Não
são poucas as pessoas que nos escrevem pedindo comentários e explicações sobre
a supostamente baixa taxa de desemprego no Brasil. De fato, um estrangeiro mais desinformado que olhe para os números brasileiros irá se sentir tentado a
arrumar suas malas, vender sua casa europeia e vir voando com toda a família para o Brasil.
Quando
me perguntam minha opinião sobre a taxa de desemprego no Brasil, apenas
respondo: qual taxa? A do IBGE ou a do
DIEESE? A do DIEESE é simplesmente o dobro da do IBGE. Enquanto o IBGE fala que a taxa de desemprego
de outubro foi de 5,3%, o DIEESE afirma que foi de 10,5%. Dois indicadores iguais, uma margem de erro
de incríveis 100%. E as implicações
disso são enormes. Ao passo que uma taxa
de desemprego de 5,3% é menor que a de todos os países europeus (exceto Suíça e
Áustria), norte-americanos, asiáticos e da Oceania, uma taxa de 10,5% só é
inferior à francesa, portuguesa, irlandesa, grega e espanhola. Ou seja: o mesmo país, o mesmo indicador,
duas realidades totalmente opostas.
Desde
que comecei a prestar mais atenção no assunto — e, principalmente, desde que
me inteirei melhor da metodologia —, perdi completamente o interesse pelo
indicador. Ele não indica nada. A metodologia do IBGE é totalmente
ridícula. Um malabarista de semáforo é
considerado empregado. Um sujeito que
vende bala no semáforo também está empregadíssimo. Um sujeito que lavou o carro do vizinho na
semana passada em troca de um favor é considerado empregado (ele entra na
rubrica de 'trabalhador não remunerado').
Se um sujeito estava procurando emprego há 6 meses, não encontrou nada e
desistiu temporariamente da procura, ele não está empregado mas também não é
considerado desempregado. Ele é um
"desalentado". Como
não entra na conta dos desempregados, ele não eleva o índice de desemprego.
Além
disso, o índice também coloca na rubrica 'empregado' todas aquelas pessoas que
exercem trabalhos considerados precários, como o sujeito que trabalha poucas
horas por semana e gostaria de trabalhar mais, mas não consegue (muito
provavelmente por causa das regulamentações trabalhistas), e o sujeito que faz
vários bicos, mas cujo rendimento mensal é menor que o salário mínimo. Ou seja, você substitui seu vizinho na
barraca de pipoca dele por três dias. Em
troca, ele lhe dá R$250. Você foi
considerado pelo IBGE como estando empregado — tendo efetivamente trabalhado 3
dias no mês.
Com
todos esses truques, não é de se estranhar que o Brasil esteja com "pleno
emprego", mesmo com sua arcaica legislação trabalhista, sua escandinava carga
tributária e seus espoliadores encargos sociais e trabalhistas.
Mas
isso, sejamos francos, não é uma exclusividade brasileira, não. O governo americano, por exemplo, também
divulga 2 índices, cada um com uma metodologia diferente. Obviamente, ele se pauta apenas por aquele
que fornece o mais róseo resultado. Uma
fonte privada complementa fornecendo o terceiro índice, bem mais rigoroso. Veja abaixo:

Na
Europa, a coisa é ainda mais discrepante.
Alguém realmente acredita que o real desemprego na França e em Portugal
é a metade do espanhol? A impressão que tenho
é que a Espanha é o único país que de fato adota uma metodologia mais rigorosa.
Indo para os finalmentes
Felizmente,
o IBGE disponibiliza em seu site todos os dados coletados desde março de 2002,
possibilitando que uma pessoa mais interessada em fatos e menos em ideologias
possa analisar um pouco melhor a realidade do país. A tabela divulgada para o mês de outubro está
aqui. Veja lá todas as categorias que mencionei
acima: Pessoas Desalentadas, Pessoas Subocupadas por Insuficiência de Horas
Trabalhadas, Pessoas Ocupadas com Rendimento/Hora menor que o Salário Mínimo/Hora,
Pessoas Marginalmente Ligadas à PEA (População Economicamente Ativa).
Em
termos práticos, na atual metodologia, se um gerente de banco é demitido e
passa a fazer malabarismo no semáforo, a taxa de desemprego não se altera. Se um desempregado lava o carro do vizinho em
troca de um favor, a taxa de desemprego cai.
O
leitor interessado pode baixar aqui
uma enorme planilha de Excel com os valores de todas essas variáveis coletadas
desde março de 2002. Eu fiz isso e
calculei uma taxa de desemprego mais realista.
Coletei
os seguintes dados:
1)
pessoas desocupadas;
2)
trabalhadores não remunerados;
3)
pessoas com rendimento/hora menor que o salário mínimo/hora (aquele sujeito que
faz vários bicos, mas cujo rendimento mensal é menor que o salário mínimo);
4)
pessoas marginalmente ligadas à PEA (pessoas que não estavam trabalhando na
semana da pesquisa mas que trabalharam em algum momento dos 358 dias anteriores
à pesquisa e que estavam dispostas a trabalhar); e
5)
pessoas desalentadas.
De
canja para o governo, deixei de fora as pessoas subocupadas, pois uma pessoa
que trabalha regularmente um determinado número de horas por semana não está
tecnicamente desempregada.
Somei
estes cinco itens e dividi pela soma entre população economicamente ativa, pessoas marginalmente ligadas à PEA e pessoas desalentadas. (Estas duas últimas também não entram no denominador do cálculo do IBGE porque não são consideradas economicamente ativas pelo IBGE, o que é um despropósito.)
Logo,
a real taxa de desemprego brasileiro é essa abaixo:

Portanto,
a real taxa de desemprego no Brasil em outubro foi de 20,8%. Nada surpreendente quando levamos em conta nossa legislação trabalhista e tributária. Encargos sociais e trabalhistas onerosos em conjunto com uma paquidérmica carga tributária sobre as empresas não poderiam permitir outro resultado senão esse. Um quinto da população sem emprego fixo após três anos de economia "pujante", segundo o animador de circo que habita o Ministério da Fazenda.
Observe o efeito da expansão artificial do crédito criada pelo Banco Central em conjunto
com o sistema bancário de reservas fracionárias a partir de meados de
2009. Sem que nenhuma alteração na
estrutura da economia brasileira houvesse sido feita, a taxa de desemprego caiu
para o historicamente baixo nível de 20%.
Por isso ela é insustentável: ela é totalmente guiada pela expansão do
crédito, um mecanismo de
curto prazo.
A
economia, como foi previsto neste site ainda no segundo semestre do ano passado, já está parada. O desemprego, como em todos os outros países,
tende a ser a última variável a ser afetada.