segunda-feira, 24 mar 2014
Em
dezembro de 2012, Shinzo Abe foi eleito primeiro-ministro do Japão com a
promessa de reanimar a economia japonesa, estagnada desde o estouro da bolha
imobiliária em 1990. Após 25 anos de
estagnação econômica, muitos japoneses receberam a "Abenomics" — o apelido
dado a essa "nova" matriz econômica — com uma mescla de ilusão e esperança.
A
receita do primeiro-ministro nipônico, especificada ainda em dezembro de 2012,
seduziu os analistas nacionais e estrangeiros: intensa expansão monetária,
aumento dos gastos públicos e reformas estruturais. Essas seriam as três
famosas flechas com as quais Abe dizia que iria acertar o alvo.
Keynesianos
e monetaristas imediatamente se mostraram deslumbrados: finalmente, o
helicóptero japonês entraria em pleno funcionamento, e seria utilizado para
financiar um ambicioso plano de obras públicas que faria renascer o crescimento
japonês.
Um
ano depois, essa bolha de otimismo ainda está longe de se traduzir em
fundamentos reais.
Comecemos
recordando em que consiste o Abenomics. Ao longo de 2013, o Banco Central do Japão
aumentou suas compras de títulos da dívida pública em 60%, ou seja, em 50
bilhões de euros (algo equivalente a todo o gasto público anual da
Espanha). Adicionalmente, para 2014, já
está prevista a compra de outros 50 bilhões, desta maneira duplicando a base
monetária japonesa em relação ao nível vigente em 2012.
No
que mais, também em 2013, os investimentos públicos vivenciaram seu maior
aumento desde o início da década de 1990 (em 11,3%),
elevando os gastos do governo ao nível mais alto de sua história e o déficit
orçamentário a um dos mais elevados (cerca de 9% do PIB).
Dito
de outra forma, é indubitável que o estado nipônico tenha desempenhado uma
influência notável ao longo de 2013 para tentar aditivar a atividade econômica
japonesa, se esforçando para aumentar a quantidade de dinheiro nas mãos de seus
cidadãos, seja por meio de expansões da base monetária, seja por meio de
aumentos nos gastos públicos e, consequentemente, nos déficits orçamentários
(cujo financiamento resulta em criação de dinheiro pelos bancos).
O
resultado sobre os preços dos ativos foram sentidos de maneira muito clara: o
índice Nikkei aumentou
mais de 50% em 2013, os preços dos imóveis (segundo o TSE Home
Price Index) subiram mais de 5% — o maior ritmo desde o estouro da
bolha imobiliária em 1990 —, e o iene se desvalorizou quase
20% em relação ao dólar.
Tudo
parecia preparado para que a economia japonesa decolasse ao longo de 2013: iene
barato para promover as exportações, expectativas exuberantes para a bolsa de
valores, o que podia proporcionar financiamento barato para as empresas fazerem
novos investimentos, e preços imobiliários crescentes para reanimar o moribundo
setor da construção civil.
No
entanto, o Japão, até o presente momento, segue tão estancado quanto antes: em
2013, o PIB cresceu apenas 1,5%, a mesma taxa obtida em 2012, quando ainda não havia a Abenomics. Mas a coisa piora: os dois últimos trimestres
de 2013 exibiram um crescimento
quase zero, chegando a ser inferior ao espanhol. Com efeito, o setor privado está em recessão
desde meados de 2013, e os únicos setores que estão indo bem são o da
construção civil (entorpecido pelas injeções monetárias e estímulos fiscais) e
o das exportações (entorpecido pela desvalorização do iene).
Um
problema adicional é que este aumento das exportações de modo algum constitui
um consolo para a economia japonesa: sim, é verdade que o setor exportador
registrou, em janeiro de 2014, receitas 9% maiores do que as do ano anterior;
porém, os custos para o setor importador dispararam 25% em decorrência da
desvalorização do iene, gerando o maior déficit comercial da
história do país (mais do que o dobro do recorde histórico anterior,
alcançado em dezembro de 2013).
Traduzindo:
é como se uma empresa aumentasse suas receitas, mas seus gastos disparassem
ainda mais, sobrepujando em muito as receitas.
Pode
ser que ainda seja cedo para se declarar o completo fracasso do Abenomics;
porém, desde já, os resultados alcançados até o momento não apenas são
decepcionantes, como estão muito aquém do prometido: o Japão segue obstinado em
não sanear seus grandes desequilíbrios financeiros (a bolha imobiliária da
década de 1980 gerou um hiperendividamento, e seu consequente calote
descapitalizou todo o conjunto da sociedade: pessoas, empresas a bancos) e
optou por continuar incorrendo nos mesmos erros.
Entre
1990 e 2012, a dívida pública do país aumentou 260%. Qual foi o glorioso resultado? Neste mesmo período, o PIB nominal caiu
0,2%. Após este retumbante fracasso, os
keynesianos nipônicos voltaram a demonstrar o mesmo entusiasmo com o Abenomics, o qual até agora só
consolidou as piores tendências: continuar postergando o reajuste à custa de
mais endividamento. Só que agora com um
agravante: destruindo o poder de compra da moeda.
Sempre
que os defensores do ativismo estatal e do intervencionismo começaram a repetir
o mesmo mantra de sempre — a saber, que o estado deve gastar mais, incorrer em
déficits e se endividar para estimular a economia —, relembre-os de que já existe
um tenebroso exemplo a este respeito: o Japão.
Ou, se quisermos um precedente menos oriental, há um outro ainda mais
fácil: a Argentina.
O
keynesianismo simplesmente não funciona, exceto para alguns poucos empresários
bem relacionados com o governo, tudo à custa do povo. No somatório final, o keynesianismo apenas
empobrece a sociedade, afogando-a em um oceano de dívida improdutiva.