quinta-feira, 27 out 2011
Os
pacotes de socorro ao sistema financeiro mundial — o qual, após incorrer em
práticas insensatas de expansão de crédito estimuladas pelos seus respectivos governos e
bancos centrais, foi socorrido justamente por eles — em conjunto com um quadro de recessão aguda que vai se
prolongando ao redor do mundo — recessão essa causada justamente por políticas
governamentais — se combinaram para gerar um fenômeno semelhante ao colapso de
uma enorme represa, desencadeando uma torrente não de água mas sim de ódio:
ódio ao capitalismo e aos seus mais visíveis e valorosos representantes — as
grandes empresas e os grandes empreendedores.
Grandes
empresas e sua "ganância epidêmica" por lucros estão sendo responsabilizadas
pela causa do colapso. Uma turba ignara
de jornalistas e manifestantes doidivanas — que não sabem ao certo o que
querem —, armados com câmeras, microfones e toda uma infinidade de guarnições
da mais moderna tecnologia, em vez de se dedicarem ao tricô, estão salivando
para ver grandes empresas e grandes empreendedores sendo capturados e demolidos
em público, exatamente como faziam as multidões da Revolução Francesa que
queriam ver os odiados aristocratas sendo levados para a guilhotina.
O
que está ocorrendo atualmente ao redor do mundo não pode ser entendido sem se
levar em conta a profunda ignorância que domina os intelectuais da atualidade
no que diz respeito à natureza e ao funcionamento do capitalismo e da busca por
lucros. Não obstante o colapso mundial
do socialismo e o inegável e visível sucesso do capitalismo, grande parte do
mundo intelectual apresenta uma predisposição ao socialismo e uma oposição ao
capitalismo como raramente já se viu.
A
grande maioria dos intelectuais de hoje — desde comentaristas de jornais e
televisão até professores universitários, incluindo-se aí a maioria dos
professores de economia, para não mencionar políticos e seus apologistas —
considera o fracasso do socialismo e o sucesso do capitalismo como meros "fatos brutos", isto é, fatos
sem bases inteligíveis, fatos que desafiam e contradizem toda a
compreensão. Se quisessem realmente
pensar de maneira racional, tais pessoas teriam de ler e estudar as obras de
Ludwig von Mises e dos outros proeminentes teóricos da Escola Austríaca de
pensamento econômico, bem como também da Escola Britânica clássica. Mas isso eles não irão fazer.
Como
resultado dessa fundamental incapacidade intelectual e moral da parte deles, e
de acordo com tudo em que eles ainda acreditam, o socialismo, com sua suposta
preocupação para com o bem-estar de todos e sua suposta racionalidade de
planejamento, deveria ter prosperado e prevalecido, ao passo que o capitalismo,
com sua preocupação exclusiva com o lucro individual e sua suposta 'anarquia no
sistema de produção', é quem deveria ter fracassado. Na mente dos intelectuais da atualidade, o fato de ter ocorrido o
resultado oposto no mundo real é algo que deve colocar em dúvida a confiabilidade
da própria razão em si — postura essa que, creio eu, ajuda enormemente a
explicar a ascensão de um ostensivamente declarado irracionalismo nas últimas
décadas, cujo melhor exemplo são os ataques à ciência e à tecnologia oriundos
do movimento ambientalista.
Os
intelectuais se agarram aos eventos da atualidade porque tais eventos parecem
oferecer um alento para o desmoronamento do seu universo intelectual. Eles acreditam, pelo menos por enquanto,
estarem mais uma vez na posição de professar ao mundo que seus conceitos sobre
o capitalismo foram
confirmados pela realidade.
Não
será o objetivo deste artigo explicar as reais causas do atual cenário
econômico, como a criação de dinheiro fiduciário, a expansão artificial do
crédito e a manipulação dos juros, tudo isso realizado integralmente pelos
bancos centrais mundiais, que nada mais são do que órgãos estatais. Tal tarefa já foi proficuamente apresentada
em outros artigos deste
site. O objetivo aqui será o de
apresentar uma contra-argumentação aos aspectos relevantes dessa ignorância
anticapitalista dos intelectuais da atualidade, demonstrando como toda a
população se beneficia justamente daquilo que os intelectuais mais atacam: o
interesse próprio e a busca pelo lucro dos capitalistas.
A busca pelo lucro é a base de todas as
melhorias econômicas
O
que os intelectuais e sua hostilidade ao lucro ignoram é que a busca pelo lucro
em um livre mercado é exatamente a fonte de virtualmente todas as melhorias
econômicas de uma sociedade.
Em
um livre mercado, todo e qualquer indivíduo tem a liberdade de empreender e
consumir sem ser tolhido por decretos, regulamentações e burocracias. Sua liberdade deve ser plena, desde que, em
suas atividades, ele não agrida a propriedade, a vida e a liberdade de
terceiros. Ele é livre para não sofrer
coerção e força física, mas também é proibido de adquirir a propriedade de
terceiros por meios desonestos, inclusive por meio da fraude. Tudo que um
indivíduo receber de outros deve ser por meio da escolha voluntária destes.
Se
tais condições não são respeitadas, e alguns indivíduos conseguem ganhar à
custa de todos os outros por meio de força, fraude, coerção, tributação ou
regulamentações, então tal situação representa uma falha de governo, não do
livre mercado. O fracasso do governo
está precisamente no fato de ter feito com que os indivíduos que participam do
mercado fossem submetidos a tais tipos de agressão.
Em
um livre mercado, a maneira de um indivíduo obter dinheiro de terceiros é ofertando algo que eles julgam ser valioso e que desejam possuir. Esses são os tipos de bens e serviços que um
indivíduo busca produzir e vender em um livre mercado: bens e serviços valiosos para os
consumidores. Desta maneira, a busca
pelo lucro é a base de um contínuo processo de inovação, no qual são
constantemente introduzidos novos e melhores produtos e novos e menos custosos
métodos de produção. O desenvolvimento
de novos e melhores produtos que as pessoas desejam comprar, e o aprimoramento
de mais eficientes e menos custosos métodos de produção daqueles produtos que
já existem e que as pessoas continuam querendo comprar, são as principais
formas de um empreendedor obter lucros em um livre mercado.
Tão
ignorado quanto isso pelos intelectuais de hoje é o fato de que a esmagadora
maioria dos lucros obtidos em uma economia livre é poupada e reinvestida, e que
a acumulação de qualquer fortuna em uma economia livre é o resultado da
introdução de toda uma série de aprimoramentos nos bens e serviços adquiridos
voluntariamente pelos consumidores. E a
maneira de se criar os meios para produzir esses aprimoramentos é reinvestindo
justamente a quase totalidade dos lucros obtidos. É por meio desse processo que o público geral
se beneficia da riqueza dos capitalistas.
Assim,
para utilizar um exemplo clássico, Henry Ford, que começou com um capital de
aproximadamente US$ 25.000 em 1903 e terminou com um capital de aproximadamente
US$ 1 bilhão à época de sua morte em 1946, foi responsável pela maior parte do
tremendo progresso ocorrido nos automóveis produzidos ao longo desse período,
bem como na eficiência com que eles passaram a ser produzidos. Foi amplamente graças a ele que os automóveis
de 1946 eram incrivelmente superiores àqueles produzidos em 1903. Mais ainda: foi graças a ele — que
reinvestiu quase todo o seu lucro para aprimorar o processo de produção — que
os automóveis apresentaram uma espetacular redução real de custo, indo de um
preço hoje comparável ao de um iate para um preço que praticamente qualquer
pessoa podia bancar. Ou seja, à medida que sua fortuna ia crescendo, Ford ia reinvestido-a exatamente na expansão da produção
destes automóveis aprimorados. Em outras
palavras, o outro lado da moeda da crescente fortuna de Ford foi o crescente
beneficiamento do público em geral.
Um
exemplo mais recente e igualmente óbvio destes mesmos princípios é o caso da
Intel. No início da década de 1980, a
Intel estava na vanguarda da produção daquilo que, à época, era o mais avançado
chip para uso em computadores pessoais: o 8086. No entanto, a concorrência entrou no mercado
e não permitiu que os altos lucros obtidos pela Intel com a comercialização
deste chip durassem muito tempo. Para
continuar à frente da concorrência e obtendo uma alta taxa de lucro na
indústria de computadores, foi necessário que a Intel introduzisse o amplamente
aprimorado chip 80286. E então a mesma história se repetiu. Para continuar obtendo uma alta taxa de lucro
frente à concorrência, que estava sempre em seus calcanhares, a Intel teve de
desenvolver e introduzir o 80386,
e depois o 80486 e então
sucessivas gerações do chamado chip Pentium.
A
Intel foi capaz de fazer uma fortuna durante todo este processo. Sua fortuna foi investida exatamente na
produção dos radicalmente aprimorados chips que atualmente são produzidos a uma
fração do custo dos chips de uma década ou duas atrás. (Obviamente, os lucros obtidos com qualquer
tipo de aprimoramento podem ser também investidos na expansão da produção de
outros produtos completamente diferentes).
Tais
exemplos não são isolados. O princípio
que eles ilustram funcionam universalmente, e mostram a importância de se ter
um livre mercado, sem regulamentações e sem a tributação do lucro.
As
fortunas empresariais, em um livre mercado, são acumuladas por meio dos altos
lucros gerados pela introdução de novos e aperfeiçoados produtos e também pela
introdução de métodos de produção mais eficientes e menos custosos. Estes altos lucros são seguidamente poupados
e reinvestidos justamente para ampliar e melhorar a produção destes mesmos
produtos ou até mesmo de produtos distintos.
Por exemplo, a fortuna de $6 bilhões do falecido Steve Jobs foi
construída em decorrência de Jobs ter feito com que fosse possível que a Apple
Computer introduzisse novos e aperfeiçoados produtos, como o iPod, o iPhone e o
iPad, e então poupasse e reinvestisse uma expressiva fatia dos lucros que
vieram pra ele.
Isso
é algo que vale a pena ser repetido e enfatizado: as fortunas que são
acumuladas desta forma são normalmente direcionadas à produção em larga escala
justamente dos produtos que forneceram os lucros utilizados para acumular esta
fortuna. Assim, por exemplo, os bilhões
de dólares de Jobs serviram em grande parte para aprimorar a invenção e a
produção de produtos da Apple.
Similarmente, a grande fortuna pessoal do velho Henry Ford — adquirida
em decorrência da introdução de grandes aprimoramentos na eficiência da
produção automotiva, o que fez com que o preço de um automóvel novo caísse de
US$ 10.000 no início do século XX para US$ 300 em meados da década de 1920 —
foi utilizada para tornar possível a produção em larga escala de milhões de
automóveis Ford.
Adicionalmente,
as altas taxas de lucro adquiridas com produtos novos e aprimorados e com
métodos de produção mais eficientes são meramente temporárias. Assim que a produção de um novo produto ou o
uso de um novo método de produção mais eficiente se torna padrão em uma
indústria, ele deixa de gerar lucros excepcionais. Com efeito, novos e contínuos aprimoramentos
fazem com que os aprimoramentos anteriores tornem-se completamente não-rentáveis. Por exemplo, a primeira geração do iPhone,
que era altamente lucrativa há apenas alguns anos, já deixou de ser ou
rapidamente deixará de ser lucrativa, pois novos avanços a deixaram obsoleta.
Como
resultado, a acumulação de grandes fortunas empreendedoriais requer a
introdução de uma série de
aprimoramentos nos produtos criados ou nos métodos de produção utilizados. Isto é um pré-requisito para se manter uma
alta taxa de lucro frente à concorrência em um livre mercado. A capacidade da Intel de manter sua alta taxa
de lucro ao longo de vários anos dependia completamente de sua capacidade de
introduzir melhorias sequenciais em seus chips de computador. O efeito líquido desse processo foi o de
fazer com que os usuários de computadores se beneficiassem de contínuas
melhorias e avanços tecnológicos; e não apenas não houve nenhum custo adicional, como
na verdade ocorreu um drástico declínio nos preços destes chips. Enquanto os altos lucros se basearem na
redução dos custos de produção, a concorrência fará com que os preços dos
produtos sejam reduzidos correspondentemente à redução dos custos de produção,
o que obrigará as empresas a descobrirem novos métodos de reduzir ainda mais
seus custos para manter seus altos lucros.
O
mesmo resultado, é claro, é válido não somente para a Intel e seus
microprocessadores, mas também para o resto da indústria da computação, na qual
gigabytes de memória e terabytes de capacidade de armazenamento de disco rígido
hoje são vendidos a preços menores que os preços de megabytes de memória e de
disco rígido há algumas décadas atrás.
Como efeito, se olharmos cuidadosamente, este princípio de produtos cada
vez melhores e mais baratos a custos cada vez menores se aplica a todo o
sistema econômico. Está presente tanto
na produção de comida, de roupas e de abrigos quanto nas indústrias de alta
tecnologia, e em praticamente todas as indústrias entre estes dois extremos.
Está
presente em todas estas indústrias não obstante a inflação da oferta monetária
— totalmente gerenciada pelo governo — ter feito com que os preços dos
produtos aumentassem acentuadamente ao longo dos anos. Apesar disso, quando calculados em termos da quantidade de trabalho que o cidadão
comum deve despender a fim de adquirir o salário necessário para comprar tais
produtos, os preços de tais bens caíram fortemente.
A
melhor ilustração deste raciocínio pode ser vista no aumento do padrão de vida
que ocorreu ao longo dos últimos 100 anos.
Em 1911, o cidadão comum trabalhava 60 horas por semana. O que ele recebia em troca da sua mão-de-obra
era exatamente o padrão de vida de 1911 — um padrão de vida que não incluía
bens como automóveis, ar condicionado, viagens aéreas, antibióticos,
geladeiras, congeladores, filmes, televisão, videocassetes, aparelhos de DVD, Blu-ray,
rádios, toca-discos, CD players, computadores, notebooks, celulares, moradias
confortáveis, comidas e roupas abundantes e de qualidade, medicina e
odontologia modernas, máquina de lavar e secar, forno de microondas e por aí
vai. Em 1911, telefones e energia elétrica
eram raros. Aparelhos elétricos eram
praticamente desconhecidos. Telefones
celulares não eram nem objetos de ficção.
Os
bens que podiam ser produzidos à época, como vários tipos de comida, roupas e
moradias, eram de menor qualidade e muito mais caros em termos reais do que são
hoje — isto é, em termos do tempo necessário para ganhar o dinheiro necessário
para adquiri-los. A alimentação, o
vestuário e a moradia do cidadão comum eram muito mais modestos do que são
hoje. Todos esses bens só se tornaram
mais acessíveis e aumentaram em qualidade e variedade porque a busca por lucros
levou ao necessário processo de corte de custos e a outros aprimoramentos no
processo de produção. E todos aqueles
bens que não existiam em 1911 só passaram a existir por causa da busca por
lucros.
Em
outras palavras, o que aumentou tão radicalmente o padrão de vida de todos foi
nada mais do que a busca por lucros e a liberdade de agir de acordo com esse
objetivo. A busca por lucros foi a
força-motriz da produção e da atividade econômica. Em todos os lugares, em cada indústria, em
cada cidade, havia homens ávidos para lucrar aprimorando produtos e métodos de
produção. Eles tiveram a liberdade de fazer
isso e foram bem sucedidos. Essa
"ganância", "epidêmica" a ponto de se tornar generalizada, foi o que aprimorou
tão radicalmente o padrão de vida do cidadão comum. É algo pelo qual todos nós devemos ser
profundamente agradecidos. Caso tal
"ganância" fosse menos "epidêmica" e menos generalizada, o aprimoramento do
nosso padrão de vida teria sido, sem a menor sombra de dúvida, muito menos
intenso.
O
grau de aprimoramento do padrão de vida do cidadão médio pode ser mensurado
utilizando-se o fato de que seu padrão de vida é hoje pelo menos 10 vezes maior
do que era em 1911 (e essa é uma estimativa conservadora), e tal padrão é
obtido trabalhando-se em média apenas dois terços do que se trabalhava em 1911
— 40 horas de trabalho por semana ao invés de 60. Assim, dois terços do trabalho realizado em
1911 hoje consegue adquirir dinheiro suficiente para comprar 10 vezes a
quantidade de bens. Ou, colocando de
outra forma, um simples décimo daqueles dois terços — ou 6,66% — é hoje
suficiente para comprar bens equivalentes ao padrão de vida médio de 1911. Isso significa que, na média, graças à
ganância de empreendedores e capitalistas, houve, desde 1911, uma queda nos
preços reais da ordem de 93,33%!
Apenas
este fato já deveria servir para demonstrar que o capitalismo de livre mercado
— o capitalismo laissez-faire — é o sistema econômico mais ético e moral que
existe. Ele é a materialização das
liberdades individuais e da busca pelo interesse próprio. Ele resulta no progressivo aumento no
bem-estar material de todos, algo que se manifesta no aumento das expectativas
de vida e no contínuo aprimoramento do padrão de vida das pessoas.
O papel dos ricos capitalistas na melhora
do nosso bem-estar
Os
atuais protestos contra os ricos, contra os lucros das grandes empresas e
contra a ganância partem do velho princípio marxista de que uma pequena fatia
de abastados vive à custa da exploração da esmagadora maioria da população
mundial. Tal raciocínio seria verdadeiro
caso a revolta se direcionasse especificamente para aqueles indivíduos cuja
riqueza foi adquirida por meios que atentam justamente contra o capitalismo,
como subsídios governamentais, protecionismo e outras formas de governo que
obstruem a livre concorrência. Nesse
caso, os protestos mereceriam o apoio de todos os pró-capitalistas. No entanto,
a gritaria tem sido generalizada e o alvo comum tem sido os ricos, os lucros e
a ganância de forma geral.
A
óbvia solução apresentada é que a população explorada — a esmagadora maioria
da população mundial — confisque a riqueza da ínfima minoria abastada e a
utilize para seu beneficio próprio ao invés de permitir que ela continue sendo
utilizada para o benefício dessa ínfima minoria, que é supostamente formada por
indignos e gananciosos capitalistas exploradores. Em outras palavras, o programa implícito por
trás das atuais manifestações é o socialismo e a redistribuição de riqueza.
Deixando
de lado as hipérboles utilizadas nos protestos, é verdade que uma relativamente
pequena minoria da população de fato detém uma excepcionalmente grande fatia da
riqueza da economia. Mas o que os manifestantes
não percebem é que a riqueza dessa ínfima
minoria é exatamente o que fornece o padrão de vida da esmagadora maioria.
Os
manifestantes não se dão conta disso porque veem o mundo através de uma lente
intelectual totalmente inapropriada para a vida sob o capitalismo e sua
economia de mercado. Eles veem um mundo
— que ainda existe em alguns lugares atrasados, e que era prevalecente há
alguns séculos — povoado de famílias autossuficientes que vivem da agricultura
de subsistência, cada uma produzindo para consumo próprio, sem nenhuma ligação
com um mercado de compra e venda de bens e serviços.
Em
tal mundo, quando alguém vê uma plantação, ou um celeiro, ou um arado, ou
animais de carga, e pergunta a quem tais meios de produção servem, a resposta é
"ao agricultor e sua família, e a ninguém mais". Neste mundo, à exceção de algum ocasional gesto
de caridade dos proprietários, aqueles que não possuem meios de produção não
podem se beneficiar dos meios de produção existentes, a menos que eles próprios
de alguma maneira também se tornem proprietários de meios de produção. Eles não podem se beneficiar dos meios de
produção de terceiros, a menos que herdem-nos ou confisquem-nos.
No
mundo dos manifestantes, os meios de produção possuem essencialmente a mesma
característica de bens de consumo, os quais, em regra, beneficiam apenas os
seus proprietários. Justamente por seguirem
esta mesma visão de mundo, aqueles que compartilham da mesma mentalidade dos
manifestantes tipicamente imaginam os capitalistas como homens obesos, cujos
pratos estão repletos de comida enquanto as massas de assalariados têm de viver
à beira da fome. De acordo com essa
mentalidade, a redistribuição de riqueza é simplesmente uma questão retirar a
comida do prato transbordante dos capitalistas e redistribuí-la para os
trabalhadores esfomeados.
Porém,
ao contrário de tais crenças, no mundo moderno em que realmente vivemos, a
riqueza dos capitalistas simplesmente não está na forma de bens de consumos,
pelo menos não de maneira significativa.
Não apenas ela está predominantemente na forma de meios de produção,
como também esses meios de produção estão empregados na produção de bens e
serviços que são vendidos no mercado. Em total antagonismo às condições das
famílias agrárias autossuficientes, os
beneficiários dos meios de produção dos capitalistas são todos os membros do
público consumidor em geral, que compram os produtos dos capitalistas.
Por
exemplo, sem ser dono de uma única ação de alguma grande montadora (GM, Daimler,
Ford, BMW, Scania, VW, Toyota, Volvo) ou de alguma petrolífera (Exxon Mobil,
BP, Shell, Chevron), qualquer pessoa em uma economia capitalista que compre os
produtos destas empresas se beneficia de seus meios de produção: o comprador de
um automóvel Volvo se beneficia da fábrica da Volvo que produziu aquele
automóvel; o comprador da gasolina da Shell se beneficia de seus poços
petrolíferos, oleodutos e caminhões-tanque.
Adicionalmente, também se beneficiam destes meios de produção todas
aquelas pessoas que compram produtos de clientes da Volvo ou da Shell, desde
que tais meios de produção indiretamente contribuam para os produtos destes
seus clientes. Por exemplo, os clientes
dos supermercados cujos produtos foram entregues em caminhões feitos pela Volvo
ou abastecidos com diesel produzido nas refinarias da Shell se beneficiam da
existência da fábrica de caminhões da Volvo e das refinarias da Shell. Mesmo aqueles que compram produtos dos concorrentes da Volvo e da Shell, ou dos
clientes destes concorrentes, também se beneficiam da existência dos meios de
produção da Volvo e da Shell. Isso
porque os meios de produção da Volvo e da Shell resultam em uma oferta mais
abundante — e, logo, mais barata — dos bens que os concorrentes vendem.
Em
outras palavras, todos nós, 100% de nós,
nos beneficiamos da riqueza dos odiados capitalistas. Nós nos beneficiamos sem que nós mesmos
tenhamos de ser capitalistas. Os críticos
do capitalismo são literalmente mantidos vivos em decorrência da riqueza dos
capitalistas que eles odeiam. Como demonstrado,
os campos de petróleo e os oleodutos das odiadas corporações petrolíferas
fornecem o combustível que movimentam os tratores e os caminhões que são
essenciais para a produção e a distribuição de comida que os críticos comem. Os manifestantes atuais e todos os outros que
têm ódio dos capitalistas simplesmente odeiam os alicerces de sua própria
existência.
O
benefício que os meios de produção dos capitalistas trazem aos
não-proprietários dos meios de produção se estendem não apenas aos compradores
dos produtos fabricados por esses meios de produção, mas também aos vendedores
da mão-de-obra que é empregada para trabalhar com esses meios de produção. A riqueza dos capitalistas, em outras
palavras, é a fonte tanto da oferta de produtos que os não-proprietários dos
meios de produção compram, como também da demanda pela mão-de-obra que os
não-proprietários dos meios de produção vendem.
Donde se conclui que, quanto maior o número e quanto maior a riqueza dos
capitalistas, maior será tanto a oferta de produtos quanto a demanda por
mão-de-obra. Consequentemente, menores
serão os preços e maiores serão os salários — logo, maior será o padrão de
vida de todos. Nada pode ser mais benéfico
para o interesse próprio do cidadão comum do que viver em uma sociedade repleta
de capitalistas multibilionários e suas grandes empresas, todos ocupados
utilizando sua vasta riqueza para produzir bens que este cidadão irá comprar e
para disputar a mão-de-obra que ele irá vender.
Não
obstante tudo isso, o críticos do capitalismo desejam um mundo no qual os
capitalistas bilionários e suas grandes empresas foram completamente banidos e
substituídos por pequenos e pobres produtores, que não seriam
significativamente mais ricos do que eles próprios, os críticos — o que
significa que todos seriam pobres. Eles
creem que em um mundo com tais produtores, produtores que não possuem o capital
necessário para produzir quase nada, muito menos para conduzir a produção em
massa dos produtos tecnologicamente avançados do capitalismo moderno, eles irão
de alguma forma estar economicamente em melhor situação do que estão hoje. Obviamente, tais críticos e manifestantes não
poderiam estar mais iludidos.
Além
de não perceberem que a riqueza dessa ínfima minoria é o pilar do padrão de
vida da esmagadora maioria, o que os críticos e manifestantes também não
percebem é que a "ganância" daqueles que se esforçam para fazer parte da ínfima
minoria — ou que se esforçam para ampliar sua posição dentro dela — é o que
faz com que o padrão de vida da esmagadora maioria seja progressivamente
aumentado.
A ironia fatal que está destruindo os EUA
A
estagnação e o declínio econômico, os problemas do desemprego em massa e a
crescente pobreza observada nos EUA nos últimos anos são o resultado de
violações da liberdade individual e da busca pelo interesse próprio. O governo emaranhou o sistema econômico em
uma crescente teia de regras e regulamentações paralisantes que proíbem a
produção de bens e serviços que as pessoas querem consumir, e ao mesmo tempo
obrigam a produção de bens e serviços que as pessoas não querem, fazendo com
que a produção de praticamente tudo seja muito mais cara do que deveria
ser. Por exemplo, proibições na produção
de energia atômica, petróleo, carvão e gás natural encarecem o custo da energia;
e com menos energia disponível para ser empregada na produção, a mão-de-obra
humana tem de ser utilizada mais intensamente para produzir uma dada quantidade
de bens. Isso resulta em menos bens
disponíveis na economia, o que afeta a remuneração de todos os assalariados.
Gastos
governamentais descontrolados e seus concomitantes déficits orçamentários, em
conjunto com altos impostos sobre a renda, sobre a propriedade e sobre ganhos
de capital, todos incidentes sobre fundos que caso contrário teriam sido
amplamente poupados e investidos, destroem o capital do sistema econômico. Desta forma, eles impedem o aumento tanto na
oferta de bens quanto na demanda por mão-de-obra, algo que mais capital nas
mãos das empresas teria gerado.
E
há as inúmeras e crescentes regulamentações que aumentam o custo da produção,
reduzem sua eficiência e impedem novas acumulações da capital. E houve também a formação e o estouro de duas
bolhas, a do mercado de ações e a imobiliária, ambas geradas pela expansão de
crédito orquestrada pelo Banco Central americano e que amplificaram o consumo
de capital da economia. Trilhões de
dólares em capital foram destruídos.
Toda
essa destruição de capital afeta a capacidade das empresas de produzir e
empregar mão-de-obra. É essa perda de
capital que é responsável pelo atual problema do desemprego em massa.
No
entanto, não obstante toda essa maciça destruição de capital, o problema do
desemprego pode ser eliminado. Porém,
devido a essa perda de capital, para que tal problema seja resolvido seria
necessária uma redução nos salários.
Essa redução, entretanto, foi praticamente tornada ilegal em decorrência
da existência de leis de salário mínimo e legislações sindicais. Tais leis impedem que os empregadores
ofereçam salários menores, aos quais os desempregados estariam reempregados.
Consequentemente,
por mais irônico que seja, o fato é que praticamente todos os problemas dos
quais os intelectuais, os críticos do capitalismo e os manifestantes reclamam
são resultado justamente da implementação de políticas que eles apóiam e nas
quais eles fervorosamente acreditam. É
essa mentalidade, o marxismo incrustado nela, e as políticas governamentais
resultantes, que são responsáveis por tudo aquilo de que estão reclamando. Os críticos e os manifestantes estão, com
efeito, na posição de autoflagelantes involuntários. Eles estão se chicoteando e, como bálsamo para
suas feridas, exigem ainda mais chicotadas e algemas. Eles não veem isso porque não aprenderam a
fazer a correlação entre fenômenos básicos.
Eles não entendem que, ao violarem a liberdade de empreendedores e
capitalistas, e ao confiscarem e consumirem suas riquezas — isto é, ao
utilizarem armas de constrangimento físico e mental contra esse pequeno e
odiado grupo —, eles estão destruindo as bases de seu próprio bem-estar.
Por
mais que os críticos do capitalismo mereçam sofrer em decorrência dos danos
causados pela aplicação de suas próprias ideias, seria muito melhor se eles
acordassem para o mundo moderno e passassem finalmente a entender a verdadeira
natureza do capitalismo, e então direcionassem sua ira aos alvos que realmente
merecem recebê-la. Caso fizessem isso,
eles poderiam, aí sim, trazer alguma contribuição real para o bem-estar
econômico, inclusive o deles próprios.