segunda-feira, 1 dez 2014
Tenho lido muitas impressões equivocadas em torno da
proposta separatista do estado de São Paulo, vindas de pessoas que pouco se
interessaram ou procuraram se informar sobre o assunto. Os comentários sobre a
proposta estão sendo bastante vulgares, preconceituosos e/ou dogmáticos, em
virtude do desconhecimento das razões de fato e das justificativas de direito
que a fundamentam há anos, bem como das vantagens percebidas pelos militantes
da separação.
Além do mais, embora o recente resultado final do segundo
turno das eleições nacionais tenha contribuído grandemente para chamar a
atenção das pessoas para a causa, é de se salientar, desde já, que a proposta
separatista em nada tem a ver com este resultado, de forma que ela já existia
muito antes deste fato, e continuaria a existir ainda que o resultado fosse
diferente, por ser um movimento social independente desta variável eleitoral.
A fim de fazer avançar o debate em torno desse tema e
torná-lo mais público, aberto, honesto e menos vulgar, gostaria de dar uma
primeira contribuição pessoal, esclarecendo melhor alguns elementos.
Como os argumentos da causa separatista são bastante claros,
enfatizo desde já o convite, devidamente implícito em todo debate político,
para que os discordantes procurem enfrentar honestamente os argumentos
pró-secessão nos termos em que eles mesmos são propostos. Adianto que este
texto obviamente não se propõe a esgotar o tema; apenas se trata de uma
contribuição parcial a este debate que vem ganhando espaço.
Das razões de fato
que subjazem a proposta separatista
Embora possam existir razões subjetivas de natureza
cultural e histórica que fundamentem a militância separatista individual, o
caráter mais ou menos idiossincrático e a dependência subjetiva destes elementos
culturais e históricos torna difícil a transposição dos mesmos para um debate
político público e amplo em torno do tema.
Não é fácil falar para um não-paulista sobre qualquer
possível "orgulho de ser paulista", o que inviabiliza o recurso a estes elementos
subjetivos num debate. Desse modo, ainda que possam existir razões formadas por
elementos de identidade cultural que venham a basear a busca pela secessão,
buscarei tratar aqui somente daquelas razões que possam ser objetivamente
analisadas nesse debate.
As razões objetivas de fato que fundamentam a causa
separatista paulista são ao menos três, sendo que eventuais
autores poderão elencar outras tantas:
1-) a grande
centralização legislativa do atual arranjo institucional federativo, que
poda a autonomia legislativa do estado de legislar em seu interesse e de acordo
com suas necessidades próprias;
2-) a
desproporcional sub-representatividade do estado de São Paulo no plano
legislativo federal, o que dificulta sua influência para contornar ou
amenizar o problema apontado no item anterior;
3-) a extorsão
fiscal a qual é submetido o estado pelo governo federal, de difícil
superação dado o problema apontado anteriormente.
Em primeiro lugar, a legislação no país é grandemente
centralizada no plano federal. O art. 22 da Constituição Federal determina que:
Compete privativamente à União legislar sobre: direito
civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico,
espacial, trabalhista; desapropriações; [...] águas, energia, informática,
telecomunicações e radiodifusão; sistema monetário, [...] política de crédito,
câmbio, seguros e transferência de valores; comércio exterior [...]; trânsito e
transporte; [...] jazidas, minas e outros recursos minerais; [...]condições
para o exercício das profissões.
Em outras palavras, em matéria legislativa, a Constituição
determina que quase tudo deve ser
deliberado em Brasília, conferindo pouquíssima autonomia aos estados em matéria
de formulação e implantação de leis próprias e adequadas à sua realidade e aos
interesses particulares da sua população.
Isso significa, a título de exemplo, que se a população
paulista quiser discutir a implantação de um sistema de votos distrital, por se
tratar de matéria eleitoral o debate deverá necessariamente se dar em Brasília. Assuntos
no campo penal, civil, processual, entre tantos outros, também deverão obedecer
a mesma dinâmica.
Em segundo lugar, o estado de São Paulo é
desproporcionalmente sub-representado no plano legislativo federal, o que
agrava qualquer tentativa de amenizar o problema anterior. A título de
ilustração do que está sendo afirmado, o estado de Roraima, por exemplo, possui
uma população de aproximadamente 496 mil habitantes (usarei dados do censo 2010), a qual
é representada, na Câmara dos Deputados, por 8 deputados federais — o que
significa que cada deputado roraimense representa 62 mil habitantes de seu
estado. O estado do Piauí possui uma população de aprox. 3,2 milhões de
habitantes, que por sua vez é representada por 10 deputados federais — uma
representação na escala de 320 mil habitantes por deputado piauiense. Já o
estado de São Paulo possui uma população de aprox. 44 milhões de pessoas, sendo
representado, na Câmara dos Deputados, por 70 deputados — uma representação na
escala de 642 mil paulistas para cada deputado federal de seu estado.
É óbvia e completamente desproporcional esta relação — São
Paulo possui uma relação de representatividade dez vezes menor que Roraima, e
duas vezes menor que o Piauí.
O mesmo se reproduz em diferentes medidas quando São Paulo é
comparado com qualquer outro estado da federação: trata-se do estado com a
menor relação de representatividade por habitante, na Câmara dos Deputados. No
Senado Federal a coisa piora, porque todo estado é representado igualmente por
3 senadores — ou seja, São Paulo e Roraima são igualmente representados pelo
mesmo número de senadores, independentemente da diferença de quase dez vezes
entre a população do primeiro para o segundo estado.
Por fim, há também o fato de que o estado de São Paulo é
grandemente explorado no campo fiscal pelo Governo Federal. De acordo com dados
da Receita Federal (em relação à arrecadação anual da União por estado) e do
Portal Transparência (em relação ao repasse da União por estado), em 2013 a
União recolheu R$318 bilhões em tributos[1]
da população do estado São Paulo, e desse total somente R$32,8 bilhões
retornaram na forma de transferência de recursos do Governo Federal para as
Prefeituras municipais (R$27,1 bilhões) e para o Governo Estadual (R$5,7
bilhões) do estado de São Paulo — um déficit de R$285 bilhões, um retorno de
apenas 10,4% do valor arrecadado.
Não há outro nome que se possa dar a uma tão
desproporcional expropriação do fruto do trabalho alheio além de escravidão. Estes números sugerem que
São Paulo, hoje, é um estado escravizado pela República. Dado o problema
anterior da desproporcional sub-representatividade de São Paulo no Congresso
Nacional, qualquer tentativa de alterar essa exploração fiscal é boicotada
pelos estados que se beneficiam dessa redistribuição — reconhecidamente, estados
do norte e nordeste do país.
Os dados e informações que indicam esses três fatos podem
ser encontrados facilmente, e qualquer opositor da causa separatista que queira
encarar honestamente este debate tem o ônus de ter que lidar com eles. Além do
mais, deve apontar quais são as vantagens de se fazer parte de um arranjo tão
desequilibrado.
Da fundamentação
jurídica da separação
As razões de direito que justificam a causa separatista
podem ser encontradas no próprio arranjo democrático federalista do estado, bem
como em instrumentos legais nacionais e internacionais que versem sobre os
Direitos Humanos mais elementares.
É reconhecida sem muitas dificuldades pelo senso comum e
pelos defensores da democracia a afirmação segundo a qual "a democracia é uma forma de governo fundamentada no consentimento dos
governados". Afirmar isso é dizer que o consentimento popular dos
governados é, ao menos em tese, a principal coluna e o lastro social único
sobre o qual se sustenta (ou deveria se sustentar) um regime democrático
genuíno.
Ao mesmo tempo, essa afirmação imediatamente procura
estabelecer uma contraposição quanto à natureza da democracia em comparação aos
regimes políticos caracteristicamente despóticos e autoritários lastreados na
força, fundados na imposição do estado sobre os seus governados. Existindo o
consentimento dos governados, legitimada está a democracia; inexistindo
consentimento, comprometida está a única base legítima de sustento de um regime
genuinamente democrático.
No nosso atual arranjo político estatal, os estados-membros
são indubitavelmente governados pela União. Como mencionamos acima, no tópico
anterior, o art. 22 da Constituição Federal determina que é de competência
privativa da União a legislação que verse sobre todas aquelas matérias
elencadas no referido dispositivo, cabendo aos estados se submeterem a elas. O
art. 24, § 4º, por sua vez,
estabelece que, havendo conflito de normas no âmbito da legislação concorrente,
a lei
federal prevalece sobre a lei estadual, naquilo que lhe for contrária. A
relação de governança é, portanto, bastante clara.
O direito de
secessão, numa arquitetura federalista e democrática como a nossa, nada
mais é que o direito que uma entidade
federada (i.e. governada pela União) possui de dispor, livre e unilateralmente,
deste consentimento sobre o qual se sustenta o governo da União sobre ela –
se é que esse governo se almeja ser
democrático.
Se as entidades federadas são as partes que compõem o pacto
federativo (porque, afinal, não há pacto sem partes legítimas), claro está que
cada parte é livre para dispor do seu consentimento em torno do pacto, tendo em
vista o prazo indeterminado de duração do mesmo.
Não há, no universo
do Direito, pacto por tempo indeterminado que necessariamente vincule
eternamente as partes de uma associação. Curioso perceber como que no campo
do Direito Internacional a desvinculação dos estados-membros de uma organização
internacional se desenvolve sem maiores empecilhos. O que temos dito é que,
encerrado o consentimento popular (democraticamente auferido) de uma entidade
federada, sobre o qual se fundamenta e se legitima o governo democrático da
União sobre ela, nasce a partir daí a faculdade da secessão, isto é, o direito
de se apartar daquela tutela jurisdicional.
Sendo o consentimento algo próprio do grupo governado e não
do governo, não faz sentido imaginar que o proprietário do objeto não possa
livremente dispor do mesmo. Qualquer
negação dessa conclusão implica, necessariamente, o reconhecimento de que a nossa
democracia se fundamenta na força da União em impor e perpetuar a aceitação de
seu regime pela força, e não em virtude do consentimento dos governados em se
manter vinculados a este regime — o que torna a democracia um regime tão
despótico quanto qualquer outro em sua natureza, e transforma a situação toda
em coisa odiosa por sua essência, passando a se tornar um dever moral de
qualquer homem levantar a sua mão contra esse regime, o que justifica ainda
mais a separação.
A secessão, portanto, é, na verdade, o teste final de uma
democracia enquanto regime político genuinamente baseado no consentimento das
partes governadas, como ela é ou se apresenta ser.
Qualquer opositor da proposta separatista tem o ônus de
mostrar por que um governo, baseado num pacto por tempo indeterminado, o qual,
por sua vez, está continuamente fundado no consentimento das partes envolvidas,
deverá necessariamente vincular estas partes eternamente.
Embora o art. 1º da Constituição Federal estabeleça que "a República é formada pela união indissolúvel
dos Estados e Municípios", sem pontuar maiores razões que justifiquem essa
determinação, e embora os opositores da separação aleguem que esse caráter
indissolúvel é, por definição, próprio das federações, a alegada proibição da
secessão, mesmo dentro de um arranjo federativo, é algo no mínimo controverso
no campo do Direito, existindo vários elementos doutrinários e dispositivos
legais que subsidiam o exercício legítimo deste direito.
O próprio artigo 5º da referida Carta Magna, que trata dos
Direitos Fundamentais do cidadão, estabelece em seu inciso XX a garantia
constitucional da liberdade de associação,
determinando que "ninguém será compelido
a se associar ou a permanecer associado". Embora não seja uma garantia
absoluta, a extensão desta garantia é tal que não existem, no direito interno,
exceções a esta liberdade que se apliquem a casos de associações por tempo
indeterminado, não havendo meios jurídicos que possam forçar a continuação da
associação do indivíduo (ou grupo de indivíduos) a qualquer instituição da
sociedade cujo prazo de existência ou de vinculação do associado não estejam
previamente determinados, seja ela uma empresa, um clube, um partido político,
um sindicato, uma universidade, uma igreja, uma relação matrimonial, ou mesmo o
estado.
Trata-se a liberdade de associação justamente de uma garantia
fundamental contra a possibilidade de qualquer imposição forçada de interesses
de grupos sobre o indivíduo associado, obrigando-o a permanecer associado
contra a sua vontade ou em flagrante situação de desvantagem.
É também um Direito Humano, reconhecido na Declaração
Universal dos Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário. Diz o art. 20,
II, do referido documento: "Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma
associação". É inegável que o pacto federativo forma uma associação
ou sociedade política chamada "União" (e, se ela não é uma associação política,
o que ela é então?), sendo aparentemente injustificável e destituída de
qualquer fundamento a declaração sobre a impossibilidade de desassociação das
entidades federadas que se associaram no momento do pacto. As unidades
federadas compõem, em conjunto, uma sociedade.
Um opositor da proposta poderia alegar que o caso
brasileiro é um exemplo histórico de "federalismo centrífugo" — isto é,
partimos de um estado unitário que se descentralizou formando um estado
federado — em contraposição a um "federalismo centrípeto", onde diversos estados
se unem para formar uma federação, e que o argumento da separação só teria
algum resquício de validade no último caso.
Acontece que esse momento de passagem de um estado unitário
para um estado federado é justamente o instante a partir do qual se reconhece
as entidades federadas enquanto partes legítimas de um pacto que está, naquela
hora, sendo constituído. Em outras palavras, o instante de formação da
federação, no caso brasileiro, foi o momento onde forçosamente teve que se
reconhecer que, na verdade, o todo era formado por partes, e que eram estas
partes que estavam legitimadas para pactuarem entre si o desenho institucional
de uma associação que as vincularia por tempo indeterminado. O todo não poderia
mais negar a existência das partes, e terminou por reconhecê-las.
O art. 4º da Constituição Federal também estabelece uma
série de parâmetros que orientam a conduta da República em suas relações
internacionais. Tais parâmetros foram adotados em virtude da sua
consensualmente reconhecida razoabilidade e respeito à dignidade humana. Entre
estes parâmetros, encontramos o respeito aos Direitos Humanos e,
principalmente, à autodeterminação dos
povos, além do princípio da não-intervenção. Embora a Constituição
reconheça que sejam eles parâmetros de orientação para suas relações
internacionais, a sua óbvia e indiscutível razoabilidade nos obriga a concluir
que os mesmos parâmetros são aplicáveis dentro de nossas fronteiras.
Se existe o direito à autodeterminação, claro está que seu
exercício se dá internamente no âmbito de cada país, sendo contraditório
afirmar que "o que vale da porteira para fora não vale da porteira para
dentro". O direito à autodeterminação dos povos compõe um Direito Humano
básicos, cujo objetivo é justamente
garantir a emancipação política e econômica de grupos nacionais que se formem
no interior dos estados.
Se é consenso que o referido direito existe, que seu exercício
se dá no âmbito interno de cada país, e que seu objetivo é justamente procurar
garantir a emancipação desses grupos nacionais que se formam, então inegável se
torna a legitimidade do seu pleno exercício no caso analisado.
A autodeterminação dos povos é um direito reconhecido no
Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, do qual o Brasil também é
signatário. Reza o art. 1º do referido Pacto:
I - Todos os povos têm direito à autodeterminação. Em
virtude desse direito, determinam livremente seu estatuto político e asseguram
livremente seu desenvolvimento econômico, social e cultural.
III - Os Estados Partes do presente Pacto, [...] deverão
promover o exercício do direito à autodeterminação e respeitar esse direito, em
conformidade com as disposições da Carta das Nações Unidas.
O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos deixa
claro que seus signatários têm o dever de promover o exercício do
direito à autodeterminação e respeitar esse direito.
Cabe aqui destacar que tanto a liberdade de associação quanto o direito à autodeterminação dos povos constituem a regra geral,
sendo a restrição do exercício destas liberdades humanas fundamentais
justamente a exceção à regra — o que transfere o ônus da justificação e da
argumentação para aqueles que querem restringi-las, e não para aqueles que
querem exercê-las.
Qualquer opositor da proposta separatista possui, portanto,
o ônus de ter que encarar com seriedade estes pontos, procurando fundamentar
muito bem as razões pelas quais o exercício destes dois direitos não se
aplicariam ao caso em tela.
As vantagens
percebidas pelos defensores da secessão
Uma primeira vantagem notada pelos defensores da secessão
(num sentido amplo, que contemple não somente São Paulo, mas outros estados
porventura também interessados em se separar), é a criação de um cenário onde diferentes experimentações poderiam ser
implementadas simultaneamente.
Atualmente, por exemplo, se quisermos colocar em teste um
ambiente de descriminalização do mercado de drogas, ou um ambiente de
descriminalização do porte civil de arma de fogo ou do aborto, tal teste só
seria possível se abarcasse o país inteiro, dado que a competência para
legislar sobre a matéria penal cabe à União.
O mesmo se daria em torno de qualquer matéria de
competência legislativa privativa da União. Em um cenário de fragmentação de
países, não seria necessário convencer politicamente todo um continente (como
é o caso da dimensão territorial do Brasil) para se colocar em prática
determinada política — e o melhor, a existência de várias experiências
ocorrendo ao mesmo tempo permitiria uma melhor comparação dos resultados de uma
e de outra medida adotada.
O que hoje é o Brasil se tornaria um grande laboratório com
diferentes experiências sendo levadas a cabo ao mesmo tempo, sendo seus
resultados analisados comparativamente. Hoje, o que temos é uma centralização
tamanha que faz toda e qualquer experimentação ser um jogo de "ou tudo ou
nada": quaisquer que sejam as políticas adotadas, elas vinculam indistintamente
todas as regiões do país, por mais diferentes que sejam.
A segunda vantagem é que a fragmentação diminui os custos envolvidos numa mudança
de contexto. Com a divisão do país em vários países menores e
independentes, torna-se mais fácil e econômica e socialmente menos custosa a
transferência de um contexto para outro.
Expliquemos: se um cidadão brasileiro de qualquer região do
país quiser viver hoje em um contexto de razoável liberdade econômica, e quiser
se mudar, por exemplo, para Singapura, Suíça ou Hong Kong, os custos econômicos
e sociais desta mudança são altíssimos: ele provavelmente conhece poucas ou
nenhuma pessoa desse novo lugar para o qual se mudará, os habitantes falam
outra língua, possuem hábitos muito diferentes, sua adaptação linguística e
cultural será muito difícil, e ele terá que deixar amigos, familiares e demais
pessoas queridas por ele, a uma distância muito longe, o que dificulta visitas
mais frequentes, além de ter que arcar com um alto custo da sua viagem, do
transporte da mudança etc.
A fragmentação do Brasil em vários países menores, com
contextos legais, tributários, políticos, sociais e econômicos radicalmente
distintos, facilitaria a transferência do indivíduo de uma região para outra
que seja de maior interesse dele, a um custo social e financeiro menor, sem ter
que abandonar amigos e parentes a milhares de quilômetros de distância, e sem
ter que se adaptar a um contexto cultural e linguístico muito distinto também.
Acompanhada da primeira vantagem citada acima, as pessoas
poderiam se mudar mais facilmente de uma região para outra, fazendo suas
escolhas com base nesta análise comparativa dos resultados das políticas
adotadas nas outras regiões. A
fragmentação do país seria um passo na direção da emancipação do indivíduo frente
ao seu contexto, enquanto que a união e a centralização o tornam refém do
mesmo.
Por fim, uma terceira vantagem da fragmentação é o estabelecimento de uma concorrência entre
governos por uma melhor qualidade de vida de seus cidadãos. Todo estado tem
o interesse de manter a sua população junto dele, evitando os problemas da
emigração. Em um cenário de fragmentação de países, em que exista a facilidade
de mudança de uma região para outras substancialmente diferentes, haveria
maiores incentivos para os estados perseguirem a criação de contextos cuja
qualidade de vida proporcionada fosse um fator de peso para a manutenção da sua
população dentro de sua circunscrição.
Repete-se aqui a lógica que encontramos nos livres
mercados: quanto maior a concorrência, melhor tende a ser a qualidade dos
serviços fornecidos. No final das contas é isso que impulsiona os defensores da
proposta separatista: fazer do Brasil um contexto que seja melhor para todos.
[1] Esse valor corresponde somente ao total de
tributos federais arrecadados no estado, o que inclui somente o Imposto sobre a
Renda de pessoas físicas e jurídicas, Imposto sobre Exportação, Imposto sobre
Importação, Imposto sobre Produtos Industrializados, Imposto sobre Operações
Financeiras, Imposto Territorial Rural, Cofins, CSLL, CPSSS, Cide-Combustíveis,
e Contribuição para o PIS/PASEP. Se fosse somado a este valor o total
arrecadado na forma de receita previdenciária, a soma seria de R$456 bilhões —
valor que geralmente é mobilizado em outros levantamentos que vemos por aí. Cf.
em www.receita.fazenda.gov.br/Historico/Arrecadacao/PorEstado/2013/default.htm