N.
do T.: Notícias
recentes indicam que a versão cristal da metanfetamina já chegou ao
Brasil. Dentre os efeitos causados por
essa droga estão arritmias cardíacas, insônia, irritabilidade e agitação
nervosa. Pode-se também observar dor
abdominal, náuseas, vômito, diarréia, anorexia, perda de peso, constipação,
diminuição da função sexual, alterações na libido, disfunção erétil, fraqueza,
cefaléia, hiperidrose, taquicardia, visão turva, tonturas, infecção urinária e
secura na boca. Em casos mais raros,
também se observa um estado mental alterado, enfarte do miocárdio, dermatite
alérgica, exantema, ansiedade, cardiomiopatia, acidente vascular encefálico
(AVE), dor no peito, depressão, febre, hipertensão, alterações de humor e
psicose.
Como
uma droga tão destruidora consegue encontrar adeptos? A economia explica.
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A
maioria das pessoas jamais viu a metanfetamina vendida
como droga, conhecida como cristal; fala-se muito no noticiário, mas quantas
pessoas de fato conhecem alguém que é usuário de metanfetamina?
A
droga atende por vários nomes: metil anfetamina, N-metil-anfetamina, desoxiefedrina,
metodona de cristal ou simplesmente 'met'.
Independentemente de como seja chamada, a metanfetamina é simplesmente
uma das mais perigosas e viciosas drogas existentes no mercado negro atual.
A
metanfetamina existe desde 1893 e, atualmente, é permitida por várias agências
governamentais para o tratamento da obesidade e do Transtorno do Déficit de
Atenção com Hiperatividade (TDAH). Como se pode explicar seu recente surto de
popularidade como droga recreativa? Por
que um indivíduo escolheria utilizar uma droga que é amplamente conhecida —
até mesmo por seus usuários — por ser uma das drogas mais perigosas e difíceis
de ser abandonadas dentre todas as drogas ilegais? Pode ser algo surpreendente para alguns
leitores, mas a ciência econômica pode fornecer a melhor resposta para essas
perguntas desnorteantes. Porém, antes de
entendermos a economia por trás das decisões individuais de se utilizar o
cristal, precisamos antes nos certificar de que já fomos apropriadamente
apresentados a essa droga e aos seus usuários.
Pode
parecer estranho o fato de a mesma substância química utilizada na forma de
tabletes por milhões de soldados nazistas (por falar em Blitzkrieg...) possa
ser também uma droga de rua tão popular.
O motivo de ela ser utilizada "recreativamente" é que, altas doses, ela
produz uma reação de euforia que inclui um aumento da vivacidade e da sensação
de alerta, um aumento da energia, da autoestima e até mesmo do apetite sexual
— sendo que tudo isso pode durar até 12 horas.
Dentre os inevitáveis efeitos colaterais do pós-efeito estão a fadiga e
a depressão. Não surpreendentemente, a
droga também é considerada altamente viciante.
Para
evitar esses sintomas da abstinência, alguns usuários se entregam a farras em
que consomem a droga por dias ou até semanas seguidos. Isso, entretanto, apenas faz com que o
período de abstinência que virá depois seja ainda maior e mais doloroso. Usuários antigos podem sofrer danos
fisiológicos, psicológicos e neurológicos que perduram até muito tempo após o
fim do período de abstinência. Os
efeitos de longo prazo também incluem depressão, suicídio e ataques
cardíacos. Uma descrição completa da
droga e de seus efeitos pode ser encontrada aqui.
Um
efeito particularmente doloroso e debilitante do uso de longo prazo do cristal
é conhecido como "boca de metanfetamina" (meth
mouth). Essa condição envolve a
degradação dos dentes e gengivas do usuário.
O uso prolongado pode resultar na descoloração e perda prematura dos
dentes. Eles se tornam desfigurados e
desgastados, assumindo um aspecto mórbido de "dentes moídos". Os nervos ficam expostos. As gengivas do usuário também assumem um
aspecto mórbido, apresentando frequente sangramento, o que acelera a perda dos
dentes. Especula-se que esse aspecto
bucal seja resultado de uma higiene ruim e de uma dieta pobre combinadas com os
efeitos da droga (o fenômeno da boca seca gerado pela droga) e com o desgaste
dental autoinfligido pelo usuário. Em
casos severos, o estrago é irreversível.
O resultado não é nada bonito. (Clique aqui
se tiver estômago).
O
número total de usuários de cristal é relativamente pequeno; entretanto, nos
EUA, pessoas que trabalham em centros de reabilitação, prontos-socorros e
necrotérios são obrigadas a lidar com essa droga incrivelmente devastadora —
ou com suas vítimas — diariamente.
Essa
breve introdução à metanfetamina em sua versão cristal, e de como ela funciona,
foi necessária para garantir que todos nós estejamos integrados no assunto em
questão e entendamos perfeitamente com que tipo de droga estamos lidando. Estou certo de que o leitor pode agora
concordar com legisladores, policiais, especialistas em saúde pública,
defensores da legalização das drogas e antigos usuários quando eles dizem que,
em termos de potencial destrutivo, nem todas as drogas são criadas iguais, e a
metanfetamina pertence a uma classe única.
A
pergunta é: sabendo-se que ela é tão perigosa e destrutiva, por que a
metanfetamina cristal é tão popular?

A
deterioração de uma usuária de metanfetamina ao longo de um período de 10 anos
As
respostas mais comumente dadas estão relacionadas a tecnologia, fisiologia e
psicologia. Tecnologicamente, o cristal
é fácil de ser fabricado: pode-se utilizar equipamentos de produção simples,
uma receita acessível gratuitamente na internet, e ingredientes disponíveis na
farmácia da esquina. A baixa exigência
tecnológica para a produção de cristal resultou na criação de vários
laboratórios amadores e profissionais ao redor do mundo. Um estudo publicado em 2007 descobriu que "A
síndrome de abstinência de metanfetamina gera depressões mais prolongadas e
severas que a abstinência de cocaína, de modo que os pacientes com abstinência
devem ser monitorados de perto, pois apresentam propensão ao suicídio". Psicologicamente, a metanfetamina fornece a
euforia que tantas pessoas almejam.
Isso
tudo é verdade, mas não explica a popularidade de um produto tão pernicioso e
perigoso. Vendedores de drogas,
consumidores de drogas e até mesmo viciados em drogas sempre foram conhecidos
por ser um grupo "racional" — sim, racional, mas continue me
acompanhando. Eles reagem a mudanças de
preços; eles reagem a diferenciais de qualidade e a mudanças na qualidade. Eles também reagem — racionalmente — a
mudanças no risco. Logo, se os usuários
de drogas selecionam sua droga favorita por meio de um processo racional de
tomada de decisão, o que explica essa "marcha ao fundo do poço" e a ascensão da
metanfetamina no mercado de drogas ilegais?
A
resposta está no preço. O cristal é
conhecido como a cocaína do pobre. Tanto
a cocaína quanto a metanfetamina são estimulantes, portanto é razoável supor
que ambas atraem o mesmo subconjunto de usuários de drogas. Nos EUA, durante o apogeu da cocaína, a metanfetamina
estava praticamente extinta no mercado ilegal.
Porém,
tudo isso mudou com a "Guerra às Drogas" intensificada por Ronald Reagan, a
qual foi bastante eficaz em elevar os preços das drogas ilegais ao impor
maiores riscos — logo, maiores custos — à produção, à distribuição e ao
consumo. O choque inicial dessa guerra
às drogas fez com que os agentes do mercado negro refizessem suas planilhas de
cálculo: eles agora tinham de reduzir seus riscos e seus custos. Dentre os novos produtos que eles criaram em
reação a essa nova realidade do mercado, podemos citar, além da metanfetamina cristal, o crack e um tipo de
maconha altamente potente.

Como
havia prometido, a ciência econômica fornece a melhor explicação para o surto
de popularidade da metanfetamina, não obstante o desproporcional perigo do seu
uso. A intensificação das leis de
combate às drogas, o maior rigor na sua aplicação e um aumento nas punições
levaram a um aumento nos preços e a uma redução da oferta das drogas
recreativas favoritas, como a maconha e a cocaína. Preços altos e escassezes periódicas fizeram
com que traficantes e consumidores tivessem de encontrar substitutos — bens
sucedâneos que poderiam produzir resultados similares, porém a custos menores.
O
flagelo trazido pelo cristal é mais um exemplo do "efeito autoridade" — ou
daquilo que tem sido chamado de "lei de ferro da proibição". Sempre que o governo decreta uma proibição,
aumenta a coerção ou aumenta as punições sobre o comércio de um bem como álcool
ou drogas, tal medida inevitavelmente resulta na substituição destes bens por
drogas mais adulteradas, mais potentes, mais perigosas e mais perniciosas.
No
caso da metanfetamina cristal, as autoridades americanas já tentaram restringir
a oferta dos ingredientes básicos, os quais são ingredientes comuns de remédios
para gripes. Elas determinaram que tais
remédios fossem vendidos em farmácias apenas pelo farmacêutico, atrás do
balcão, e com estoque limitado para apenas um mês. Mais recentemente, alguns estados americanos
determinaram que esses compradores de remédios para gripes fossem rastreados
eletronicamente. A intenção era impedir
que comprassem em várias farmácias ao mesmo tempo.
Como
resposta, os produtores de cristal recrutaram um número ainda maior de
intermediários, dentre os quais amigos, parentes, alunos de faculdades, e até
mesmo crianças e mendigos. Esses
recrutas compram remédios para gripe e os revendem para os laboratórios
clandestinos com uma margem de lucro que chega a 500%. Uma reportagem da Associated
Press mostra que milhares de pessoas estão sendo atraídas para esse
comércio. "As autoridades foram
surpreendidas", disse o sargento Tom Murley, de St. Louis. "Pessoas que normalmente não iriam contra a
lei agora estão dispostas a fazê-lo porque acham que é um bom negócio, e também
por causa do estado ruim da economia".
Felizmente,
além de respostas e explicações, a ciência econômica também pode nos mostrar a
porta de saída dessa antiga tendência já velha de décadas — a tendência de se
criar drogas cada vez mais potentes e perigosas. Afinal, uma determinada fatia da sociedade
sempre irá, independentemente de restrições e imposições de leis, optar por
usar drogas. Menos coerção e punições
menores iriam reduzir o preço da maconha e reduzir a demanda por cristal,
direcionando essa demanda novamente para a maconha, uma droga que tem poucos dos problemas
associados ao cristal.