao menor sinal de turbulência, os investidores ainda fogem do resto
em busca da moeda americana. E quando o forward
guidance do Fed destoa nitidamente do BCE e do Banco do Japão — Yellen
sinaliza elevação dos juros, enquanto a dupla Draghi
e Kuroda
promete impressão de moeda ilimitada, custe o que custar —, a decisão dos
mercados fica fácil.
A renovada força do dólar não significa, porém, que se trata
de uma moeda fundamentalmente sólida. Longe disso. E, como demonstrado acima, a
política do Fed tem minado a saúde da moeda americana. Mas neste estágio da guerra cambial, é o dólar
que aparentemente será menos depreciado do que o euro e o yen. Nessa corrida ao
fundo do poço, fortalece-se — ou se enfraquece menos — aquela moeda cujo banco
central é mais comedido ou promete sê-lo a partir de agora.
Depois de compreendermos o porquê do óbito da federal funds
rate e de analisarmos o balanço do Federal Reserve e alguns dados econômicos e
do mercado financeiro, podemos, finalmente, examinar as possíveis estratégias
do banco central americano e traçar algumas previsões.
Esse será o tema da segunda e última parte deste artigo.
[1]
O nível de reservas é determinado pelo Federal Reserve; os bancos não debitam
nem creditam essa conta, apenas o Fed. Assumindo como premissa que a postura do
banco central americano e o nível do compulsório permaneçam inalterados, quando
os bancos começarem a emprestar ao público, o volume total de reservas seguirá
igual; a única diferença é que agora parte das reservas será considerada
reserva compulsória, reduzindo o nível de reservas em excesso. Reduzir
ou aumentar o volume total de
reservas (compulsórias e em excesso) é algo que somente o Federal Reserve pode
fazer. Os bancos não emprestam reservas ao público; na verdade, eles criam
novos empréstimos contra novos depósitos à vista, elevando o agregado monetário
M1, mas não a base monetária (papel moeda + reservas bancárias).