Uma forte
recessão vem castigando a Europa e os EUA há anos. Para piorar, tudo indica que a China entrou
no radar. O setor industrial chinês, que
abrange uma substancial fatia da economia chinesa — uma fatia muito maior do
que a de todas as economias desenvolvidas (85% da economia americana, por
exemplo, é formada pelo setor de serviços) — vem apresentando inequívocos
sinais de estagnação.
Produtos
estão se amontoando nos portos. Os
estoques não param de crescer. Os
consumidores reduziram o apetite. É o
que relata o The New York Times.
Após três décadas de crescimento vertiginoso, a
China está se deparando com um problema até então inédito em sua recém-enfraquecida
economia: um acúmulo imenso de bens não vendidos que está abarrotando lojas, entupindo
concessionárias de automóveis e enchendo os depósitos das fábricas.
O excesso de tudo, desde aço e utensílios
domésticos até carros e apartamentos, está atrapalhando os esforços da China
para sair de uma desaceleração econômica acentuada. Também está produzindo uma
série de guerras de preços e tem levado os fabricantes a redobrarem os esforços
para exportar o que não conseguem vender no país.
A seriedade do excesso de estoques na China tem sido mascarada cuidadosamente
pela manipulação dos dados econômicos por parte do governo chinês — tudo parte
de um esforço para estimular a confiança na economia entre os empresários e os
investidores.
A
principal pesquisa feita por agências não governamentais afirma que os estoques
estão crescendo a um ritmo nunca visto desde que a pesquisa passou a ser
realizada, em abril de 2004. Esta
aceleração no crescimento dos estoques vem ocorrendo desde maio. As vendas estão em queda.
"Por todo o setor manufatureiro que
pesquisamos, as pessoas esperavam mais vendas durante o verão (no hemisfério
Norte) e elas não aconteceram", disse Anne Stevenson-Yang, diretora de pesquisa
da J Capital Research, uma empresa de análise econômica em Hong Kong. Com os
estoques extremamente altos e as fábricas agora cortando a produção, ela
acrescentou, "as coisas estão meio que parando".
A reação
dos fabricantes tem sido racional: cortar preços. Tentar reduzir ao máximo os estoques. Mas isso não está acontecendo a um ritmo
rápido o bastante.
Tudo está
se estagnando: exportações, importações, emprego, demanda por
matérias-primas. Até mesmo o setor
imobiliário começou a vivenciar uma queda de preços. [Já prevista, em ordem cronológica, aqui, aqui e aqui].
A China é a segunda maior economia do mundo e
tem sido o maior motor de crescimento econômico desde o início da crise
financeira global em 2008. A fraqueza econômica significa que a China
provavelmente comprará menos bens e serviços do exterior em um momento em que a
crise da dívida soberana na Europa já está prejudicando a demanda, aumentando a
perspectiva de excedente global de bens, queda de preços e fraca produção por
todo o mundo.
O crescimento das exportações chinesas, um esteio da economia nas últimas três
décadas, desacelerou até quase parar. As importações também pararam de crescer,
em particular para matérias-primas como minério de ferro para a produção de
aço, enquanto os industriais perdem a confiança de que conseguirão vender se
mantiverem suas fábricas funcionando. Os preços dos imóveis caíram
acentuadamente, apesar de haver indícios de que chegaram ao ponto mais baixo em
julho, e o dinheiro tem deixado o país por vários canais legais e ilegais.
Algumas
empresas estão relatando declínios de 30 a 50% em suas vendas. Isso não é nada insignificante. Várias empresas estão falindo.
Os donos de empresas que produzem ou distribuem
produtos tão diversos quanto desumidificadores, tubos plásticos para sistemas
de ventilação, painéis solares, roupa de cama e vigas de aço para teto falso,
disseram que as vendas caíram ao longo do último ano e exibem pouco sinal de
recuperação, enquanto os bens não vendidos acumulam.
"As vendas caíram 50% em relação ao ano passado e o estoque está elevado",
disse To Liangjian, proprietário de uma empresa atacadista que distribui
molduras de foto e xícaras.
Alguns
empreendedores parecem não entender a mensagem.
Um gerente de uma empresa atacadista de pias e torneiras disse que suas
vendas caíram 30% no ano passado e que tem acumulado mercadoria excedente, mas
seu fornecedor continua produzindo em ritmo acelerado e aumentando seus
estoques. "O estoque do meu fornecedor é
imenso porque ele não pode reduzir a produção — ele não quer perder vendas
quando a demanda voltar". Este
fornecedor está brincando com a sorte. A
menos que a economia se recupere rapidamente, ele vai ficar sem dinheiro.
Os estoques de automóveis não vendidos estão
inchando nas concessionárias por todo o país. Problemas de qualidade estão
surgindo. E os problemas da indústria chinesa mostram todos os sinais de
estarem piorando, não melhorando. Foram abertas tantas fábricas de automóveis
na China nos últimos dois anos que o setor está operando a apenas cerca de 65%
de sua capacidade — bem abaixo dos 80% geralmente necessários para
lucratividade.
Mas tantas novas fábricas estão sendo
construídas que, segundo a Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma
chinesa, a capacidade manufatureira do setor automotivo do país está a caminho
de voltar novamente a crescer, nos próximos três anos, em uma quantidade igual
a todas as fábricas de automóveis do Japão, ou quase todas as fábricas de
automóveis nos Estados Unidos.
Os níveis
dos estoques estão subindo rapidamente.
Os fabricantes, em grande medida, têm se
recusado a reduzir a produção e estão pressionando as concessionárias a
aceitarem a entrega de automóveis segundo seus acordos de franquia, apesar de
muitas concessionárias estarem com dificuldades para encontrar lugares para
estacioná-los em seus pátios abarrotados ou para encontrar formas de financiar
seus estoques crescentes.
Qual foi
a reação do governo? Suspender a
divulgação de dados sobre a queda no licenciamento de automóveis.
Minha
avaliação: os exportadores chineses começarão a reduzir seus preços para aliviar
seus estoques. Tal prática irá se tornar
cada vez mais agressiva. Países que têm
livre comércio com a China podem se beneficiar disso em termos de inflação de
preços. Itens fabricados na China, como
vestuário, podem ficar mais baratos. As
indústrias destes países terão ainda mais dificuldades para concorrer com a
China. Mas o setor varejista irá se
beneficiar. Os consumidores irão se
beneficiar. Este fenômeno chinês irá
ajudar a manter os índices de inflação de preços mundiais marginalmente menores
do que seriam em outros contextos.
A
recessão global tende a piorar nos próximos meses. A concorrência de preços praticada pela China
irá ajudar os consumidores a navegar por essa recessão. Mas essa concorrência irá afetar uma pequena parcela do setor industrial da
maioria dos países ocidentais. Os
efeitos sobre a maioria dos trabalhadores do setor industrial será periférico.
Aqueles
investidores mais prescientes que ficaram vendidos na China
irão ganhar muito dinheiro.
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