segunda-feira, 22 fev 2016
Alguns
temas abordados por Ludwig von Mises ainda em suas primeiras obras, há quase
100 anos, se tornaram ainda mais intelectualmente instigantes hoje do que eram naquela
época, quando ainda estavam começando a ser discutidos.
Um
desses temas é a questão da redistribuição de riqueza. Mises, adepto do individualismo metodológico, sempre iniciava suas análises olhando para
o indivíduo, e não para amplos agregados econômicos. Na questão da redistribuição de renda, Mises diferenciou
os indivíduos que têm bens daqueles que não têm. Em específico, ele faz
uma distinção entre bens de capital e bens de consumo.
Bens
de capital são os fatores de produção; são os bens que produzem outros bens e que
também auxiliam os seres humanos em suas tarefas e, consequentemente, tornam o
trabalho humano mais produtivo. Já os
bens de consumo, como o próprio nome diz, são todos os itens para consumo final
— como alimentos, roupas, cadeiras, televisões —destinados a satisfazer as
necessidades humanas.
Bens
de consumo beneficiam amplamente apenas uma
pessoa de cada vez. Um indivíduo usufrui os benefícios trazidos por
uma determinada camiseta apenas enquanto ele a está vestindo.
Bens de capital — o maquinário que produz as camisetas — geram benefícios
para uma enxurrada de consumidores de uma só vez.
Por
que, então, ainda há essa fixação marxista em relação ao, por exemplo,
gerenciamento estatal de empresas geradoras de energia elétrica, quando se sabe
que seus consumidores têm apenas eletricidade? Mises observou que um
consumidor não precisa ser o dono das instalações para ter eletricidade.
Tendo
isso em mente, como o sentido convencional de distribuição de riqueza mudaria
se excluíssemos os bens de capital dessa questão? Por exemplo, nos EUA,
1% população é dona de 38% da riqueza, dados de 2001. (No Brasil, 1% é
dona de 13.3%).
Como ficaria essa distribuição de riqueza se os bens de capital forem
excluídos? O mais provável atualmente é que 95% da riqueza do 1% mais
rico da população esteja atualmente ligada aos direitos de propriedade sobre
esses bens de capital. Logo, a distribuição de riqueza entre os consumidores
é muito mais acirrada do que os acadêmicos imaginam. Todos têm acesso
a água corrente, telefones, comida e televisão. É isso que interessa para
um padrão de vida.
Mises
nos ajuda a perceber que a ideia de obter igualdade pela redistribuição de riqueza
nada mais é do que fantasia. Você não pode redistribuir bens de consumo;
como poderiam milhões de mulheres vestir o mesmo casaco de pele, as mesmas
jóias e regalias, ou os mesmos sapatos que estão no armário de Imelda Marcos? Como
poderiam milhões de homens ficar dentro da banheira de hidromassagem de Hugh Hefner? Um
pedaço de pão não pode ser repartido infinitamente por várias bocas.
Da
mesma maneira, você não pode fatiar um fogão em pedaços e dividir estas fatias
igualitariamente entre as pessoas — e ainda esperar que o fogão
funcione. Você tem de respeitar a integridade de todos os bens de capital
para que eles funcionem. Uma central elétrica teria de ser triturada em
átomos e repartida em pequenos envelopes para se obter uma distribuição
igualitária.
Por
sua natureza, bens de capital também não podem ser redistribuídos entre as pessoas de uma
forma que resulte em igualdade e maior riqueza. A redistribuição de
riqueza, se levada a sério, significa necessariamente a completa e absoluta
destruição de riqueza. Socialismo é niilismo, nada
mais do que a destruição de valores.
Os
comunistas nunca obtiveram êxito em distribuir riqueza igualitariamente.
Isso é inerente à natureza da riqueza. Como a riqueza não pode ser
subdivida entre as massas (somente a propriedade
da riqueza pode), eles confiscam a riqueza alheia para benefício da própria
camarilha. Todo o resto fica à míngua, morrendo de fome. É assim
que a integridade da riqueza faz impor a realidade quando confiscada. Os
socialistas não brigam para ser donos do ar; eles brigam para tomar o
controle desta estação de rádio, daquela impressora, deste automóvel,
ou daquele pedaço de carne estragada. A redistribuição de
riqueza é criminalidade pura e ela exige um grau ainda maior de criminalidade
após o confisco, como lobos brigando por uma carcaça ou rufiões eliminando seus
cúmplices.
E,
ainda assim, centenas de milhões de pessoas continuam acreditando que a
redistribuição de riqueza irá gerar ganhos pessoais. Quando um político
difunde por seu rebanho a ideia de "espalhar a riqueza para todos", o que os
eleitores imaginam? No mundo perfeito, eles entenderiam que a
riqueza deixaria de existir, mesmo que ela fosse confiscada e meticulosamente
redistribuída — e caso realmente entendessem assim, o político será
devidamente ridicularizado ainda em seus discursos. A diferença entre um
político populista ser venerado e ser chutado para fora do palanque em que
discursa está no eleitorado ser educado por essa pequena fatia de racionalidade
misesiana.
Mises
abordou a distinção entre bens de capital e bens de consumo no debate sobre
redistribuição; essa percepção é extremamente valiosa no atual mundo em que
vivemos. O debate sobre o cálculo econômico no mundo
socialista já acabou, mas a noção de que a riqueza pode ser redistribuída
e ainda continuar existindo não é amplamente reconhecida como uma
contradição. Espalhar coercivamente a riqueza para todos gera apenas a
sua destruição.
Redistribuição
de riqueza é uma expressão contraditória. Esse fato reduz em cinzas o
ímpeto do estado assistencialista. O estado de bem-estar social é um
rematado destruidor de riqueza.
O
capitalismo resulta em ampla propriedade dos meios de produção porque a
propriedade privada é a sua característica distintiva. Somente em uma
economia capitalista, em que os direitos de propriedade podem ser subdivididos
em ações e livremente comercializados, pode uma ampla propriedade sobre os bens
de capital manter inalterado seu caráter de riqueza. Nesse arranjo, as
pessoas voluntariamente vendem sua propriedade; os novos proprietários adquirem os
direitos de propriedade sobre os bens de capital. Há um genuíno
mecanismo capitalista permitindo que isso aconteça. Quase todo mundo
pode comprar ações dos meios de produção sob o capitalismo. Ninguém tem
de morrer. Nenhum sangue é derramado.
Onde
no socialismo pode você, ó nobre camponês, reivindicar sua fatia das escolas
públicas, dos Correios ou das prisões? Não existe um mecanismo similar
que permita a você ser dono da siderúrgica, da montadora, da mina, dos bancos e
dos parques que foram todos estatizados — e não sobra muito da mina ou da
siderúrgica após elas terem sido estatizadas.
Acabe
com os direitos de propriedade privada e toda a riqueza desaparece.
Voltamos à era da pilhagem de todos sobre todos e da privação mutuamente garantida.
É isso que os governos e todos os que odeiam o mercado realmente querem.
Um slogan honesto para um sistema de saúde pública universal seria "uma
nação, a mesma seringa".
Os
redistributivistas não acreditam na fantasia de que redistribuir riqueza traz
igualdade de resultados. Eles apenas querem que você acredite
nisso.