Passou a ser aceito pela maioria que os
porcos, que eram inequivocamente mais espertos do que os outros animais,
deveriam decidir todas as questões políticas da fazenda, embora suas decisões
tivessem de ser ratificadas pelo voto da maioria
Orwell, G. (1989 [1945]), A Revolução dos Bichos
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Jack, banqueiros realmente sabem o que fazem?
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O ponto de partida: o início da civilização
O
fundador da dinastia bancária dos Médici, Giovanni di Bicci de' Medici (1360—1429),
disse aos seus filhos em seu leito de morte: "Evitem ao máximo a atenção do
público".[1] Suas palavras levam à inevitável pergunta: Os
banqueiros realmente sabem a verdade sobre o moderno sistema monetário e
bancário?
Para
desenvolver uma resposta significativa para essa pergunta, na tradição da
Escola Austríaca de economia, é necessário começar bem do início, ou seja: com o processo de evolução da civilização.
Por
'processo de evolução da civilização' entende-se o desenvolvimento por meio do
qual o homem substitui seu estado de subsistência (isto é, uma existência
precária e violenta) pelo arranjo caracterizado pela divisão do trabalho e pela
especialização (isto é, cooperação pacífica e produtiva).
Em
sua obra magna Ação Humana
(1949), Ludwig von Mises (1881—1973) apresenta uma explicação praxeológica
para o processo de civilização, a
qual nos ajuda a entender o desenrolar de sua evolução.
Se, e na medida em que, pela divisão do trabalho obtém-se
maior produtividade do que a obtida pelo trabalho isolado, e se, e na medida em
que, o homem seja capaz de perceber este fato, a ação humana tende,
naturalmente, para a cooperação e para a associação; o homem torna-se um ser
social não por ter de sacrificar seus interesses em favor de um mítico Moloch,
a sociedade, mas sim porque pretende melhorar seu próprio bem-estar. A
experiência ensina que esta condição — maior produtividade alcançada pela
divisão do trabalho — se torna efetiva porque sua causa — a desigualdade
inata dos homens e a desigual distribuição geográfica dos fatores naturais de
produção — é real. É este fato que nos permite compreender o processo da
evolução social.
Para
Mises, dois fatores estão no cerne do processo de civilização: (1) É necessário
haver uma desigualdade de desejos e
habilidades entre as pessoas. Esta é uma
condição necessária para que as pessoas queiram buscar a cooperação entre si. (2) O homem tem de reconhecer que a divisão
do trabalho possibilita um aumento da produtividade. Sendo assim, Mises pressupõe — como condição
necessária — que haja um mínimo de
inteligência entre os seres humanos e uma propensão a utilizar essa
inteligência na vida prática.
O surgimento do dinheiro - a teoria de Carl
Menger para a origem do dinheiro
A
desigualdade de habilidade e desejos,
em conjunto com a pressuposição de um mínimo
de inteligência, leva as pessoas a incorrerem na divisão do trabalho e na
especialização. Isto, por sua vez, produz
a necessidade de transações interpessoais.
A
forma mais primitiva de uma economia de trocas é o escambo. Mas o escambo possui limitações. Por exemplo, sob o escambo, as oportunidades
de troca dependem da existência de uma coincidência de desejos
entre os agentes que praticam a troca. Cedo
ou tarde, as pessoas (pressupondo que haja um mínimo de inteligência)
perceberão que utilizar um meio de troca
indireto é economicamente benéfico.
Utilizar um meio de troca indireto aumenta as oportunidades de
transações, dado que a coincidência de desejos deixa de ser um pré-requisito
para viabilizar a transação.
O
meio de troca indireto que se torna universalmente aceito é chamado de
"dinheiro".
Em
seu livro Principles
of Economics (1871), Carl Menger (1840—1921) desenvolve a teoria
de que o dinheiro surge espontaneamente das atividades do mercado, que esse
dinheiro criado pelo livre mercado é uma mercadoria (metais preciosos, por
exemplo).
Posteriormente,
Mises demonstrou com o seu teorema da regressão que,
de fato, o dinheiro só pode ter surgido
dessa maneira, e por motivos praxeológicos: o dinheiro tem de ter surgido a
partir de um mercado; e ele tem de
ter sido antes utilizado como uma mercadoria.[2]
Estabelecimentos de armazenagem de dinheiro
O
dinheiro é um bem econômico como qualquer outro. Logo, ele será poupado e guardado, como qualquer outro.
As
pessoas irão demandar maneiras convenientes de portar e transacionar seu
dinheiro.
Dado
que os indivíduos inevitavelmente possuem preferências temporais
distintas entre si, haverá poupadores (aqueles que mantêm consigo uma
quantidade de dinheiro maior do que a que gastam em consumo) e investidores (aqueles
que demandam uma quantia de dinheiro maior do que possuem).
É
sob este arranjo que dois tipos de empreendimento voltados para o manuseio do
dinheiro surgem em um livre mercado: bancos voltados para depósitos (ou
armazenamento de dinheiro) e bancos voltados para empréstimos ou concessão de
crédito.
Bancos
voltados para depósitos oferecem serviços de custódia, proteção, transferência,
liquidação e compensação de dinheiro para seus clientes. Por exemplo, indivíduos que estejam portando
dinheiro metálico podem, por comodidade ou segurança, depositar este seu
dinheiro em um banco de depósito. Em
troca, eles recebem um certificado de depósito que poderá ser transacionado
como dinheiro. As pessoas que venderem
um bem ou serviço a estes depositantes receberão em troca estes certificados e,
com isso, poderão trocá-lo pelo dinheiro em espécie que está guardado no banco
de depósito.
Já
os bancos voltados para a concessão de empréstimos operam adquirindo poupança
genuína dos indivíduos. Eles emitem
títulos que rendem juros. Os poupadores
voluntariamente dão seu dinheiro em troca destes títulos que lhes pagarão uma
quantia maior no futuro. Durante este
período, o poupador não tem acesso ao dinheiro que emprestou.
A
taxa de juros de mercado será determinada pela oferta de dinheiro emprestado
pelos poupadores e pela demanda por esse dinheiro, de modo que a taxa de juros
de mercado irá refletir a taxa de
preferência temporal desta sociedade.
Em outras palavras, em um livre mercado, haverá de modo natural uma
profissão à qual chamaríamos de "banqueiros": alguns banqueiros irão trabalhar
no ramo da armazenagem de dinheiro (bancos de depósito) e outros irão trabalhar
no ramo da concessão de crédito (bancos de empréstimos).
Para
ficar claro: em um livre mercado, instituições voltadas para depósitos e
instituições voltadas para a concessão de crédito seriam entidades legalmente distintas e separadas. Há o banco
de depósito e há o banco de crédito.
O incentivo para a agressão
Em
um livre mercado, há apenas três maneiras de se adquirir propriedade (ou seja,
de forma não-agressora): pela apropriação original de propriedade sem dono (o
que na prática denota o princípio do "o primeiro a usar é o proprietário"),
pela produção e por contratos voluntários.
Na
realidade, no entanto, as coisas podem ser um tanto diferentes.
Franz
Oppenheimer afirmou que "Há duas maneiras fundamentalmente opostas pelas quais
um homem, necessitado de sustento, é impelido a obter os meios necessários para
satisfazer seus desejos. Estas são o
trabalho e o roubo: ou ele utiliza o próprio trabalho ou ele se apropria
forçosamente do trabalho de terceiros".[3]
A
lógica da ação humana nos diz que há
— e, com efeito, tem de haver — um
incentivo econômico para o indivíduo atacar a propriedade de terceiros. Duas intuições praxeológicas
interrelacionadas explicam isso.
Primeiro, sabemos com certeza que é
preferível satisfazer uma necessidade ou um desejo mais cedo do que mais tarde;
também sabemos com certeza que uma satisfação de desejos a um custo baixo é
preferível a uma satisfação de desejos a um custo alto. Em outras palavras, indivíduos tentam
alcançar seus objetivos com o mínimo de esforço possível e no mais curto
período de tempo.
Segundo, o processo rumo à civilização
não extirpa a propensão do homem à agressão.
É de se esperar que o indivíduo A irá atacar o indivíduo B sempre que
ele puder se dar bem — isto é, se os (esperados) benefícios para A oriundos da
agressão a B forem maiores do que os (esperados) custos em que ele terá de
incorrer ao praticar tal ação.
É
este incentivo econômico de cada indivíduo em atacar a propriedade de terceiros
que está no cerne do surgimento daquilo que é tipicamente chamado de "governo".
Um
governo pode ser entendido como um monopolista territorial da coerção: uma
agência que incorre em violações institucionalizadas dos direitos de
propriedade e na exploração — na forma de expropriação, tributação e regulação
— dos donos de propriedade privada.
Para
responder à pergunta "Os banqueiros realmente sabem a verdade sobre o moderno
sistema monetário e bancário?", é necessário analisarmos mais detidamente as
várias formas de governo.
Em
primeiro lugar, é possível fazer uma distinção entre governos com uma baixa
preferência temporal e governos com uma alta preferência temporal. Baixa preferência temporal significa estar
mais voltado para o longo prazo; alta preferência temporal significa ser mais
imediatista.
Em
um lado do espectro está, tomando emprestada a metáfora criminal de Mancur L.
Olson (1932—1998), o bandido itinerante.[4] O bandido itinerante representa uma forma de
governo que possui pouco interesse no
bem-estar da sociedade; e, como consequência, seu assalto tipicamente chega a
quase 100% da renda da sociedade.
O
bandido itinerante não tem de lidar com os danos que sua agressão causa à
sociedade (em termos de renda perdida). A preferência temporal do bandido itinerante
é, portanto, relativamente alta. Ele
extrai o máximo possível de suas vítimas, e não há praticamente nenhum
incentivo econômico para que ele restrinja seu roubo.
Do
outro lado do espectro está o bandido
estacionário. Assim como o bandido
itinerante, ele também detém o monopólio da coerção de suas vítimas. No entanto, o bandido estacionário possui um interesse mais abrangente no bem-estar
da sociedade. Ele deseja que suas
vítimas sejam produtivas e continuem trabalhando: quanto mais suas vítimas
produzirem, mas riqueza haverá para ser apropriada pelo bandido estacionário.
Analisando
mais atentamente o bandido estacionário, é possível fazer uma distinção entre
um governo em mãos privadas
(feudalismo/monarquia) e um governo em
mãos públicas (democracia).[5]
O
indivíduo que está no comando de um governo em mãos privadas tem o interesse de
maximizar o valor presente da renda
total que ele pode expropriar de seus governados. Um monarca, por exemplo, detém o monopólio da
expropriação de suas vítimas, e sua preferência temporal será, em decorrência
de seu abrangente interesse, relativamente baixa.
Em
contraposição, o interino que está no comando do governo em mãos públicas tem o
interesse de maximizar sua renda atual. Ele sabe que dali a alguns anos não mais
estará no poder. Sua preferência
temporal, portanto, será relativamente alta.
Um
governo em mãos públicas significa que a escolha do interino se dá pelo voto
majoritário. Uma maioria de pessoas
decide quem irá ser o administrador temporário do governo, que neste caso é uma
propriedade pública.
O
eleitor médio irá apoiar aqueles políticos que ele julga (correta ou
erroneamente) serem capazes de melhorar sua situação econômica. Um eleitor tem todos os incentivos econômicos
para agir desta maneira — sem se importar com o fato de que a renda que ele
irá obter desta forma advém da expropriação de seus concidadãos.
Já
o administrador temporário deste governo, que é propriedade pública, terá todos
os incentivos para tentar ganhar a maioria dos eleitores. Ele irá defender políticas de expropriação
dos produtores de alta renda (que normalmente são poucos) para redistribuir o
espólio para aquelas pessoas menos produtivas ou improdutivas (que normalmente são
muitos).
A
importante constatação aqui é a seguinte: a
propriedade pública do governo irá levar a uma contínua erosão do interesse da
maioria das pessoas em produzir riqueza para a sociedade. Em outras palavras, a preferência temporal da
sociedade irá aumentar.
O governo gera um sistema bancário
fraudulento
O
aumento da preferência temporal da sociedade é o principal fator que explica o
surgimento de práticas fraudulentas no sistema bancário, as quais são perfeitamente
resumidas pela adoção de um papel-moeda fiduciário de curso forçado.
Sabemos
que os interinos de um governo em mãos públicas desejam expropriar os recursos
do público em geral. Isso pode ser feito mais
convenientemente (1) obtendo-se o controle da produção de dinheiro, (2)
substituindo o dinheiro metálico por um dinheiro de papel, e (3) criando sempre
mais dinheiro por meio da expansão do crédito.
A
indústria bancária e os banqueiros são, portanto, aliados naturais do roubo
planejado pelo governo. Com efeito, os
banqueiros e aqueles que estão no governo irão, e de maneira muito lógica,
fazer um conluio para criar um sistema monetário baseado em um papel-moeda
puramente fiduciário e de criação totalmente monopolizada por eles.
Os
banqueiros percebem que irão auferir receitas adicionais se puderem criar
dinheiro digital por meio da expansão do crédito, processo esse em que dinheiro é criado do nada
ao se conceder empréstimos em um volume muito superior ao total de dinheiro
real que possuem em seus cofres. É assim
que funciona um sistema bancário de
reservas fracionárias.
Os
banqueiros sabem que esta prática de reservas fracionárias é um empreendimento
extremamente lucrativo. Sendo assim,
tanto os bancos de depósito quanto os bancos de crédito defenderão a fusão de ambas as atividades para um mesmo
banco. Ou seja, a mesma instituição
poderá, simultaneamente, aceitar depósitos e conceder empréstimos.
Os
administradores temporários de um governo em mãos públicas também são
totalmente a favor de um sistema bancário de reservas fracionárias. Afinal, sendo os primeiros a receber este
dinheiro recém-criado pelos bancos, o governo se torna capaz de obter recursos
sem ter produzido nada. Ao agir assim,
ele obtém algo em troca de nada. Ele
está retirando recursos escassos de toda a sociedade para benefício exclusivo
de sua burocracia. Trata-se de uma
expropriação.
Tendo
monopolizado a lei, será relativamente fácil para o governo declarar que a
prática de reservas fracionárias é legal.
No entanto, praticar reservas fracionárias é algo um tanto arriscado
para um banqueiro. Ele sabe que se o
público se tornar ciente desta sua prática — a qual nada mais é do que
falsificação de dinheiro —, pode ocorrer uma corrida bancária, o que tornaria
seu banco insolvente e forçaria sua liquidação.
Para
o governo, quebras bancárias também são totalmente indesejáveis. Além de gerarem severos problemas políticos e
econômicos, falências bancárias também — e isso é muito importante — colocam
em risco o acesso farto e barato ao dinheiro e ao crédito.
Sendo
assim, o governo irá, e com enorme apoio de todos os banqueiros, criar um banco central, o qual não
apenas permitirá, como também estimulará com grande afinco, que todos os bancos
inflacionem de maneira
harmoniosa e combinada a quantidade de dinheiro na economia.
Mesmo
após a criação de um banco central, o risco de uma corrida bancária ainda não é
totalmente eliminado. É necessário que o
banco central adquira o monopólio da produção de dinheiro.
É
por isso que, cedo ou tarde, o dinheiro metálico, lastreado em uma commodity
como ouro ou prata, será substituído por um dinheiro de papel inconversível
(sem nenhum lastro) e de curso forçado;
e este dinheiro de papel gozará de privilégios legais (como a obrigatoriedade
de se aceito por todos). Para este fim,
o governo legalizará a prática bancária de suspender a restituição, isto é, de
se recusarem a restituir certificados de depósito em ouro.
Ato contínuo, o governo se apropriará do ouro e os
cidadãos serão obrigados a utilizar apenas o papel, agora sem nenhum lastro;
sem nenhuma conversibilidade.
Corrupção coletiva
É
de se pensar: como o governo e os banqueiros fizeram isso e continuam fazendo
nada lhes acontece? Por que essa
fraudulenta extração de recursos da sociedade via inflação monetária não gera
protestos?
Seria
falta de conhecimento por parte daqueles que estão do lado perdedor deste
regime monetário baseado na falsificação de dinheiro? Ou será que os custos de se revoltar contra
um regime puramente fiduciário é proibitivamente alto do ponto de vista do
indivíduo?
Uma
resposta economicamente sensata — isto é, praxeológica — a esta pergunta pode
ser encontrada naquilo que chamo de "corrupção coletiva". Tão logo o governo passa a intervir nas
questões monetárias da sociedade, os indivíduos irão desenvolver, de forma
crescente, uma propensão a violar a propriedade de terceiros.
Ao
se aproveitar da ação coerciva do governo, um indivíduo se torna capaz de
colher os benefícios do ataque à propriedade de terceiros. Ao mesmo tempo, ele terá de lidar com apenas
uma fração do estrago que esta sua ação impõe à sociedade como um todo.
Ele
terá todos os incentivos para agir desta forma.
Afinal, caso não o faça, outros o farão.
E aí ele estaria do lado perdedor.
Ele teria de arcar com as perdas de qualquer oportunidade de violar a
propriedade de terceiros da qual abrisse mão.
Um
sistema monetário puramente fiduciário, tão logo seja adotado, levará a uma
corrupção coletiva na maior escala possível.
Como é bem sabido, o governo pode garantir seu apoio ao permitir que uma
determinada fatia do público usufrua livremente as receitas fraudulentamente
extraídas da sociedade como um todo. Por
exemplo, o governo irá oferecer empregos muito bem pagos a uma determinada
casta (e, em particular, irá subsidiar intelectuais e formadores de
opinião). Ele também irá premiar suas
empresas favoritas com contratos em licitações e contratos de fornecimento
exclusivo. Empreiteiras, em particular,
irão se dar muito bem. Outras pessoas
irão simplesmente receber subsídios diretos para ajudar em sua sobrevivência.
Com
a crescente distribuição de oferendas e benesses, um crescente número de
pessoas e empresas irão se tornar econômica e socialmente dependentes da
continuidade (ou até mesmo do crescimento) desta atividade governamental.
Sendo
assim, será natural que a resistência contra novas expansões do governo e do
sistema monetário fiduciário — algo que necessariamente significa mais
violações dos direitos de propriedade do indivíduo — diminua.
Obviamente,
os banqueiros possuem um papel extremamente importante na difusão desta
corrupção coletiva. Basta dizer que um crescente
número de pessoas terá de investir toda a sua poupança em depósitos e títulos
bancários definidos em moeda fiduciária.
Afinal, não há outra opção. Ou
elas fazem isso, ou toda a sua poupança será dizimada pela inflação.
Mais
cedo ou mais tarde, as pessoas irão desenvolver um grande interesse em apoiar a
existência de um governo e em defender o sistema monetário fiduciário vigente
— utilizando quaisquer meios que julgarem necessários.
Tudo irá terminar em hiperinflação
A
corrupção coletiva, tão logo se torna suficientemente dispersa, levará à
hiperinflação — isto é, a um aumento acelerado na quantidade de dinheiro na
economia, o que levará à erosão, ou até mesmo à total destruição, do poder de
compra do dinheiro fiduciário.
É
claro que os banqueiros e aqueles que estão no governo têm interesse em evitar
a hiperinflação. Eles preferem um tipo
de inflação que passe basicamente despercebido, uma forma de inflação que não
fugirá do controle.
No
entanto, tão logo a corrupção coletiva se torna difundida e o setor bancário e
financeiro se torna amplamente importante em termos de financiamento do governo
e de servir como um importante repositório de toda a poupança dos indivíduos, o
fiel da balança já foi girado para o lado hiperinflação.
Pela
praxeologia, podemos saber com certeza que uma expansão monetária irá terminar em depressão. Também sabemos que esforços
para se evitar uma depressão por meio do aumento da quantidade de dinheiro irá
apenas postergar o dia do acerto final, o que aumentará ainda mais os custos da
depressão no futuro.
Como
irá a maioria das pessoas reagir a uma iminente depressão? Se eles nutrirem a esperança de que estarão
entre os primeiros recebedores do dinheiro recém-criado (o que na realidade é o
que ocorre tão logo a corrupção coletiva se torna suficientemente dispersa),
então a resposta parece óbvia. A maioria
terá a esperança de que irá se beneficiar da impressora monetária eletrônica, e
irá preferir que a impressora eletrônica continue trabalhando a deixar que o
governo e os bancos deem o calote e vão à falência. Sob tal estrutura de incentivos, o sistema
monetário fiduciário acabaria em hiperinflação.
Conclusão
À
luz de tudo o que foi dito acima, podemos concluir que: (1) Se e quanto o
formato de governo em mãos públicas for adotado, o dinheiro metálico — aquele
lastreado em uma commodity — será substituído por um dinheiro de papel
fiduciário e de curso forçado. (2) O dinheiro fiduciário leva a uma corrupção
coletiva em grande escala. E (3), tão
logo a corrupção coletiva se torna suficientemente dispersa, o regime monetário
fiduciário será destruído pela hiperinflação.
De
tudo isso, conclui-se que, tão logo um sistema monetário fiduciário seja
adotado, bancos e banqueiros irão inevitavelmente se juntar — alguns
voluntariamente e cientes de tudo; outros, sem maior ciência — àquele vasto
empreendimento criminoso que é o estado.
Sendo
seres humanos, banqueiros têm interesses próprios, como todos nós. Logo, é de se imaginar que eles saibam
bastante sobre o real funcionamento do sistema monetário e bancário. À luz do sombrio histórico monetário pelo
qual já passou o mundo, tal conclusão também ajuda muito a explicar as últimas
de Giovanni di Bicci de' Medici para seus filhos: "Evitem ao máximo a atenção
do público".
[1] Parks, T. (2006), Medici
Money, Banking, Metaphysics and Art in Fifteenth-Century Florence, Profile
Books Ltd, London,
p. 3.
[2] Ver
Mises, L. v. (1996), Ação Humana, Cap. XVII, sec.4; Mises, L. v. (1953), The
Theory of Money and Credit, pp. 97 – 123.
[3] Oppenheimer, F. (1922), The
State, p. 24.
[4] Ver Olson, M. (2000), Power
and Prosperity, Outgrowing Communist and Capitalist Dictatorships, Basic Books,
esp. pp. 1 – 24.
[5] Neste
contexto, ver Hoppe, H.-H., Democracia - o deus que
falhou, Por que a
monarquia é superior à democracia, As elites naturais, os
intelectuais, e o estado